PUBLICIDADE
PUBLICIDADE

Brasil repete padrão do governo Bolsonaro e mantém três espaços na COP 28

Separação dos espaços brasileiros ocorreu primeiro durante o governo Bolsonaro e havia uma expectativa de unificação com o primeiro ano de Lula; Indústria e agronegócio seguem com agenda relevante durante a conferência do clima
Imagem mostra o presidente Lula falando durante reunião com a sociedade civil na COP 28.

Foto: Vinicius Martins/Alma Preta

4 de dezembro de 2023

Por: Pedro Borges e Fernanda Rosário

Indústria e agronegócio seguem com influência sobre a agenda brasileira na COP 28 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), que ocorre em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. Há novamente apoio da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e Confederação Nacional do Agronegócio (CNA) para o espaço do governo federal na conferência, além de um estande separado para os representantes dos temas. A agenda do dia 8 de dezembro, por exemplo, no pavilhão do governo federal está destacada para a indústria.

Quer receber nossa newsletter?

Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!

Nas edições da COP de 2019, em Madrid na Espanha; de 2021, em Glasgow na Escócia; e de 2022, em Sharm El Sheik no Egito, a CNI e a CNA contribuíram para a participação da delegação oficial do governo brasileiro na Conferência do Clima. Durante a gestão de Jair Bolsonaro, o espaço do governo federal não promoveu qualquer aproximação com movimentos sociais e grupos organizados da sociedade civil, com um maior destaque para a apresentação de cases de sucesso da indústria e do agro nacionais.

A edição de 2019 também foi a primeira em que o Brasil levou mais de um pavilhão, com uma separação entre sociedade civil, capitaneada por movimentos sociais e ONGs, e o governo federal, com maior participação da indústria e do agro. Em 2022 no Egito, foi criado um terceiro espaço só para o Consórcio da Amazônia Legal, representado pelos nove estados da região, que pela primeira vez tiveram um estande próprio para discutir suas agendas. 

A expectativa criada na COP 27 no ano passado, em Sharm El Sheik, depois da vitória de Lula, era de que o primeiro encontro do clima com o novo presidente eleito, no caso a atual edição da COP, iniciada na última quinta-feira (30) em Dubai, tivesse um espaço unificado do país capaz de dialogar com as agendas de empresários, movimentos sociais e da região amazônica. 

A ideia caiu por terra com a continuidade de três espaços do Brasil e a manutenção da influência do agronegócio e da indústria na agenda climática e ambiental do país. A CNI e a CNA seguem com seus logos impressos no pavilhão do governo federal, apesar de menos destacados do que no ano passado.

Em conversas com a equipe da Alma Preta Jornalismo, organizadores do local da indústria e do agro sinalizaram que a agenda do governo federal tinha muitos atores, com a presença de movimentos sociais, ONGs, além das próprias empresas. Por isso, optaram por ter um espaço dedicado, do setor privado. Se com Bolsonaro o terceiro pavilhão era composto por ONGs e movimentos sociais, dessa vez, é formado por empresários.

O consórcio dos governadores da Amazônia também optou por manter um ambiente separado. De acordo com os organizadores, houve uma maior aproximação com os ministérios de Lula, com a participação do consórcio no Comitê Organizador da programação do governo federal e uma maior participação nos debates. 

À reportagem, a equipe do Consórcio também sinalizou para uma tentativa de aproximar programas dos governos estaduais da região, como o de BioEconomia do Pará, com a agenda de ministros.

Lula então manteve a presença do agronegócio e do setor da indústria na programação oficial do governo brasileiro, e não conseguiu unificar os espaços do país em um só. A Brazil Climate Hub, local da sociedade civil nas COPs durante a gestão de Bolsonaro, chegou a emitir um comunicado de que o “o governo federal fez um chamado para um único local de referência do nosso país em Dubai” e o Ministério do Meio Ambiente, em comunicado sobre a programação da COP 28, sinalizou para o recado de um “Brasil unido em sua diversidade a caminho do futuro sustentável”. 

Além da separação dos espaços, é possível observar uma distância física entre os três dentro da conferência. O estande do setor privado, com o agro e a indústria, está próximo do estande do Consórcio da Amazônia Legal. Já o espaço dedicado ao governo federal está mais distante e é um grande pavilhão, de dois andares, que volta a reunir em seu local os representantes de ONGs e da sociedade civil, como indígenas, quilombolas e movimentos sociais. 

Ministros de Lula em debate na COP 28.
Ministros do governo Lula participam de debate na COP 28. Foto: Vinicius Martins/Alma Preta

Governo não detalha quantias investidas pelos parceiros do agro e da indústria na COP 28

A reportagem enviou questionamentos para o Ministério das Relações Exteriores (MRE), o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) para saber quais foram as contribuições de CNI e CNA para a participação brasileira na COP28 e para saber quais foram os valores gastos pelas duas confederações. Segundo o MRE, a organização do espaço brasileiro no evento estaria sob a responsabilidade do MMA, por isso não disporiam de informações sobre o assunto.

O MMA, por sua vez, afirmou que o Pavilhão do Brasil na COP 28 “retoma a tradição interrompida pela gestão passada de unir governo federal, governos estaduais, sociedade civil e setor privado em um único espaço”, diferente do apurado pela reportagem presencialmente. Ainda de acordo com o ministério, CNA e CNI fazem parte da coordenação técnica do espaço como representantes do setor privado, além de a CNI também ser uma das apoiadoras do pavilhão.

Já a ApexBrasil explicou que CNI e CNA são membros do seu conselho. Juntas, as instituições celebram convênios importantes com foco em empresas de pequeno porte de vários setores, assim como parcerias em diversas iniciativas. A Apex, entretanto, não chega a detalhar as contribuições das confederações durante a COP28. Até a publicação deste texto, o MMA não enviou um retorno.

Em resposta a questionamentos via Lei de Acesso à Informação enviados pela Alma Preta sobre a parceria com CNI e CNA observada em COPs anteriores (na Escócia e no Egito), o MMA, o MRE e a Apex-Brasil confirmaram que houve uma participação conjunta na organização do pavilhão brasileiro, o que justificava as logomarcas dos parceiros institucionais e governamentais aplicadas no espaço e nos materiais de comunicação do evento, mas afirmaram não saber o valor da quantia investida pelas duas confederações.

Em reportagem anterior, a Alma Preta também mostrou que a parceria com o agro e a indústria é reconhecida pelo governo brasileiro, mas ele não explica como o recurso foi aplicado para a realização do evento nas últimas Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas. 

A Apex-Brasil, órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), questionada na época, disse que dispunha apenas de informações das despesas realizadas sob sua responsabilidade. “Cada entidade é responsável por contratar e pagar diretamente algumas despesas concernentes ao projeto. Por conseguinte, não há transferência de recursos entre as entidades e, tampouco, há prestação de contas recíproca em termos financeiros”, justificam. 

Apoie jornalismo preto e livre!

O funcionamento da nossa redação e a produção de conteúdos dependem do apoio de pessoas que acreditam no nosso trabalho. Boa parte da nossa renda é da arrecadação mensal de financiamento coletivo.

Todo o dinheiro que entra é importante e nos ajuda a manter o pagamento da equipe e dos colaboradores em dia, a financiar os deslocamentos para as coberturas, a adquirir novos equipamentos e a sonhar com projetos maiores para um trabalho cada vez melhor.

O resultado final é um jornalismo preto, livre e de qualidade.

Leia Mais

PUBLICIDADE

Destaques

AudioVisual

Podcast

papo-preto-logo

Cotidiano