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Participação ativa dos pais no aleitamento materno impulsiona desenvolvimento na primeira infância

Especialista destaca que, ao assumir tarefas como cuidar do bebê durante a noite e auxiliar com afazeres de casa, o pai permite que a mãe foque exclusivamente na amamentação
Paulo Maurício e a esposa Natália, que segura o filho do casal quando estava na primeira infância.

Foto: Acervo pessoal/Paulo Maurício

2 de dezembro de 2024

“Eu me envolvi no processo de amamentação desde o início. Minha esposa teve uma gestação de risco e não conseguiu produzir muito leite, então a gente procurava maneiras de ajudá-la a melhorar a produção, buscando alternativas alimentares e outros recursos”, relata o inspetor de alunos Anderson Silvestre, de 44 anos, morador da Brasilândia, na periferia da Zona Norte de São Paulo. 

Ele, que é esposo de Lilian Atanazio Silvestre, de 43, contou à Alma Preta como foram os primeiros momentos de vida da filha, Luíza Maria, atualmente com oito anos. “Nos primeiros meses, as coisas foram mais difíceis porque ela não tinha uma quantidade suficiente de leite e nossa filha tinha refluxo. Minha esposa amamentava, mas eu auxiliava no processo sempre que ela estava muito cansada”, diz o pai.

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Anderson também destacou que, durante este período, o casal precisou complementar a alimentação com leite artificial, já que o leite materno não era suficiente. Ele também assumia a responsabilidade de alimentá-la, permitindo que sua esposa descansasse e recuperasse as energias para produzir mais leite. 

“Eu pegava a bebê, colocava ela de pé ou deitadinha no meu colo, para evitar que o leite voltasse e ela engasgasse devido ao refluxo. Minha filha também sempre dormiu muito pouco, o que tornava tudo ainda mais desafiador. Então, para que minha esposa conseguisse descansar um pouco, a gente revezava, trocando de turno a cada quatro horas, para garantir que ela pudesse dormir e também para eu poder ajudar mais”, relembra. 

Anderson e Lilian se empenharam para garantir que a pequena Luíza recebesse o máximo de tempo possível de aleitamento materno, valorizando tanto os benefícios para a saúde da filha quanto o vínculo proporcionado por esse momento. 

Anderson Silvestre e a filha, quando estava em seus primeiros meses.
Anderson Silvestre e a filha, quando estava em seus primeiros meses. Foto: Acervo pessoal

A preocupação do casal é a mesma da Organização Mundial da Saúde (OMS), que recomenda o aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida como a melhor forma de nutrir os bebês. Após esse período, a orientação é introduzir alimentos complementares, mantendo o aleitamento até, no mínimo, os dois anos de idade.

Além disso, o artigo “Por que investir e o que será necessário para melhorar as práticas de amamentação?”, publicado pelo The Lancet e disponível na biblioteca do site da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, destaca que a melhora nas práticas de amamentação poderia ajudar a prevenir as mortes de 823 mil crianças menores de cinco anos, a cada ano, e também previne o câncer de mama em até 20 mil mulheres. Entre os benefícios também está a redução da morbidade, melhora no potencial escolar das crianças e na renda quando chegam à vida adulta. 

“A amamentação melhora a sobrevivência, a saúde e o desenvolvimento de todas as crianças. Esta prática salva vidas de mulheres e contribui para o desenvolvimento do capital humano. Os benefícios atingem populações que vivem em países de alta, média e baixa renda”, diz a publicação.

Organização, desafios e descobertas 

Para auxiliar a esposa Natália, de 36 anos, com a amamentação de Davi, hoje com oito anos, à época, o encarregado de logística e morador do bairro Engenho Pequeno, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, Paulo Maurício Loureiro Cardoso, de 41, fez uma planilha feita à mão para acompanhar as mamadas. 

O registro incluía horários de amamentação, observações sobre arrotos e detalhes como fraldas e cólicas. Ele ficou responsável não apenas pelas anotações, mas também por colocar o bebê para arrotar após mamar, uma tarefa que aprendeu na prática.

Nos primeiros dias, a presença da sogra foi essencial. “Ela ficou conosco na primeira semana, nos orientando, já que era nosso primeiro filho e estávamos aprendendo”, lembra o pai Paulo. Ele destaca que o envolvimento direto na rotina inicial foi crucial para ele e sua esposa se adaptarem à amamentação e aos cuidados com o bebê.

Entre os principais desafios, o pai menciona a dificuldade de identificar as causas do choro de Davi. “Ele chorava muito e mamava bastante. Muitas vezes, ficávamos em dúvida se era fome, fralda suja, cólica ou até assaduras. Foi um período de adaptação para entender os sinais dele”, explica. 

