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Além de Marielle: as lideranças negras assassinadas na história brasileira

Relembre outras seis personalidades negras que foram alvos e assassinadas por sua luta política

Imagem mostra a vereadora Marielle Franco, morta a tiros em 14 de março de 2018

Foto: Imagem mostra a vereadora Marielle Franco, morta a tiros em 14 de março de 2018

14 de março de 2022

Há 1.461 dias, em 14 de março de 2018, a vereadora e ativista negra Marielle Franco (PSOL) foi assassinada a tiros, junto com seu motorista, Anderson Gomes, no Rio de Janeiro. Nestes quatro anos de investigação – marcados pela falta de respostas sobre o crime – o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) ainda não sabe quem matou Marielle e Anderson, muito menos tem certeza sobre a motivação do crime. 

A suspeita do MP é de que o crime foi cometido por dois ex-policiais militares: Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz. Denunciados e presos em penitenciárias federais fora do Rio de Janeiro, ambos vão a júri popular. A audiência ainda não tem data marcada para acontecer.
 
Marielle Franco, no entando, não foi a única vítima negra engajada com a política brasileira a ser assassinada ou ser dada como desaparecida pelo Estado. Informações da Comissão da Verdade de São Paulo mostram que no período da didatura militar (1964-1985), 41 lideranças do movimento negro do Brasil sumiram ou foram mortas. Os dados ainda apontam registros de perseguição à luta antirracista até 1981, quatro anos antes do fim do regime.
 

Para além do regime ditatorial brasileiro, outras figuras negras foram mortas por motivações políticas. A Alma Preta Jornalismo selecionou seis lideranças negras que foram alvo da violência, fato que custou suas vidas. Relembre casos.

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Marighella

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Carlos Marighella, morto a tiros em novembro de 1969 | Foto: Reprodução/Acervo Nacional

Carlos Marighella (1911-1969) é considerado um dos principais organizadores da resistência contra o regime militar, apelidado de “o inimigo número um da ditadura”. Ao todo, Marighella foi preso por quatro vezes, onde sofreu espancamentos e torturas, sendo a sua primeira experiência atrás das grades aos aos vinte anos de idade.

Militante do Partido Comunista por 33 anos e fundador do movimento armado Ação Libertadora Nacional (ALN), a trajetória política de Marighella começou em sua juventude. Em 1932, foi preso pela primeira vez ao escrever um poema com críticas ao interventor da Bahia, Juracy Magalhães. Depois de quatro anos abandonou o curso de Engenharia Civil e se filiou ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), na época, dirigido por figuras como Astrojildo Pereira e Luís Carlos Prestes. Tornou-se, então, militante profissional do partido e foi morar no Rio de Janeiro.

Durante a Era Vargas, foi preso por subversão e torturado pela polícia duas vezes. Até 1945 permaneceu na prisão, quando foi beneficiado com a anistia pelo processo de redemocratização do país.

Elegeu-se deputado federal constituinte pelo PCB baiano em 1946, como um dos mais bem votados da época. Mas Marighella perdeu o mandato porque o governo Dutra cassou todos os políticos filiados a partidos comunistas.

Impedido de atuar pelas vias legais, retornou à clandestinidade e ocupou diversos cargos na direção partidária. Convidado pelo Comitê Central, passou os anos de 1953 e 1954 na China. Em maio de 1964, após o golpe militar, foi baleado e preso por agentes das Delegacias de Ordem Política e Social (DOPS) dentro de um cinema, no estado do Rio de Janeiro. Em 1965 foi libertado por decisão judicial e no ano seguinte, engajou-se na luta armada contra a ditadura e escreveu o livro “A crise brasileira”.

Em 1967, foi expulso do PCB por divergências políticas, e, então, fundou o grupo armado Ação Libertadora Nacional (ALN), com dissidentes do partido. Essa organização participou de diversos assaltos a banco e do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em setembro de 1969, em uma ação conjunta com o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8). Depois, o embaixador foi trocado por 15 presos políticos.

Os órgãos de repressão da ditadura militar concentraram esforços em sua captura. Na noite de 4 de novembro de 1969, Marighella foi surpreendido por uma emboscada na alameda Casa Branca, na capital paulista. Foi morto a tiros por agentes do DOPS, em uma ação coordenada pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury. A morte de Marighella marcou a história da resistência armada urbana à ditadura militar no Brasil. A ALN continuou em atividade até o ano de 1974.

