Há 100 dias, a modelo e designer de interiores Kathlen Romeu, de 24 anos e grávida de quatro meses, era alvejada com um tiro de fuzil no tórax na comunidade Lins de Vasconcelos, Zona Norte do Rio de Janeiro. O crime que chocou o país, até agora não teve sua investigação concluída pela polícia, que ainda não apresentou esclarecimentos sobre a autoria do disparo e o motivo que explica a presença dos agentes militares naquele 8 de junho. Familiares e amigos seguem reinvidicando a responsabilização dos culpados.
Em julho passado, foi realizada uma reconstituição do crime e entidades de defesa dos direitos humanos levantaram a hipótese de a jovem ter sido morta durante um tipo de incursão irregular da polícia nas favelas, que é conhecida como “Troia” – quando um grupo entra na comunidade e se esconde em casas ou locais estratégicos para atirar em pessoas suspeitas de crimes, sem antes dar voz de prisão.
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Em homemagem à jovem, no último final de semana, amigos e parentes inauguraram uma quadra esportiva revitalizada pelos moradores, que a batizaram como o nome de Kathlen Romeu. O espaço de lazer, que fica em Cachombi, no Jacarezinho, também preserva a memória da luta por justiça para o caso. A revitalização foi uma ideia do Thiago Nascimento, do projeto Jacaré Basquete.
“Nossa mobilização, enquanto amigos, é para manter a memória dela viva, lembrando dos momentos que tivemos com ela, reforçando as hashtags levantadas. De modo geral, nos sentimos muito descrentes em relação à justiça e ao andamento do caso”, afirma Mariana de Paula, amiga de Kathlen Romeu.
Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, em resposta à Alma Preta Jornalismo, foi instaurado um PIC (Processo Investigatório Criminal), pela 3ª Promotoria de Justiça de Investigação Penal Especializada, para investigar, de forma independente, o caso e descobrir os fatos que causaram a morte da modelo.
O MP- RJ explicou que será necessária prova técnica para afirmar de que arma partiu o disparo que atingiu a jovem. Por sua vez, a Promotoria de Justiça junto à Auditoria Militar do Ministério Público do Rio de Janeiro também instaurou PIC para apurar eventual crime militar relacionado ao caso.
A assessoria da PM não deu detalhes se era ou não uma operação “Troia” e informou que os policiais militares envolvidos na ação continuam afastados do serviço das ruas e as armas foram entregues para a perícia, mas sem conclusão da análise até o momento.
O caso é investigado pela Delegacia de Homicídios da Capital e, de acordo com a PM, em paralelo às investigações da Polícia Civil, a Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) instaurou um procedimento apuratório para averiguar as circunstâncias do fato.
A deputada Renata Souza (PSOL) protocolou na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro o projeto de Lei Kathlen Romeu, que proíbe a prática de “Troia” em ações policiais.
Entenda o caso
Kathlen estava grávida de 13 semanas quando foi atingida por disparos de fuzil durante uma operação policial. A jovem chegou a ser socorrida, porém morreu no hospital Salgado Filho, no Méier. A morte da jovem aconteceu um mês depois da Chacina do Jacarezinho, que também contrariou a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de proibir operações policiais no Rio de Janeiro durante o período pandêmico.
Na época do ocorrido, a Polícia Militar do Rio de Janeiro afirmou que não houve operação e sim um confronto após policiais da UPP Lins serem “atacados a tiros durante patrulhamento”. Ainda segundo a PM, “após cessarem os disparos, os agentes encontraram uma mulher ferida e a socorreram ao hospital”.
Kathlen não morava na comunidade há um mês e estava com a avó a caminho do trabalho da tia. Em entrevista a emissoras de TV, a avó disse que perdeu a neta e o bisneto em um “tiroteio bárbaro”. “Perdi a minha neta de um jeito estúpido. Ela estudava, trabalhava e era formada”, lamentou a avó de Kathelen, que segue aguardando a conclusão da investigação.