Introduzir o tema do conhecimento e respeito à ancestralidade e promover autoaceitação infantil de forma divertida são os objetivos dos projetos Carimbó das Crianças e Companhia Caruru.
Conheça essas iniciativas, que utilizam brincadeiras para estimular a autoestima de crianças negras e apresentar uma Amazônia e África distintas dos estereótipos negativos, muitas vezes difundidos no imaginário infantil.
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Carimbó das Crianças
O carimbó é uma dança que tem como marca movimentos giratórios, roupas de cores vivas e o uso de instrumentos de percussão. De origem no século 17, o ritmo chegou ao Brasil junto aos negros escravizados, e, no Pará, incorporou elementos da cultura indígena, tornando-se uma das mais populares danças da região amazônica, reconhecida como patrimônio cultural imaterial do Brasil.
Foi pensando em inserir as crianças nesse movimento da cultura popular que há dois anos a produtora cultural Lorena Saavedra realiza o Carimbó das Crianças. Dentre as dinâmicas do evento, estão oficinas de tambor e maracá, contação de históricas amazônicas, educação ambiental e apresentação de grupos de carimbó.
Por meio de dinâmicas como as oficinas de tambor e maracá as crianças aprendem a tocar os instrumentos, o que as aproxima da cultura popular. “Quando a criança tem o contato com instrumentos típicos do carimbó, a gente sai do imaginário e vai para a prática, porque ela está vivenciando o carimbó e isso é transformação social”, destaca.
Segundo a arte-educadora, o carimbó é um dos elementos chaves no despertar da identidade afroamazônica, que precisa ser estimulada desde cedo.
“Essa identidade afroamazônica precisa ser cultivada desde a infância para que formemos adultos conscientes, que reconhecem de onde vêm e onde estão. O Carimbó das Crianças é uma política de bem viver, onde é promovido o conhecimento da cultura popular da Amazônia”, explica Lorena.
Iniciativas como o Carimbó das Crianças visam também valorizar a ancestralidade afroindígena, ainda negligenciada no Pará e no Brasil como um todo.
“A escola não tem disciplina sobre cultura popular. O desconhecimento sobre a nossa própria história ainda é muito grande, então é preciso que a gente faça esse tipo de atividade para expandir conhecimento sobre nós mesmos, principalmente para as crianças. Criar conexão com o carimbó, é se conectar com a natureza também, pois isso está enraizado na cultura popular. Não tem como falar de crise climática sem valorizar o carimbó”, pontua a arte-educadora.
Companhia Caruru
Brincar para conhecer uma África mais próxima da realidade da criança do que se imagina. Fundada pelas irmãs gêmeas Ana Caroline e Amanda de Jesus, a Companhia Caruru realiza ocupações brincantes em São Paulo (SP), incorporando elementos do cotidiano brasileiro, relacionados a culturas afrodiaspóricas, para estimular a imaginação e criação dos pequenos.
As irmãs contam que o repertório de brincadeiras foi construído a partir de pesquisas, formações e intercâmbios com pessoas negras de diversas regiões da África e do Norte e Nordeste do Brasil ao longo de oito anos. Uma das dinâmicas consiste em espalhar os objetos em um espaço, como pilão, esteira de palha, peneiras e bonecas pretas, e deixar a criança livre para explorar.
“A nossa ideia é aproximar a criança desses elementos, que fazem parte do cotidiano dela e que falam muito sobre a ancestralidade dela, mas que muitas vezes os pequenos não enxergam referências nesses objetos”, diz Amanda.
Entre o repertório de brincadeiras, tem ainda a caça ao tesouro, onde as pistas trazem referências a curiosidades e descobertas da cultura negra e africana.
“A ideia das nossas dinâmicas é promover um outro olhar para as culturas negras. O que as crianças do mundo todo têm em comum? Elas brincam, inclusive as crianças negras e africanas. Ou seja, isso é importante, porque desmistifica uma África que só é relacionada à miséria, fome e escravidão, e traz ela para perto de nossas crianças, que pensam: ‘elas brincam de coisas que eu também brinco’”, completa Ana.
O nome da companhia, Caruru, é uma referência direta à oferenda a base de quiabo oferecida aos Ibejis, divindades iorubás representadas por crianças gêmeas, que são cultuadas no candomblé e outras religiões de matriz africana.
“Diz o conto que os Ibejis salvaram a população inteira de uma cidade. Quando nenhum adulto conseguia, vieram as crianças e enganaram a morte, possibilitando a vida. Ibejis são alegria, felicidade, saúde para as pessoas e, com isso, queremos dizer que entendemos a importância da criança na comunidade. Os Ibejis representam as crianças pretas da Companhia Caruru”, detalha Ana.
Três brincadeiras africanas para fazer com as crianças, segundo a Cia Caruru
Primeiríssima infância (até os 3 anos de idade)
Obwisana (Gana)
Brincadeira para todas as idades, que pode ser adaptada também para a primeríssima infância. A dinâmica consiste em duas ou mais crianças formarem um círculo e passarem de mão em mão uma pedra batendo no chão no ritmo da música. Mesmo que a criança não acompanhe os movimentos, ela pode ser estimulada a dançar pelo ritmo da música.
Primeira infância (de 4 a 6 anos de idade)
Terra-Mar (Moçambique)
Semelhante ao popular vivo-morto, onde a criança abaixa e levanta. Nessa brincadeira de Moçambique é utilizada uma corda ou fita para separar os dois lados, que correspondem à terra e ao mar. Ao falar “terra”, a criança pula para um lado; ao falar “mar”, ela pula para o outro.
A partir de 7 anos
Mancala
Milenar jogo de tabuleiro de origem africana que desenvolve raciocínio lógico da criança. O tabuleiro do mancala conta com 14 espaços dispostos seis em cada lado e um em cada extremo do tabuleiro. Os seis espaços de cada lado correspondem a um jogador, bem como o armazém da extremidade direita.
Um dos jogadores distribui quatro sementes em cada uma das casinhas. Os dois armazéns ficam vazios, pois serão usados para colocar as sementes capturadas. Para decidir quem começa o jogo, um dos jogadores esconde uma semente em uma das mãos. Se o adversário adivinha a mão que a esconde, começa o jogo.
Por turnos, o primeiro jogador pega as quatro sementes de uma das seis cavidades e “semeia” de uma em uma a começar pela casinha seguinte à sua direita. O movimento se faz em sentido anti-horário, sendo conhecido como movimento de semeadura.
Se, ao mover as peças, termina em seu armazém, joga de novamente. Do contrário, termina seu turno, dando vez ao outro jogador. Além disso, tenha em conta:
Se você passa pelo armazém do seu adversário, durante a semeadura, não tem que colocar peças nela. Você só pode colocar sementes no seu próprio armazém;
Se a última peça da semeadura ocupa uma cavidade vazia do seu lado do tabuleiro, você pode capturar todas as sementes da cavidade oposta e a sua própria. Todas essas sementes capturadas são colocadas diretamente em seu armazém.
O jogo termina quando um jogador não tem mais sementes para semear. Neste caso, o outro jogador tem direito de capturar as sementes. O jogador que tiver capturado mais sementes é o ganhador. (Fonte: Educlub)