Por: Fernanda Rosário
A taxa de analfabetismo entre as mulheres negras era mais que o triplo que entre as mulheres brancas em 2010. No mesmo ano, havia proporcionalmente 3,5 vezes mais empregadores brancos que negros entre as pessoas com ocupação. Esses são alguns dos dados reunidos na plataforma inédita do Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (Cedra), lançada no dia 16 de dezembro de 2022 de forma gratuita.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
A iniciativa reúne bases de dados, informações e oferece análises que permitem investigar as diferenças de condições de vida entre pessoas negras e não negras e revelar novas dimensões das desigualdades raciais no país. Desenvolvida por uma equipe de especialistas em ciências de dados e pensadores da questão racial, o objetivo da ferramenta é subsidiar políticas públicas, além de contribuir para a elaboração de estudos e políticas relacionadas às questões raciais.
“A imagem de que o Brasil é uma democracia racial, com tratamento igualitário para negros e brancos, é compartilhada por muitas pessoas. Os dados podem mudar a posição de várias delas e uma das propostas é conversar com esse público”, afirma o físico Marcelo Tragtenberg, integrante do Conselho Deliberativo do Cedra e um de seus fundadores.
De acordo com o físico, há várias motivações para o surgimento da ferramenta. Uma delas é que os dados sobre desigualdades raciais no Brasil estão espalhados em várias bases, não são fáceis de serem achados e, muitas vezes, são difíceis de serem compreendidos.
“Ativistas devem ser municiados de dados para fortalecer a luta por igualdade racial, particularmente o Movimento Negro. Esses dados chegando a gestores públicos e privados podem sensibilizar políticas de igualdade racial em várias áreas (educação, saúde, habitação, trabalho, saúde, violência, encarceramento)”, comenta Tragtenberg.
A base de dados da iniciativa, em um primeiro momento, reúne em só lugar informações disponibilizadas pelo Censo 2010 e pela Pesquisa por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) de 2012 a 2019. A partir das informações oficiais são realizados cruzamentos inéditos de dados de cor/raça com indicadores de renda, trabalho, escolaridade e característica dos domicílios. É possível fazer o download das tabelas para apoiar análises mais complexas.
“Essa ferramenta faz falta há muito tempo, e, hoje, quando a preocupação com a igualdade racial se ampliou, torna-se indispensável a plataforma, seja pela informação como pelo combate à desinformação”, destaca o integrante do conselho deliberativo do Cedra
Além disso, a ferramenta informa que foram definidos jovens e mulheres negras como foco para as análises, partindo do entendimento de que as diversas formas de discriminação presentes na sociedade – de raça, gênero, orientação sexual, etária etc.-, se sobrepostas, intensificam as opressões. Os dados também se detêm na análise do impacto da Lei de Cotas para estudantes negras e negros no Ensino Superior Federal.
A iniciativa prevê que nos próximos meses serão incorporados outros dados oficiais, como informações mais atualizadas e detalhadas disponibilizadas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ), dados de saúde produzidos pelo DATASUS/ Ministério da Saúde, dados de educação produzidos pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), informações sobre violência registrados nas Secretarias Estaduais de Segurança Pública e dados sobre encarceramento produzidos pelo Departamento Penitenciário Nacional.
“Acreditamos que é necessário questionar essas desigualdades, por isso problematizamos e buscamos respostas nas estatísticas oficiais. Os dados não são somente números. Eles são um retrato da realidade e jogam luz sobre determinados fenômenos sociais. Para enfrentar o racismo é fundamental termos informações confiáveis fundamentadas em dados de qualidade que possam ser acessados e utilizados facilmente por ativistas, gestores públicos, parlamentares e todas as pessoas que desejam a construção de uma sociedade antirracista”, informa o site da ferramenta.
Além do físico Marcelo Tragtenberg, fazem parte da fundação da plataforma e do conselho deliberativo do Cedra o ativista, escritor e presidente do conselho da Oxfam Brasil Hélio Santos, o economista Mário Theodoro, a historiadora e pesquisadora de relações raciais e de gênero Wania Sant’Anna e o economista e ex-presidente do IBGE Eduardo Pereira Nunes.
A plataforma pode ser acessada gratuitamente no site do Cedra, instituição independente e apartidária. Para a construção da ferramenta, a instituição contou com o apoio do Instituto Çarê, Fundação Itaú, Itaú Unibanco, Instituto Galo da Manhã e Instituto Ibirapitanga, além de parcerias com a Amazon Web Services, Bain & Company, Daniel Advogados e o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicos – IBASE.
Leia também: Casos de tortura em unidades prisionais aumentam em quase 38%