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Carta de uma mãe para a reflexão de toda a sociedade brasileira

Ana Paula Oliveira, mãe do jovem negro Johnatha de Oliveira, escreve sobre o resultado do julgamento do policial militar Alessandro Marcelino de Souza, que matou seu filho em 2014. O PM deixou o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em liberdade após dois dias de julgamento (5 e 6 de março). O júri popular decidiu que houve homicídio culposo — quando não há intenção de matar — e o caso vai para a Justiça Militar. A carta foi recebida pela Alma Preta, que teve permissão para divulgá-la.
A ativista Ana Paula Oliveira (centro), ao lado de familiares de vítimas de violência do Estado, durante o julgamento do policial militar Alessandro Marcelino de Souza, que matou o filho de Ana Paula em 2014, com um tiro nas costas, na favela de Manguinhos. Rio de Janeiro, 6 de março de 2024

Foto: Solon Neto/Alma Preta

7 de março de 2024

Desde a 1ª audiência do caso do meu filho, em 2015, saí daquele lugar (Tribunal de Justiça) com a sensação de que quem está julgando não consegue se ver na gente. Nesses dois dias de julgamento, 5 e 6 de março, devido à grande mobilização, a provas de acusação testemunhais e periciais tão contundentes, e ao trabalho sério e comprometido do Ministério Público, representado pela Dra. promotora Bianca Chaves, e dos defensores públicos Daniel Lozoya e Luís Henrique Zouein, em mostrar a verdade dos fatos, eu mergulhei na ilusão de acreditar que a Justiça pudesse honrar seu nome e se fazer justiça. Por acreditar nisso, me decepcionei e saí do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro destroçada mais uma vez, me sentindo impotente por, apesar desses 10 anos de luta, não ter sido capaz de conseguir justiça para a barbárie que o Estado brasileiro fez com o meu filho, matando-o e criminalizando-o durante 10 anos.

Para além disso, ontem, como várias outras vezes já presencie ali naquele mesmo lugar, testemunhas de acusação de casos de homicídios cometidos por policiais tiveram seus testemunhos contestados por morar na favela. Em alguns lugares, como no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por morarmos na favela, o que falamos como verdade NÃO tem crédito, mesmo que não tenhamos nenhuma ficha criminal, nem qualquer outro fato que desabone a nossa conduta. A criminalização da pobreza e o racismo que permeiam o sistema de Justiça fazem com que a palavra de policiais, mesmo que já tenham sido presos, mesmo que já tenha sido expulso da corporação por práticas criminosas, tenha mais validade para um grupo de jurados, representantes da sociedade que nos julgam e nos condenam pela cor da pele e pela classe social.

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Ontem, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro mostrou o que eu já vinha percebendo ao longo desses 10 anos, que O SISTEMA DE JUSTIÇA NO BRASIL NÃO É IGUAL PARA TODOS, NÃO É JUSTO, E SEGUE SENDO RESPONSÁVEL POR TANTAS MORTES COMETIDAS POR POLICIAIS DENTRO DAS FAVELAS!!

A todas as testemunhas de acusação, que foram corajosas para caramba, motivadas, assim como eu, pela sede de justiça nesses 10 anos, eu agradeço de coração, assim como agradeço a minha família, a cada mãe e familiar de vítima da violência causada pelo Estado. Agradeço também a cada organização e movimento que se mobilizou, me apoiou e me abraçou. Agradeço a todos os companheiros e companheiras dessa luta contra a Letalidade Policial, contra o Racismo existente na nossa sociedade.

“TUDO O QUE NÓS TEM É NÓS!!”

Ao Meu Amado Filho Johnatha, eu queria pedir desculpas por não ter conseguido ontem justiça pelo que fizeram com ele. Mas que ele tenha certeza de que me levantarei novamente, sendo a voz dele nesse mundo de tantas desigualdades e injustiças porque o que me move é muito maior e mais forte que tudo isso. Sou movida pela DOR E PELO AMOR que carrego por ele. TE AMO MUITO MEU FILHO, VOCÊ É O SENTIDO DA MINHA CAMINHADA NESSE MUNDO. OBRIGADA POR SER O MEU FILHO, JOHNATHA. TE CARREGO EM MIM!!

Ana Paula Oliveira, mãe de Johnatha de Oliveira Lima

Rio de Janeiro, 7 de março de 2024.

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