O Ministério da Cultura (MinC) anunciou 12 novas vagas para escritoras negras no Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023. A quantidade total de premiadas passou de 61 para 73 escritoras.
De acordo com o MinC, a ampliação do número de premiadas pretende valorizar a escrita literária no país, a efetividade das políticas afirmativas e a promoção da diversidade literária brasileira.
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Com a mudança, as candidatas da categoria escritoras negras, que obtiveram nota máxima na premiação (30 pontos), passam à categoria “ampla concorrência”, sem alteração do resultado já divulgado. As 12 novas vagas devem ser preenchidas observando a ordem de classificação e os critérios de desempate previstos no edital.
Agora, o número total de contempladas no Prêmio Carolina Maria de Jesus passa de 22 para 34 escritoras negras (46,57%). O prêmio também selecionou seis pessoas com deficiência (9,8%), três indígenas (4,9%), três quilombolas (4,9%) e 37 escritoras em ampla concorrência (60,6%).
Com o objetivo de impulsionar trabalhos literários produzidos por mulheres, o prêmio homenageia uma escritora brasileira de renome internacional: Carolina Maria de Jesus. O edital distribui R$ 50 mil para cada obra literária inédita produzida por mulheres brasileiras.
Com a ampliação no número de premiadas, o valor total oferecido pela pasta chega a R$ 3.650.000,00 (três milhões e seiscentos e cinquenta mil reais). O ministério analisou 1.922 obras literárias.
Edital do MinC é alvo de polêmica
A primeira edição do Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura Produzida por Mulheres 2023 é alvo de polêmicas, depois que um grupo de escritoras negras apontou irregularidades na seleção e pediu a revogação do edital. No dia 11 de janeiro, o coletivo foi recebido por uma equipe do Ministério da Cultura para conversar sobre o assunto.
Em nota publicada nas redes sociais, o coletivo “Nós, Carolinas do Brasil” reconhece a importância da ampliação das vagas, que “beneficiará muitas mulheres merecedoras de tal prêmio”, mas ressalta: “a atitude não resolve os demais erros apontados com clareza pelo coletivo ‘Nós, Carolinas do Brasil’”.
Entre as irregularidades, o coletivo enumera: as mulheres que compuseram a comissão de avaliação das obras inscritas não foram remuneradas pelo serviço; a metodologia de cotas; os requisitos de avaliação; o erro da comissão com a mudança de categoria de uma das candidatas; a ausência de explicação sobre a candidata que teve sua nota aumentada, sem que entrasse com recurso; e a discrepância regional no resultado final.
“Consideramos o aumento de 12 vagas na premiação um conserto insuficiente por toda a coleção de erros cometidos e que, ao diminuir danos específicos, também objetiva pôr fim às nossas reivindicações por respeito, justiça e democratização do acesso às políticas culturais”, diz a nota, que finaliza reforçando o pedido pela revogação do edital.
Entenda os erros apontados pelo coletivo
Para as representantes do movimento, a metodologia do prêmio promove “racismo estrutural e linguístico”, na medida em que restringe a participação de negras, quilombolas, indígenas, ciganas e Pessoas com Deficiência às vagas de cotas. Além disso, a premiação estabelece como critério de desempate o “domínio técnico no uso dos recursos linguísticos”, desconsiderando a pluralidade linguística sobretudo de indígenas e quilombolas.
Também foram apontadas irregularidades no processo seletivo. De acordo com o argumento, foi criada uma vaga extra, preenchida por uma candidata que inicialmente se inscreveu como “negra” e, depois, entrou com recurso para mudar a categoria para “não se aplica”. Uma outra escritora teve a pontuação aumentada, sem que apresentasse recurso e sem justificativa para o reajuste, e passou a ocupar a vaga deixada pela participante que trocou para a categoria de ampla concorrência.
Chama atenção, ainda, a desigualdade regional do prêmio. A região Norte, que concentra a maioria da população negra do país, é uma das menos representadas na seleção: apenas 6,56%. O Norte só fica atrás do Centro-Oeste, região de 4,92% das selecionadas. Em contrapartida, o Sudeste (52,46%) e o Sul (16,39%) concentram, juntos, quase 70% do recurso. A região Nordeste foi a segunda entre as escolhidas, com 19,67%.
Leia a nota completa do coletivo ‘Nós, Carolinas do Brasil’:
“Ontem fomos informadas pelo secretário Fabiano Piúba que o Ministério da Cultura oficializou a ampliação do número de premiadas da categoria negra no Edital Carolina Maria de Jesus. Embora saibamos que a medida beneficiará muitas mulheres merecedoras de tal prêmio, entendemos também que tal atitude não resolve os demais erros apontados com clareza pelo coletivo ‘Nós, Carolinas do Brasil’, principalmente sobre a metodologia utilizada na execução deste edital.
Em reunião com a equipe do Ministério da Cultura a dias atrás, nos foi informado que este edital foi um pedido pessoal do presidente Lula para promoção da literatura produzida por mulheres. Mas vale lembrar que as mulheres que compuseram a comissão de avaliação das obras inscritas não foram sequer remuneradas por tal serviço prestado. Isso comprova mais uma alarmante contradição no que diz respeito ao que se propõe e como foi a realização deste edital, um desrespeito ao trabalho literário (incluindo produção, leitura e avaliação) produzido por mulheres.
A este erro somam-se: a metodologia de cotas que o secretário busca corrigir com o aumento das vagas na premiação; os requisitos de avaliação que, dentre outros problemas, resultaram na inviabilidade de escritoras quilombolas e indígenas atingirem uma nota máxima 0u classificadora; o erro da comissão com a mudança de categoria de uma das candidatas resultando na vaga 61; a ausência de explicação sobre a candidata que teve sua nota “consolidada” vindo a ser premiada sem que a mesma tivesse sequer entrado com recurso; e a discrepância regional no resultado final.
Consideramos o aumento de 12 vagas na premiação um conserto insuficiente por toda a coleção de erros cometidos e que, ao diminuir danos específicos, também objetiva pôr fim às nossas reivindicações por respeito, justiça e democratização do acesso às políticas culturais.
Para nós, a decisão do Ministério da Cultura é a admissão dos erros cometidos neste prêmio e que estão sendo ‘corrigidos’ apenas através de uma concessão de vagas. É preciso dizer que tal concessão não nos contempla pois nossa ação não se trata apenas disso. Queremos urgentemente romper com a desigualdade racial mantida pela – e para – inferioridade epistemológica com que as instituições brasileiras tratam os conhecimentos oriundos da população negra e indígena.
Enfatizamos, então, a continuidade do nosso posicionamento pela revogação, revisão e relançamento deste edital, reconhecendo-o como peça fundamental a ser movida nessa imensa estrutura para avançarmos juntas/os/es rumo ao reconhecimento da diversidade intelectual brasileira – tão necessário para efetivação da democracia.”