Osvaldão

osvaldão

Osvaldo Orlando da Costa, morto em 1974 | Foto: Reprodução/Internet

Em 27 de abril de 1938 nasceu Osvaldo Orlando da Costa, conhecido como Osvaldão. Homem negro, oriundo de uma família humilde de Passa Quatro, no sul de Minas Gerais, Osvaldão era o caçula de oito irmãos. Foi boxeador e tenente do Exército.

Aos 20 anos foi para o Rio de Janeiro estudar na Escola Técnica Nacional e lá começou sua militância política. Entrou para o movimento estudantil em 1958 e se filiou ao Partido Comunista do Brasil. Em 1960, Osvaldão foi convidado para estudar engenharia em Praga, antiga Tchecoslováquia. E lá se especializou em mineração.

Em 1966, Osvaldão retorna para o Brasil e vai para a região do Araguaia, no Pará. Na comunidade, estabeleceu laços de amizade e confiança. A relação com os ribeirinhos era tão estreita que eles o tinham como um membro da família e não como alguém de fora.

No final da década de 1960, Osvaldão entra para a guerrilha, com o intuito de lutar contra a ditadura militar. Como conhecia bem o local, era o ativista quem orientava e guiava os novos integrantes do grupo pela região ribeirinha, além de mapear e encontrar espaços aptos para a mineração. Osvaldão extraia pedras preciosas, que ajudavam a financiar os custos com a guerrilha. Militantes e moradores da região afirmam que ele foi o primeiro a explorar o local, que mais tarde ficou conhecido como Serra Pelada.

Com mais de dois metros de altura, porte atlético e uma pontaria implacável, Osvaldão se colocava como uma barreira contra o ataque do Exército à guerrilha. Documentos da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos relatam que soldados temiam o nome do guerrilheiro. Pela importância política e simbólica, capturar Osvaldão significava o fim da guerrilha no Araguaia.

Depois de inúmeras investidas, em 1974, um mateiro – agregado à organização militar – disparou tiros e matou o comandante da Guerrilha do Araguaia. O corpo de Osvaldão foi exposto nos vilarejos da região e durante todo o dia um helicóptero sobrevoou o Araguaia içando seu corpo, como sinal de derrota do ativista negro.

Margarida Alves

Margarida Alves

Em 5 de agosto de 1933, em Alagoa Grande, na Paraíba, nascia Margarida Maria Alves, figura que se tornaria um símbolo sindicalista e defensora dos direitos humanos. Ela foi uma das primeiras mulheres a exercer um cargo de direção sindical no país. Seu nome e sua história de luta inspiraram a Marcha das Margaridas, movimento criado nos anos 2000.

Durante o período em que esteve à frente do sindicato local de sua cidade, Margarida Alves foi responsável por mais de cem ações trabalhistas na justiça do trabalho regional, tendo sido a primeira mulher a lutar pelos direitos trabalhistas no estado paraibano durante a ditadura militar.

No dia 12 de agosto de 1983, Margarida foi assassinada com um tiro de espingarda calibre 12 no rosto. Com 50 anos, a sindicalista morreu em frente à sua casa, perto de seu marido e do filho de oito anos, que brincava na calçada.

A investigação apurou que as denúncias de abusos e desrespeito aos direitos dos trabalhadores nas usinas da região, feitas por Margarida Alves, desagradavam os fazendeiros, que encomendaram seu assassinato.

No entanto, apesar da repercussão, o crime não resultou na prisão dos mandantes. Em 1995, 12 anos após o assassinato, o Ministério Público chegou a denunciar quatro fazendeiros como mandantes do assassinato, entretanto, apenas um suspeito foi julgado e inocentado em 2001.

Helenira Rezende

helenira rezende

Helenira Rezende, morta a tiros em setembro de 1972 | Foto: Reprodução/Movimento Feminino Popular

Militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), desaparecida desde 1972, na Guerrilha do Araguaia, quando tinha 28 anos, Helenira Resende (1944-1972) se destacou na resistência à ditadura no Brasil. Iniciou sua militância no movimento estudantil e em São Paulo se destacou como líder estudantil como vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), em 1969.