Para entender melhor a situação a qual ele e a esposa estavam passando, o encarregado recorreu a vídeos no YouTube, pesquisas na internet e orientações do hospital para entender melhor o processo de amamentação. Ele também contou com a experiência prática da sogra, que já tinha cuidado de outros filhos e trabalhava em uma creche. 

“Aprendi muito observando e aplicando as dicas que recebíamos, mas o aprendizado mais importante veio do dia a dia, com os desafios que enfrentamos juntos. É uma fase desafiadora, mas cheia de alegria. Ver nosso filho crescer saudável e feliz enquanto nos transformamos como pais é algo muito especial”, ressalta.

Benefícios da participação ativa do pai nos primeiros meses de vida da criança

O especialista em masculinidades e paternidades Luciano Ramos destaca a importância da participação ativa do pai durante o puerpério e os primeiros meses de vida do bebê, tanto para a mãe quanto para a criança. Segundo ele, “o bebê se beneficia diretamente de um ambiente saudável e seguro criado pelo pai, livre de violência e repleto de afeto e proteção”. 

Ramos explica que o papel do pai vai além do apoio emocional, sendo ele responsável por criar um ambiente de equidade nas tarefas domésticas e no cuidado com o bebê, especialmente durante a licença-paternidade. 

“Quando o pai cuida da criança para a mãe poder descansar — trocar fraldas ou dá banho no bebê — ele está contribuindo significativamente para o bem-estar da família”, explica. Para o profissional, essas ações permitem que a mãe descanse o necessário para se dedicar à amamentação, o que é crucial para o desenvolvimento infantil.

“A amamentação não é um processo simples para todas as mulheres, e idealizá-la pode gerar cobranças injustas”, afirma. Segundo Ramos, o papel do pai é fundamental para criar um ambiente acolhedor e buscar alternativas, como leite de bancos de leite, caso a produção materna não seja suficiente. “Até gestos simples, como uma massagem nos ombros da mãe, ajudam a criar um ambiente mais relaxado para a amamentação”.

O especialista também enfatiza a necessidade de divisão igualitária das responsabilidades domésticas. E destaca que, ao assumir tarefas como cuidar do bebê durante a noite ou lidar com as demandas da casa, o pai permite que a mulher foque exclusivamente na amamentação. 

“Sabemos que as tarefas domésticas consomem muito tempo das mulheres. Quando o pai assume essas responsabilidades, a mãe pode se dedicar integralmente ao bebê”, observa.

Embora ainda não haja pesquisas conclusivas que associam diretamente a participação paterna à maior duração da amamentação, Luciano Ramos acredita que a presença ativa do pai torna esse processo mais prazeroso para a mulher. “O homem pode fazer tudo no cuidado com a criança, exceto amamentar. Ele deve dar banho, trocar fraldas e preparar o ambiente para a mãe, garantindo que ela se sinta segura e apoiada”, pontua. 

Pais negros e a dificuldade de paternar

Diferente de Anderson e Paulo, que auxiliaram as esposas no cuidado com os filhos na fase da amamentação, muitos pais negros têm dificuldade de exercer a paternidade. De acordo com Ramos, esses sujeitos não são vistos como homens e, por isso, também não são percebidos como pais. 

“Muitos desses homens cresceram sem a presença paterna e, por isso, desconhecem a prática da paternidade. Além disso, os aspectos culturais do machismo, somados aos fatores históricos e sociais que afetam os homens negros, dificultam o exercício pleno da paternidade”, enfatiza. 

Segundo o especialista, para mudar essa realidade e incluir os pais negros no cuidado com a amamentação, é necessário que os profissionais das diferentes políticas públicas olhem os homens negros a partir da ideia de humanização. 

“Por outro lado, a política pública de saúde, por meio do pré-natal do parceiro, pode incentivar o pai desde a gestação a participar ativamente dos cuidados. Aí vale lembrar que o pai precisa ser visto e cuidado, também, durante a gestação. Isso ajuda a vincular o pai ao bebê. É durante a gestação que esse homem pode aprender a estimular a amamentação e qual a participação dele nesse processo”, finaliza.

Este conteúdo faz parte de uma parceria com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.

  • Formado em Jornalismo e licenciado em Letras-Português, morador da periferia de Maceió (AL) e pós-graduado em jornalismo investigativo pelo IDP. Com experiência em revisão, edição, reportagem, primeira infância e jornalismo independente. Tem trabalhos publicados no UOL (TAB, VivaBem, ECOA e UOL Notícias), Agência Pública, Ponte Jornalismo, Estadão e Yahoo.

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