O segundo dia das atividades do Ciclo Afro durante a Feira do Internacional do Livro de Bogotá (FILBo) começou com Fabiana Cozza, ao som de Pixinguinha. Na manhã da terça-feira (23), ela recordou a data do Dia Nacional do Choro no Brasil — comemorado na mesma data — e cantou músicas em referência ao candomblé. Com um pandeiro nas mãos, a artista pediu à plateia para acompanhar o canto com as palmas da mãos.
Cozza participou da atividade “A música e a produção de novos imaginários políticos”, ao lado da artista e intelectual colombiana Ochy Curiel, com a mediação de Marcos Ramos. O painel foi acompanhado pela Alma Preta, que participa da FILBom na Colômbia. Fabiana Cozza deu sequência à apresentação com um vídeo do grupo Ilú Obá De Min, responsável por abrir o carnaval de São Paulo, com uma homenagem a Marielle Franco, ex-vereadora assassinada junto a seu motorista, Anderson Gomes, em 2018.
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Fabiana Cozza abordou ainda o histórico de parceria de pessoas negras, materializado nas irmandandes, desde o período do escravismo. Ela ressaltou as reivindicações de mulheres negras de participação na política nacional.
Na sequência, a professora e artista Ochy Curiel iniciou uma fala sobre a situação vivida pelo Haiti e a necessidade de uma solidariedade acerca dos desafios vividos pelo país, em especial por conta de toda simbologia do Haiti para a diáspora. O país teve a primeira revolução feita por pessoas escravizadas, a partir de 1791.
Ela deu sequência à fala com a explicação de que a música não é universal. Segundo ela, há músicas de caráter nacional, que impõem uma unidade, como é o caso dos hinos nacionais, que em diversas situações não representam as populações negras e indígenas.
“Vamos analisar a música com as classes políticas, com a raça. Qual o projeto de mundo que temos para as músicas? A música, o Candomblé e a Umbanda trabalham com a memória ancestral, que não pode ser identificada na memória acadêmica, mas no corpo, através do ritmo e do corpo”, afirmou.
Música e presença negra na universidade
Na sequência, Melissa Gomez apresentou os desafios e as conquistas do Centro de Estudos Afrodiaspóricos (Ceaf). Ela participou do debate “A presença afro-diaspórica na redefinição da Universidade”, com a presença do artista Tiganá Santana, com a mediação de Laura de La Rosa.
Pesquisadora da área de relações internacionais e políticas públicas, ela mostrou como o Ceaf tem prestado apoio para estudantes negros respeitando a possibilidade do erro — algo pouco aceito em relação à juventude negra.
Gomez ainda afirmou que o Ceaf desenvolve pesquisas sobre a diáspora africana e tem o desejo de se tornar uma referência no assunto na América Latina, com a possibilidade de trocas com centros e núcleos de outros países.
Já Tiganá Santana deu início à sua fala com um agradecimento sobre a estadia na Colômbia e ressaltou as conexões existentes com o Brasil. O artista contou sobre sua experiência como morador do estado da Bahia que, segundo ele, mesmo sendo uma das regiões mais negras fora do continente africano, não exclui a presença do racismo interpessoal e institucional na região.
Santana saudou as pessoas que lutam por uma múltipla presença negra nos espaços de poder, como a universidade. O artista sinalizou, contudo, que não se pode substituir personagens entre opressores e oprimidos nas universidades. Para ele, é preciso pensar em novos conhecimentos.
Religiosidade e celebração
Na parte da tarde, a discussão foi sobre o “Bembé do Mercado: Salvaguarda, Política, Festa e Devoção”, com a presença de Pai Pote, responsável pela coordenação do festejo, Rita Dias, professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), e mediação de Leonardo Moraes, diretor nacional do Sesc.
Pai Pote, vestido de azul em homenagem a Ogum, começou a atividade com um canto para o orixá. O dia 23 de abril é feriado em várias regiões do Brasil, como uma forma de celebrar São Jorge, que na região Sudeste é associado a Ogum e, em estados como da Bahia, a Oxóssi. Depois de celebrar Ogum, Pai Pote cantou para Oxóssi, Oxum e pediu axé para o encontro.
A professora Rita Dias iniciou com um pedido de licença para falar e, na sequência, trouxe uma reflexão sobre o que a universidade tem feito no país, no novo tempo colocado, de democratização do acesso, com mais estudantes negros e de periferias.
Durante o restante do tempo de fala, a professora falou sobre o Bembé do Mercado, que completará a edição de número 135 em 13 de maio deste ano e explicou que a celebração reúne cerca de 60 terreiros de religiões de matriz africana do recôncavo baiano.
A festa é uma celebração que ocorre em praça pública, no mercado municipal de Santo Amaro da Purificação (BA). “A festa é a população negra reescrevendo a sua história. Essa memória é a narração própria”, afirmou.
Dias disse ainda que a prefeitura passou a reconhecer a festa, construiu o espaço para o festejo e acredita que o Bembé do Mercado é uma representação das lutas pela garantia das tradições coletivas do povo negro.
Ao final, a pesquisadora apresentou um documentário sobre a festa, com a explicação das origens, os principais organizadores e a simbologia da celebração para a cidade, a região e as religiões de matriz africana