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Empresa de entrega de “jumbo” em presídios: exploração ou prestação de serviço?

13 de março de 2018

Kits de produtos são enviados a penitenciárias mediante solicitação de famílias de detentos; iniciativa é elogiada por dono da empresa, mas é também alvo de críticas de especialistas

Texto / Amauri Eugênio Jr.
Imagem / Wilson Dias / Agência Brasil

“Cabe a nós atendermos a todos requisitos estabelecidos em cada unidade prisional para o envio do Jumbo, com referência à cor, embalagens, produtos, quantidades, peso, acondicionamento e regras de postagens. Devido às regras, os familiares sentem-se às vezes despreparados para atende-las. Então, podemos proporcionar nossos serviços, que na maioria dos casos se tornam mais baratos e eficientes do que os prestados diretamente pelo familiar.” É desse modo como Sebastião Pereira Jr. fala sobre o Jumbo Delivery, serviço criado por sua empresa, a Jumbo CDP, para envio de “jumbos” – modo como os kits com produtos para presidiários – são chamados em centros de detenção.

O serviço, que segundo o idealizador tem como objetivo ser um elemento facilitador para familiares de presidiários e atenuador do sofrimento dos detentos por meio do envio de produtos, como os “de higiene pessoal, alguma guloseimas, vestuário e também cigarros”, é feito em 90 unidades prisionais cadastradas no site, totalizando média mensal de 300 “jumbos” enviados. Ainda, de acordo com Pereira Jr., a empresa não tem parceria com nenhum presídio vinculado à SAP (Secretaria de Administração Penitenciária) e segue todos os trâmites legais até chegar ao destinatário.

Além do pacote

Um dos fatos que chamaram a atenção no que diz respeito ao Jumbo Delivery está relacionado ao comércio criado ao redor da realidade carcerária em São Paulo e, como consequência, em todo o Brasil. Coincidência ou não, o aumento vertiginoso da população carcerária criou novos nichos de mercado.

De acordo com o Infopen (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias), de 2016, a população carcerária brasileira estava estimada em 726,7 mil detentos. Essa quantidade é mais do que o dobro da observada em 2005, quando havia 361,4 mil presos.

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Crescimento das taxas de encarceramento no Brasil transformaram os presídios nacionais em um nicho de mercado (Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)

“As prisões brasileiras se converteram nesse complexo industrial e em um lucrativo negócio da economia neoliberal. Precisamos considerar a obtenção de lucros das empresas contratadas para fornecer alimentos e vestuários, assim como analisar a obtenção de lucros de quem devora os recursos públicos”, explica Dina Alves, advogada e coordenadora do departamento de justiça e segurança pública do IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), ao falar sobre a importância de se considerar que o sistema prisional brasileiro está no radar comercial.

“Alguém lucra com o sofrimento humano e com a construção de novos presídios. Isso porque não estou falando da exploração da mão de obra dos presos e das presas no interior das cadeias. Não existe regulamentação para esse tipo de negócio nas portas do cárcere”, completa.

Comércio além dos portões

De imediato, o que se pensa ao falar sobre comércio no contexto prisional é a atuação de ambulantes que se instalam em frente a presídios e até mesmo em serviços como o “jumbo delivery”.

A questão abrange grandes empresas que fazem parcerias para a execução de serviços para o poder público e se tornam responsáveis até mesmo pela administração de presídios.

Um caso notório é da Umanizzare, corporação que se autodenomina como a maior empresa de gestão de presídios da América Latina. A empresa era responsável pela administração do Compaj (Complexo Penitenciário Anísio Jardim), em Manaus (AM), onde ocorreu massacre no início de 2017 no qual 56 detentos foram mortos. À época, o Ministério Público de Contas do Amazonas protocolou pedido no TCE (Tribunal de Contas do Estado) para rescisão do contrato da empresa com o Estado, pois havia indícios de irregularidades como conflito de interesses empresariais e ineficácia de gestão. Contudo, o contrato com a Umanizzare foi renovado em dezembro do mesmo ano.

“Não é pelo sistema penitenciário brasileiro não ser privatizado que o Brasil está fora desse complexo industrial – está dentro e muito. É igualmente importante, conveniente e lucrativo haver cada vez mais o crescimento da população carcerária e o Estado brasileiro promove isso”, ressalta Dina Alves.

O outro lado

Questionado sobre críticas relacionadas a aspectos mercadológicos, Sebastião Pereira Jr. argumentou desconhecê-las, uma vez que a relação da empesa é apenas com as famílias dos presidiários, para as quais os serviços são oferecidos “com preço vantajoso”.

Outro aspecto citado pelo empresário diz respeito sobre o aspecto humano, o mais importante para a empresa, independentemente do delito supostamente cometido pelos detentos. Além disso, destaca o apoio prestado a familiares, por meio do esclarecimento de informações como horários de ônibus para unidades prisionais e procedimentos para visita dos parentes encarcerados.

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