Em um domingo dominado pela curiosidade de uns e a devoção de outros a respeito dos protestos em prol do presidente Jair Bolsonaro, uma manifestação organizada por favelas chamou a atenção em plena praia de Ipanema.
Texto / Solon Neto
Fotos / Solon Neto
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Idealizada por movimentos sociais e organizações de diversas favelas do Rio de Janeiro, a manifestação sob a bandeira “Parem de nos Matar” reuniu centenas de pessoas. Segundo os representantes ouvidos pelo Alma Preta, 79 grupos participaram da organização do protesto.
A fagulha que disparou o movimento foi a morte do gari comunitário Willian Mendonça Santos na madrugada na segunda-feira, 22 de abril deste ano, no Morro do Vidigal. Na data da morte, moradores dentro do morro fecharam a Avenida Niemeyer, importante via próxima ao Vidigal, em protesto, inclusive ateando fogo em lixeiras.
Segundo os moradores, Willian foi morto por tiros da Polícia Militar. Em 2019, a PM está bateu recordes de mortes em ações policiais, com 432 registros apenas nos 3 primeiros meses do ano, o maior número desde que a estatística passou a ser registrada, duas décadas atrás.
“Nós fizemos esse ato após a morte de Willian Mendonça, um gari do Vidigal apelidado de Nera. [Ele] foi assassinado covardemente ao ir buscar o seu filho por conta de um tiroteio. Ele foi buscar a criança que estava na rua brincando, avisou que era morador, desceu o morro avisando que era morador, estava com uma roupa de gari e mesmo assim foi assassinado pela polícia”, afirmou Bárbara Nascimento, do coletivo de mulheres Favela no Feminino, do Morro do Vidigal, em entrevista ao Alma Preta.
Bárbara também afirma que quando os moradores desceram até a avenida Niemeyer para protestar, a polícia teria simulado tiroteios com a intenção de assustar parte das pessoas no morro.
“Os que lá estavam na Niemeyer se manifestaram, o que é um direito cidadão. Mesmo assim o Choque veio e de uma forma muito brutal repreendeu a nossa manifestação. E chegamos à conclusão de que não adiantava manifestação na favela. A gente precisava mostrar nossos corpos – nossos corpos negros – aqui no asfalto. Nós não vamos só descer para vender nossa força de trabalho e nem para fazer carnaval. Nós vamos descer toda que for preciso”, afirmou Bárbara.
O protesto no domingo (26) aconteceu na altura do posto 8 da praia de Ipanema. O local, a Avenida Vieira Souto, é um dos endereços mais nobres do Rio de Janeiro. A intenção dos organizadores era levar a manifestação para uma área rica da cidade e explicitar a desigualdade social, garantindo também mais segurança aos manifestantes.
“Os moradores de favela não aguentam mais a violência do Estado – um Estado genocida que tem como principal objetivo exterminar a juventude negra”, disse, ao Alma Preta, Marcelo Dias, dirigente nacional do Movimento Negro Unificado, uma das organizações que ajudou a realizar a manifestação.
“Estar na rua hoje aqui na Zona Sul, um espaço privilegiado, onde a morte das pessoas que vivem nas camadas populares, nas periferias e favelas não acrescenta nenhum tipo de sentimento, de compaixão, de empatia… Então vir para cá, trazer os coletivos, as mães vítimas da violência de Estado para dizer ‘Parem de Nos Matar’ é fundamental”, afirmou, em entrevista ao Alma Preta, a deputada estadual Mônica Francisco, do PSOL do Rio de Janeiro, que tem denunciado dentro da Assembleia Legislativa do Estado o recorde de mortes em ações policiais no Rio de Janeiro.
As organizações presentes anunciaram que continuarão conectadas com o objetivo de avançar o debater e também o protesto.