Texto: Pedro Borges / Foto: Hugo Lima
Estudante quer criar uma linha de produtos voltada para cineastas negros
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“Sempre que encontro alguma dificuldade durante as filmagens e não tenho recurso para executar, nasce o projeto de um novo equipamento”. Esse é Hugo Lima, estudante de Engenharia da Computação na Universidade Veiga de Almeida (UVA-RJ), cineasta, militante do movimento negro e produtor dos próprios equipamentos.
Nascido e criado na cidade do Rio de Janeiro, o jovem, que estudou em escolas pública e particular durante o ensino fundamental, logo na adolescência passou a frequentar o centro técnico estadual Visconde de Mauá. “Como sempre fui apaixonado por tecnologia, quis estudar eletrônica”.
A paixão, que seguiu pela vida adulta, o acompanha mesmo durante os momentos de folga. “No meu tempo livre eu gosto de criar, literalmente. Estou sempre programando algum micro-controlador ou algum aplicativo. Senão, estou filmando, editando fotos ou escrevendo alguma coisa”.
Hugo foi inclusive notícia do Blog Olhar Digital, quando pedia financiamento coletivo para construir uma ferramenta capaz de abrir fechaduras elétricas, controlar a temperatura de um ambiente fechado, descobrir se há vazamento de gases, saber em tempo real o gasto de energia, e ainda controlar a intensidade das lâmpadas.
O envolvimento com o audiovisual não demorou a vir. No final de 2015, por intermédio da irmã, Nathali de Deus, conheceu o coletivo negro Azoilda Trindade, do Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET-RJ). A vontade de registrar as atividades do grupo o levou a gravar seu primeiro documentário, “Negros Dizeres”.
A partir de então, as coisas caminharam. A namorada Carol Netto o alertou sobre o Festival 72h e, mesmo sem muitas esperanças de vencer, reuniu os colegas e se inscreveu. O resultado foram dois prêmios, 3° Melhor Curta e Melhor Roteiro. “Ficamos muito felizes e acabamos criando um coletivo com o mesmo nome do filme “Siyanda”, que em Zulu significa “Estamos Crescendo”. Desde então temos produzido juntos”.
Luz, câmera e criação
Foi durante esse processo que surgiu a necessidade de construir seus próprios equipamentos. O desejo de melhorar a qualidade dos vídeos logo esbarrou no valor dos materiais. Foi nesse momento que Hugo colocou em prática sua facilidade e experiência em projetos de automação e eletrônica.
Ele enaltece os pontos positivos de construir seus próprios materiais. “Eu consigo exercer minha criatividade para além do fazer o audiovisual. Consigo um equipamento com qualidade semelhante a um equipamento profissional por até 1/20 do preço de mercado e consigo compartilhar esse conhecimento com minha comunidade”.
Hugo (agachado e segurando troféu) e toda equipe do curta Siyanda
O alto valor dos equipamentos audiovisuais se transformam em uma barreira para a maior participação de negras e negros no mercado, de acordo com o cineasta. “Eu entendo esses valores extremamente altos dos equipamentos como uma estratégia racista de manter o poder da comunicação onde sempre esteve: longe de nós”. Ele acredita já ter economizado cerca de R$ 5.000 com a produção de seus equipamentos.
Hugo lamenta a falta de negros nesses espaços, muito importantes para a construção do imaginário coletivo. “Eu, como a maioria de nós, aprendi a entender que quem fala com você através de uma tela merece credibilidade só por estar ali. E esse ‘poder’ sempre foi usado contra o povo preto, através da má representação dos pretos e pretas na TV e no cinema, construindo a ideia de um negro/a inferior”.
Alguns dos produtos criados por Hugo Lima
As produções do coletivo Siyanda seguem. Nathali de Deus dirige o curta “Manga com Leite” e Hugo, o documentário “Quem nos educa”. O planejamento de novas obras é o pontapé inicial para a construção ferramentas inéditas. “Alguns equipamentos estão em processo de aprimoramento de software. Estou desenvolvendo um conjunto de luminárias inteligentes que se auto-regulam durante a filmagem. Pretendo criar uma linha de equipamentos para cinema e audiovisual, de baixo custo e alto desempenho, voltada para cineastas negros”.