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Violência policial transforma principais vias do Rio de Janeiro em rotas perigosas

Ações policiais constantes causam pânico e prejudicam rotina dos moradores do Rio e Janeiro

Texto: Laerte Breno e Michel Rosa | Imagem: Apu Gomes/STF

Agente de segurança pública na via do metrô do Rio de Janeiro

Agente de segurança pública na via do metrô do Rio de Janeiro

14 de julho de 2021

As vias e ferrovias que cortam os espaços urbanos são parte de uma configuração social que conecta diferentes pontos das cidades, organiza deslocamentos, mas também cria fronteiras. Em sociedades como a do Rio de Janeiro, os fluxos e acessos reproduzem as desigualdades socioespaciais, condicionando algumas classes sociais à vulnerabilidade, privadas de acesso aos equipamentos públicos de lazer e reféns de serviços de péssima qualidade no transporte público.

Quem é obrigado a se expor diariamente a longos deslocamentos enfrenta uma rotina de cansaço e, muitas vezes, de violência. Foi assim uma ação da Polícia Civil no Jacarezinho, que terminou com 28 mortos e usuários da estação de metrô de Triagem em pânico. Pessoas que nos vagões e fora deles se aglomeravam deitadas no chão ou nos cantos de paredes para tentar escapar dos disparos. Mas a matança, sem precedentes na história da Segurança Pública fluminense, não poupou a integridade dos trabalhadores Humberto Duarte, de 20 anos, e Raphael Silva, de 33 anos, feridos após disparos atravessarem os vidros da composição.

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Durante a operação, os trens para Belford Roxo foram suspensos, assim como ruas e avenidas próximas tiveram a circulação interrompida. Uma rotina tão comum e frenética quanto habitual e traumática. Dados do Instituto Fogo Cruzado revelam que no primeiro semestre de 2021 ocorreram pelo menos 29 tiroteios em um raio de até 100 metros deste ramal da Supervia. O relatório aponta, ainda, que os riscos vão muito além do ramal Belford Roxo: ao todo foram registrados 264 tiroteios no entorno de grandes corredores de transportes urbanos, como trens, BRT, rodovias, VLT e o trecho na superfície do metrô.

Outro ponto revelado pelo levantamento é que as políticas de segurança pública têm relação direta com os impactos da violência armada sobre a mobilidade na Região Metropolitana. Isto porque a atuação dos agentes de segurança aparece como principal motivo relacionado à ocorrência de tiros que afetam os corredores de transporte.

A segunda posição é ocupada pelas tentativas de roubo. No dia 3 de abril, um domingo de Páscoa, a técnica de enfermagem Jéssica Souza, moradora de Nova Iguaçu, viajava de trem para o trabalho, na Zona Norte do Rio. Como profissional da saúde, estava na linha de frente num esforço coletivo para salvar vidas em meio à pandemia. Até que um fatídico, mas não incomum, acontecimento encerrou sua própria trajetória de maneira prematura, aos 25 anos. Jéssica foi vítima de uma bala perdida, após um policial reagir a uma tentativa de assalto no trem. A história dela, lamentavelmente, não é uma exceção, mas uma trama que se repete sem cessar por um sistema que reproduz a escalada da violência na periferia dos grandes centros.

É assim há décadas no complexo de Favelas da Maré, situado entre as três principais vias expressas do Rio – Avenida Brasil, Linha Amarela e Linha Vermelha -, por causa das intervenções constantes do Estado. Seja em suas vias ou propriamente em seu conjunto de favelas, políticas de demolições, renovação das passarelas 6 e 7 e o gasto de R$1,7 milhão por dia em uma ocupação com 2.500 militares em 2014 ditam as possibilidades de ir e vir dos moradores locais, mais do que a vontade dos mesmos.

O território da Maré, assim como outras regiões próximas às principais rotas do Grande Rio, são estratégicas para a mobilidade urbana, mas também vulneráveis à violência armada de grupos criminosos ou das operações de guerra que mobilizam, vez ou outra, helicópteros e blindados das polícias fluminenses. A vida cotidiana da Maré é intensa e o fluxo de pessoas é desmedido, trata-se de um território de alta densidade populacional. No entanto, a região só vira destaque no quesito mobilidade urbana quando há registro de tiros que afetam as grandes avenidas.

Enquanto os territórios de favelas e periferias forem pensados pela ótica da repreensão policial, incrementado pela omissão do Estado em formular e implementar políticas públicas, a extensão da violência armada será alargada produzindo mais e mais vítimas e situações de terror tornando um simples retorno para a casa numa rota perigosa.

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