Na Bahia, em 2021, para cada R$ 175 destinados ao policiamento no Estado, apenas R$ 1 foi gasto com políticas voltadas para egressos do sistema prisional e pessoas privadas de liberdade. Na mesma proporção, R$ 25 foram destinados às despesas com o sistema penitenciário.
Os dados fazem parte da pesquisa “O funil de investimento da segurança pública e prisional no Brasil”, realizada pelo JUSTA, organização que analisa dados do financiamento e da gestão do Sistema de Justiça. A pesquisa analisou dados orçamentários destinados às polícias, ao sistema penitenciário e políticas para egressos em oito estados do país: Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraná, São Paulo e Tocantins. Juntos, os oito estados representam quase 60% do orçamento total de todas as 27 unidades federativas do país, o que corresponde a R$ 593 bilhões.
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Na Bahia, o orçamento geral do governo foi de R$ 53,4 bilhões, sendo o terceiro estado com maior valor de recurso entre os demais estados analisados. Desse total, a maior porcentagem dos recursos foi destinada para as polícias (7,5%), seguido pelo investimento no sistema penitenciário (1,1%) e em ações de governo mistas (para pessoas privadas de liberdade e egressos, sem separação entre os públicos), com 0,043%. Nenhum recurso foi destinado exclusivamente para egressos.
Segundo a pesquisa, que utilizou dados do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro (SICONFI) e dos portais de transparência dos estados, foi possível identificar apenas três ações do governo da Bahia voltadas para egressos, ainda que de maneira não exclusiva, como: “Apoio ao funcionamento do serviço de saúde e assistência social do sistema penitenciário”, “Assistência ao interno e egresso com oferta de atividade laborativa” e “Capacitação profissional do interno e egresso”.
A quesito de ilustração, se somarmos os valores destinados a setores do governo da Bahia como Gestão ambiental (R$ 166 milhões), Ciência e tecnologia (R$ 87 milhões) e Cultura (R$ 167 milhões), juntos, os recursos não dão o valor do orçamento reservado à manutenção do sistema prisional, que foi de R$ 570 milhões em 2021.
À Alma Preta Jornalismo, a diretora executiva do JUSTA, Luciana Zaffalon, a pesquisa ilustra uma desproporcionalidade no investimento na segurança pública que revela o quanto o país tem apostado no encarceramento em massa, sobretudo da população negra e pobre.
“Os números demonstram uma irracionalidade [na aposta do encarceramento em massa] porque como é que você pode apostar nisso como uma solução e não ter nada no final do processo? Então você coloca todos os recursos na porta de entrada e chega no final da pena sem nenhum investimento”, comenta Zaffalon, ativista de direitos humanos.
“Quando a gente fala do sistema prisional, a gente está falando de sobrevivência, não de ressocialização, e o que os dados nos mostram é que, de fato, essa violência e abuso do Estado se coloca da porta de entrada para a porta de saída”, completa a diretora executiva do JUSTA.
Dados Gerais
Nos oito estados analisados, a proporção de gastos com polícias foi maior do que o valor do investimento em políticas para egressos da prisão. Em média, para cada R$ 2.758 gastos com policiamento nos estados, apenas R$ 1 foi para políticas exclusivas para egressos e R$ 678 em gastos com o sistema prisional.
Ao todo, os oito estados analisados somaram, juntos, R$ 35,9 bilhões para o policiamento, R$ 8,8 bilhões com o sistema prisional e R$ 13 milhões com políticas para egressos, totalizando R$ 44,7 bilhões.
Além disso, o levantamento indica que apenas os estados do Pará e São Paulo tiveram investimento exclusivo para políticas de egressos do sistema prisional, com valores de R$ 5 milhões e R$ 8 milhões, respectivamente.
Como um caminho possível para inverter o funil de investimento da segurança pública e prisional do Brasil, a ativista e diretora executiva do JUSTA, Luciana Zaffalon, sugere a adoção de políticas públicas transversais e de garantia de direitos fundamentais aos egressos do sistema prisional.
“Parar de prender e começar a repensar a soltura como algo que precisa ser priorizado não só como ação, mas também como política pública pensada transversalmente que cuide da garantia do resgate da pessoa depois dela conseguir sobreviver ao sistema prisional”, finaliza.
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