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O vírus do racismo

A política de extermínio da pandemia é mais uma parte do projeto direcionado a um povo que tem a morte como cotidiano, na mesma luta diária que já era a vida antes da pandemia

Texto: Erica Malunguinho | Imagem: Carl Souza

Pandemia: O vírus do racismo

7 de abril de 2021

O Brasil ultrapassou 330 mil mortes na pandemia da Covid-19, em meio ao colapso nos sistemas de saúde do país: hospitais públicos e privados lotados, filas para vagas em unidades de tratamento intensivo (UTIs) e falta de insumos para atendimento a pacientes infectados.

A passos lentos, seguimos com a vacinação. No entanto, apesar de a primeira pessoa vacinada ter sido uma mulher negra, hoje, há cerca de duas pessoas brancas para cada pessoa negra vacinada – isso, em um país em que 54% da população é negra.

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Os dados da pandemia no país indicam que a mortalidade — isto é, a quantidade de pessoas que morrem em relação a quem tem a doença — foi maior entre pessoas negras do que entre brancas: 92 óbitos a cada 100 mil habitantes negros, para 88 brancos, segundo pesquisa publicada pela Agência Pública.

As disparidades raciais nos resultados do país quanto à pandemia de Covid-19 são multifatoriais e podem ser explicadas em três pontos principais, de acordo com o Informativo Desigualdades Raciais e Covid-19.

Em primeiro lugar, a população negra está mais exposta à infecção da Covid-19, porque o distanciamento social é mais difícil de ser alcançado por indivíduos de menor renda, devido às condições de domicílio, de trabalho e de transporte. Ademais, as pessoas com menos escolaridade têm menos oportunidades de trabalhar remotamente.

Em segundo lugar, o nível socioeconômico mais baixo também está relacionado a uma carga maior de comorbidades que aumentam a letalidade da Covid-19, como hipertensão e diabetes. Em terceiro lugar, a letalidade é maior em populações com menos acesso a cuidados de saúde.

Leia tambémO quanto a vacinação está distante de grande parte dos negros brasileiros?

Todos sabemos: há um genocídio em curso no país. Por sinal, este termo ganhou espaço no vocabulário brasileiro graças ao Movimento Negro, que há anos vem apontado isso: genocídio não é um fenômeno, e sim, um projeto que tem raízes profundas na História do Brasil. Completamos 133 anos de uma suposta abolição, ainda em aberto. A população negra segue amargando com as consequências de um racismo estrutural e institucional com alto impacto no contexto atual.

Quando um grupo facilmente identificável por suas características étnico-raciais concentra múltiplos fatores de vulnerabilidade, não há coincidência, mas projeto. “Raça estrutura classe no Brasil”, ensinou Sueli Carneiro. Tenho reiterado inúmeras vezes que, nos territórios que receberam a diáspora negra, “raça-cor” não deve ser analisado como mero “recorte”, como uma série de fatores paralelos, e sim como fundamento determinantes para compreensão justa dos abismos sociais.

Leia também: O reconhecimento do direito à vida e à saúde quilombola frente à Covid-19

A política de extermínio da pandemia é mais uma parte do projeto direcionado a um povo que tem a morte como cotidiano, na mesma luta diária que já era a vida antes da pandemia. Se a Covid-19 desnuda ainda mais as feridas raciais que estruturam nossa sociedade, não será possível falar em “pós-pandemia” – mesmo quando o vírus estiver contido. Os dados do Brasil nesta pandemia só reforçam que, enquanto perdurar o racismo, também se manterão as desigualdades e a própria impossibilidade de uma verdadeira democracia.

Erica Malunguinho é pernambucana, artista e educadora. Mestra em Estética e História da Arte, tornou-se a primeira deputada estadual trans eleita no Brasil, em 2018.

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