Episódios de racismo já aconteceram diversas vezes no futebol, em especial quando se trata de Rússia e Ucrânia. Na temporada de futebol de 2016 e 2017, houve 89 incidentes racistas e de extrema-direita na Rússia, de acordo com dados coletados pelo SOVA Center, organização que desenvolve pesquisas sobre nacionalismo e racismo no país. De lá para cá, o país acumulou cerca de 200 outros casos similares, segundo o órgão, fato que já gerou a suspensão de times em que as torcidas faziam qualquer tipo de apologia ao racismo.
A partida entre Shinnik Yaroslavl e Spartak Moscou, realizada em 2018 durante a quinta fase da Copa da Rússia, foi marcada por uma enorme confusão entre torcedores e polícia. Durante o tumulto, um integrante da torcida do Shinnik Yaroslavl exibiu uma bandeira com a suástica, símbolo do nazismo. Cerca de 30 torcedores foram presos.
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O clube CSKA, considerado o mais tradicional do país, teve parte do estádio fechado após os torcedores repetirem cânticos racistas contra o Anzhi, time da região do Cáucaso. Uma faixa simulava o escudo do time com os dizeres “planeta animal”.
Em setembro do ano passado, uma faixa exposta na Arena do Zenit, em São Petersburgo, levantou denúncias de racismo por parte da torcida do tradicional clube russo contra contra o atacante brasileiro negro Malcom que, na época, era recém-contratado da equipe. A direção do clube, no entanto, negou qualquer teor preconceituoso e acusou a imprensa ocidental de ter mal interpretado a mensagem exibida durante a partida.
“Obrigado aos diretores por respeitarem nossas tradições”, dizia a faixa atrás do gol. Jornais europeus, como o francês L’Équipe, consideraram a mensagem irônica, levando em consideração o histórico racista e nacionalista do time russo, que apoia declaradamente as atitudes do presidente russo Vladimir Putin. A direção do time russo já declarou à imprensa internacional que é tradição no clube não contratar pessoas de outras nacionalidades.
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Outro caso de racismo no futebol russo aconteceu em 2019, com o jogador brasileiro naturalizado russo, Ari, atacante do Krasnodar. O atleta foi alvo de represálias após duas convocações consecutivas para defender a seleção da Rússia. Pavel Pogrebnyak, jogador do Klub Ural com passagem pela seleção, questionou a “presença de um negro” na lista durante entrevista a um jornal local. Ele usou uma palavra que pode significar tanto “engraçado” como “ridículo” para definir a convocação de Ari.
“É engraçado/ridículo ter um jogador negro na seleção russa. Eu não entendo o sentido disso. Por que deram um passaporte russo ao Ari?”, indagou Pogrebnyak”.
“Na lateral direita, nós temos o Igor Smolnikov, do Zenit. Poderíamos montar um time sem estrangeiros”, completou o atleta russo na ocasião. Alexander Baranov, o responsável pela Liga Russa, informou que uma investigação sobre o caso chegou à conclusão de que houve racismo. A partir dessa informação, Pogrebnyak foi condenado a pagar uma multa, segundo regras do Comitê de Ética.
Na Ucrânia, por sua vez, o time Dínamo de Kiev recebeu o Chelsea pela Champions League em 2015, em jogo realizado na capital ucraniana. Durante a partida, um grupo de torcedores do time da casa foi até outro setor do estádio e agrediu quatro pessoas negras, também torcedores do Dínamo. A atitude custou 100 mil euros aos cofres do clube, obrigado – além de pagar a multa – a estampar a frase “No to racism” (Não ao racismo, em inglês) em faixas seguradas pelos jogadores antes do início das partidas durante toda a temporada de jogos.
Mas casos de racismo no futebol ucraniano não pararam por aí. Em 2016, foi fundado no país o National Corps, um partido político que emergiu de um grupo paramilitar, o Azov, com atuação no leste da Ucrânia. Líderes do partido são também lideranças dos grupos neonazistas de torcedores do Dínamo de Kiev.
O Shakhtar, clube ucraniano, também esteve envolvido em manifestações racistas em 2016. Em partida da Liga Europa, torcedores da equipe exibiram uma faixa com símbolos de extrema-direita. O clube foi punido pela Uefa. Na época, o coordenador do Observatório Racial do Futebol, Marcelo Carvalho, se manifestou a respeito.
Segundo Marcelo, o leste europeu concentra a maioria dos incidentes racistas, pois “são locais com poucos negros, onde os negros começam a crescer em número neste momento. Isso incomoda. Aí entra a questão do nacionalismo muito forte, a questão da xenofobia, o ódio ao imigrante, sobretudo, o negro”.
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