Representantes de movimentos sociais, comunidades indígenas, quilombolas, trabalhadores rurais e da sociedade civil em geral participam da 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente (CNMA). Organizada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), a programação começou na terça-feira (6) e segue até sexta-feira (9), em Brasília.
Com o objetivo de discutir e propor soluções para os desafios ambientais do país às vésperas da COP30, a preparação da CNMA envolveu 2.570 municípios brasileiros e a realização de 439 conferências municipais, 179 intermunicipais e 287 conferências livres.
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O processo resultou na eleição de mais de 1.500 delegados e na formulação de 2.635 propostas da sociedade civil. Essas propostas servirão de base para a atualização da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) e para a construção do novo Plano Nacional sobre Mudança do Clima (Plano Clima), que orientará as ações brasileiras de enfrentamento à crise climática até 2035.
Segundo o site do governo federal, o Plano Clima, que tem revisão prevista para 2025, vai guiar as ações do Brasil para cortar emissões de gases do efeito estufa e enfrentar os efeitos das mudanças climáticas até 2035. Ele integra a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), também em atualização.
As sugestões apresentadas na Conferência serão consolidadas em 100 propostas finais, divididas em cinco eixos: mitigação; adaptação e preparação para desastres; justiça climática; transformação ecológica; e governança e educação ambiental.
Vozes da Amazônia
O ativista e educador Zairo Banjo é um dos delegados eleitos no Pará para participar da Conferência Nacional. Natural de Breves, na Ilha do Marajó, ele percorreu mais de 200 km por via fluvial até Belém, de onde seguiu para Brasília.
Membro do Coletivo de Pretas e Pretos do Marajó e do Coletivo Breves Pede Socorro – Pelo Direito de Respirar, Banjo destaca a importância do evento para amplificar as vozes dos territórios.
“Essa Conferência é muito importante, porque além de promover a integração entre as vozes de diversos territórios, ela vai nortear as políticas públicas ambientais, com participação direta da sociedade civil, que terá direito ao voto nesses espaços. A nossa voz é essa”, afirma.
Participação social limitada
Único delegado da Ilha do Marajó – região que abrange 16 municípios e cerca de 590 mil habitantes –, Banjo reconhece a importância do espaço, mas critica a organização por não considerar as dificuldades logísticas da região.
“Outra ativista do Marajó, de Afuá, foi eleita delegada, mas não conseguiu viajar para Brasília, porque a organização não ofereceu condições para que ela chegasse ao aeroporto em Belém. Afuá é muito longe, são três dias de viagem, com despesas de alimentação e hospedagem”, relata.
“Eu mesmo só consegui viajar porque arquei com todos os custos, a Conferência deu apenas a passagem aérea. Isso mostra uma desmobilização da sociedade civil. Revela que a Conferência desconhece a logística do Pará e, especialmente, das ilhas”, critica.
Racismo ambiental em pauta
Zairo Banjo também apresentou na CNMA propostas debatidas nas conferências municipal e estadual pelo movimento negro, incluindo justiça climática, transparência no uso de recursos para preservação ambiental e enfrentamento ao racismo ambiental.
“Em Breves, enfrentamos racismo ambiental e contaminação do ar e dos igarapés. A prefeitura despeja esgoto nos poucos igarapés que ainda sobrevivem. E quem precisa desses igarapés? A população preta, que vive nas margens, tira água para beber, tomar banho, lavar roupa”, denuncia.
Ele defende que sejam criados protocolos específicos para proteger as populações mais vulneráveis.
“O racismo é visível na questão climática. Por isso, queremos protocolos para mitigar os impactos. Por exemplo, em áreas com muitas queimadas, o protocolo deve garantir abrigo para as pessoas afetadas”, propõe.
Insegurança alimentar e crise hídrica
Os impactos ambientais também afetam a segurança alimentar, como relata Ivete Barros, presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Santarém (PA) e também delegada da CNMA.
Ela afirma que os trabalhadores rurais do oeste do Pará enfrentam secas severas e altas temperaturas, que resultam na perda de safras.
“O impacto é terrível. Os rios e poços secam, falta água potável, e até os rios que não secam têm a textura da água alterada. A pesca escasseia, perdemos produção agrícola e biodiversidade, além do aumento de doenças”, afirma.
Ivete também cobra políticas públicas para compensar as perdas dos pequenos produtores.
“Com a seca, muitos produtos não sobrevivem. Mesmo nas áreas de várzea, com culturas mais rápidas como jerimum e melancia, fica difícil vender porque o acesso às embarcações é prejudicado. Não há políticas públicas para atender a agricultura familiar, nenhum auxílio ou compensação”, critica.
Caminho até a COP30
Belém sediará, em novembro de 2025, a 30ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), um dos eventos mais importantes sobre meio ambiente do planeta. No entanto, ativistas denunciam a exclusão de populações tradicionais desse espaço.
“Quem está sendo convidado para a COP30? Será que os povos tradicionais, as populações quilombolas, marajoaras, amazônidas estão sendo ouvidos? O que vemos são representantes da mineração, do agronegócio. Se não estivermos presentes, vai ser muito difícil”, alerta Banjo.
Ivete completa: “Não temos muitas perspectivas sobre a COP, porque quem mais sofre com os impactos ambientais não está sendo incluído. A COP não é um espaço acessível para os povos, é apenas para as autoridades”.