Uma nova geração de jovens africanos ampliou a pressão sobre museus ocidentais para a devolução de artefatos saqueados durante o colonialismo, afirmou Ernesto Ottone, diretor-geral adjunto da UNESCO, em entrevista à Agence France-Presse (AFP), nesta segunda-feira (22). Segundo ele, o aumento das demandas reflete uma mudança significativa de atitude e consciência sobre o tema.
“Nos últimos cinco ou seis anos, temos visto pressão nas ruas”, destacou Ottone, que também foi ministro da Cultura no Chile, durante uma conferência da UNESCO em Addis Abeba, na Etiópia, sobre a restituição de obras de arte ao continente africano.
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Embora países europeus tenham iniciado esforços de devolução, Ottone enfatizou que o processo é “complexo” e depende das legislações de cada nação. Ele citou iniciativas de universidades, museus e autoridades, mas alertou para os desafios ainda enfrentados.
Devoluções esporádicas e barreiras legislativas
Em 2017, o presidente francês Emmanuel Macron prometeu devolver o “patrimônio africano à África”, o que resultou na restituição de 26 itens ao Benin em 2021. Contudo, desde então, o progresso foi limitado. Devoluções adicionais aos países africanos exigem leis específicas para a remoção de itens das coleções públicas, dificultando o processo.
Em vez de devoluções definitivas, a França tem oferecido empréstimos temporários, como o caso do tambor Djidji Ayokwe, confiscado pela França em 1916, e da coroa de Ranavalona III, última soberana de Madagascar, que retornou ao país de origem apenas como empréstimo.
No Reino Unido, a disputa é ainda mais acirrada. Museus britânicos enfrentam crescentes reivindicações por itens como os bronzes de Benin, esculturas sagradas retiradas da Nigéria em 1897, mas permanecem resistentes à devolução. Uma lei britânica de 1963 impede que o British Museum retire itens de sua coleção permanente. Críticos argumentam que a restituição poderia desencadear uma série de pedidos que “esvaziariam os museus do país”.
Pressão global e a mudança de narrativa
De acordo com o relatório Savoy-Sarr, de 2018, apenas na França, cerca de 90 mil itens de origem subsaariana estão armazenados em museus. Para Ottone, o crescente engajamento da nova geração, especialmente de jovens que visitam museus europeus com um olhar crítico, tem promovido uma “nova consciência” sobre as injustiças históricas.
A restituição de artefatos é vista como um passo crucial para a reparação histórica e cultural, mas enfrenta resistência institucional e burocrática. Enquanto países como Grécia e Nigéria continuam pressionando pelo retorno de itens icônicos, como os mármores do Partenon e os bronzes de Benin, o debate sobre o papel dos museus ocidentais em preservar patrimônios de outras culturas ganha intensidade.
Para os defensores da restituição, a devolução dos artefatos saqueados é uma questão de justiça histórica e respeito às culturas que foram saqueadas, enquanto opositores temem uma reconfiguração drástica das coleções de museus e uma revisão generalizada do colonialismo cultural.