Foi presa em maio de 1968, no momento em que convocava colegas para uma manifestação na capital paulista. Ainda naquele ano de fortes mobilizações estudantis, foi presa novamente como delegada do 30º Congresso da UNE, em Ibiúna (SP), e levada para o Presídio Tiradentes.

Depois, foi transferida para o DOPS, onde foi jurada de morte pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury. Helenira foi solta por força de um habeas corpus, pouco antes da promulgação do Ato Institucional Nº 5 (AI-5).

A partir daí, passou a atuar na clandestinidade, vivendo em diversos locais até ir para a região do Araguaia, no sul do Pará, para contribuir na organização da luta armada rural contra o regime. Usando o codinome “Fátima”, fez trabalho político e ajudou a preparar a Guerrilha do Araguaia.

No dia 29 de setembro de 1972, Helenira acabou sendo ferida a tiros e metralhada nas pernas, numa emboscada feita por fuzileiros navais. Recusou entregar a localização de seus companheiros aos militares, e acabou sendo torturada e morta.

O “Relatório Arroyo”, escrito pelo dirigente do PCdoB Angelo Arroyo, que escapou ao cerco militar à região em 1974, descreveu sua morte da seguinte forma:

“No dia 29 de setembro, houve um choque do qual resultou a morte de Helenira Resende. Ela, juntamente com outro companheiro, estava de guarda num ponto alto da mata para permitir a passagem, sem surpresas, de grupos do destacamento. Nessa ocasião, pela estrada vinham tropas. Como estas achassem a passagem perigosa, enviaram ‘batedores’ para explorar a margem da estrada, precisamente onde se encontrava Helenira e o outro companheiro”.

“Este, quando viu os soldados, acionou a metralhadora, que não funcionou. Ele correu e Helenira não se deu conta do que estava sucedendo. Quando viu, os soldados já estavam diante dela. Helenira atirou com uma espingarda 16. Matou um. O outro soldado deu uma rajada de metralhadora que a atingiu. Ferida, sacou o revólver e atirou no soldado, que deve ter sido atingido. Foi presa e torturada até a morte”.

Binho do Quilombo

binho do quilombo

Binho do Quilombo, morto a tiros em setembro de 2017 | Foto: Divulgação

Mais recentemente, o alvo foi o militante negro e quilombola conhecido como “Binho do Quilombo”. No dia 19 de setembro de 2017, o líder do quilombo Pitanga dos Palmares, na Bahia, foi alvejado dentro de seu carro, após deixar seu filho na Escola Municipal Nova Esperança, em Simões Filho.

Testemunhas afirmam que um carro branco parou do lado do veículo da vítima e, sem sair de dentro do automóvel, o atirador disparou cerca de 14 tiros contra Binho, que não teve tempo de reagir. O quilombola tinha 36 anos quando foi assassinado, deixando esposa e três filhos.

Leia também: ‘Quilombolas no Censo 2022: ‘Invisibilidade nos tira o direito de viver de forma digna nos territórios’

O crime até hoje segue sem solução, mas a suspeita é que o assassinato tenha sido motivado por disputas territoriais nas terras do quilombo Pitanga dos Palmares, região metropolitana de Salvador, onde Binho representava uma das lideranças mais ativas.

Môa do Katendê

mestre moa

 

Campeão do Festival da Canção do bloco Ilê Aiyê em 1977, mestre Môa também é responsável pela promoção do afoxé, fundou o Badauê em 1978, e em 1995 o Amigos de Katendê. Defendia um processo de “reafricanização” da juventude baiana e do carnaval, seguindo as propostas de Antonio Risério.

No dia 18 de outubro de 2018, Môa do Katendê foi assassinado com doze facadas pelas costas, após o primeiro turno das eleições gerais. Segundo testemunhas e a investigação policial, o ataque foi motivado por discussões políticas, após Mestre Môa declarar ter votado em Fernando Haddad. O agressor, apoiador do candidato adversário Jair Bolsonaro (PL), teria discutido com o capoeirista e deixado a cena, voltando logo em seguida com o facão com o qual teria desfilado ao menos 12 facadas. O capoeirista não resistiu e morreu no local.

O barbeiro Paulo Sérgio Ferreira de Santana, autor confesso do assassinato do mestre de capoeira, foi condenado a 22 anos de prisão em regime fechado, durante um julgamento no Fórum Ruy Barbosa, em Salvador, em novembro do ano passado.

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