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Por que os negros devem lutar contra o aumento das passagens?

19 de janeiro de 2016

Texto: Marcela Johnson / Foto: Guilherme Moraes

Nem começou o ano de 2016 e já nos deparamos com um novo ataque dos governos: mais um aumento no preço das passagens de ônibus/metrô. Mas o que nós negros e negras temos a ver com isso?

A história do Brasil colocou negros/negras nas piores condições sociais. Basta uma pequena olhada nos índices sociais para perceber que os negros são a maioria dos que ocupam esse espaço marginalizado. São inúmeras táticas para garantir a continuidade do racismo e das condições de vida precárias.

Em relação ao transporte público não é diferente. A maioria de nós passa horas no transporte público para podermos trabalhar. São os negros a maioria dos moradores das periferias de São Paulo, onde o transporte é ainda mais caótico, ônibus lotado todos os dias, metrô abarrotado. Somos tratados como gado. São os navios negreiros contemporâneos que garantem que a “escravização capitalista” se sustente levando a mercadoria humana para os postos de serviço.

Para uma parcela dos trabalhadores, os que ainda têm alguns direitos trabalhistas, existe o VT (vale transporte), que na verdade é retirado do nosso próprio trabalho e parte de nosso salário. Ora, como se já não bastasse deixar no trabalho horas de nossa vida, ainda somos obrigados a pagar para ir até o local onde somos explorados?

Bom, mas mesmo o VT é hoje um beneficio que a maioria de nós não possui, já que estamos nos trabalhos precarizados, sem carteira assinada, sem muitos dos direitos trabalhistas conquistados com muita luta. Ao mesmo tempo a enorme distância entre periferia e centro faz com que sejamos os que mais dependem desse transporte e os que mais gastam proporcionalmente em relação ao nosso salário.

E quando chega o final de semana e queremos aproveitar o pouco tempo para acessar cultura, espaços de lazer…. R$3,80 no mínimo, só pra chegar. Esse mesmo transporte que serve pra nos levar todo dia paro trabalho, nos impede de aproveitar e conhecer a cidade em que vivemos.

Não podemos esquecer também da maior vulnerabilidade das minas pretas, que além de estarem expostas aos assédios no próprio transporte também são muito mais vulneráveis a ataques machistas esperando o ônibus na quebrada, andando de casa até o ponto, já que as empresas organizam o transporte da melhor forma para que seus lucros sejam mais altos, não para melhor atender os usuários.

É preciso lutar por um transporte público de qualidade, que seja controlado pelos trabalhadores do transporte e os usuários, que funcione de forma mais inteligente para que possa melhor atender a população e não a sede de lucro dos patrões. Nós, negros e negras e o próprio movimento negro, devemos entrar nessa luta, afinal o transporte também é uma demanda nossa e somos nós os mais afetados pelo aumento das passagens e pela péssima qualidade do serviço

Foto: Norma Odara / A repressão policial tem sido intensa em todas as manifestações contra o aumento da passagem Foto: Norma Odara / A repressão policial tem sido intensa em todas as manifestações contra o aumento da passagem

Num país onde nós somos a parcela mais precarizada da população, toda a demanda popular e operária deve ser vista também com uma demanda negra e deve ser encarada como uma luta nossa. Mais do que isso é preciso pensar em uma saída que unifique as demandas mais especificas da luta contra o racismo em nossa sociedade a um programa que responda aos problemas do transporte.

Esses dias eu estava pensando se não deveríamos primeiramente defender a efetivação de todos os terceirizados do transporte público sem concurso. Igual trabalho, igual salário para brancos e negros, efetivos e terceirizados. Não só isso, que a contratação para as obras públicas para a ampliação do transporte público garanta contratação preferencial de negros, que são os que mais têm sofrido com o desemprego. Enfim são inúmeras pautas que devemos desenvolver de forma combinada.

A luta contra o racismo não deve, nem pode estar separada da luta contra a realidade material vivida por todos os negros e negras e isso só pode ser feito em conjunto com todos os trabalhadores e trabalhadoras superando essa sociedade de exploração e opressão. Essa aliança tão importante não pode significar de forma alguma a secundarização das nossas demandas, mas deve potencializa-las.

Para que isso seja possível, nós devemos participar desses processos de luta enquanto sujeitos ativos, levantando nossas demandas e mostrando que nós também não aguentamos mais um aumento!

Marcela de Palmares nasceu em São Paulo, é estudante de educação física pela Universidade de São Paulo, USP, ativista revolucionária com atuação no movimento negro. Marcela estuda sobre os negros e a revolução.

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