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Cotas, racismo, revisionismo histórico e senso comum: o que disse Bolsonaro no “Roda Viva”?

31 de julho de 2018

Em entrevista ao programa da TV Cultura, o presidenciável manteve-se fiel ao estilo conservador e extremista pelo qual é identificado; algumas das declarações impactam de modo significativo a população afro-brasileira

Texto / Amauri Eugênio Jr.
Imagem / Reprodução / TV Cultura

Na noite de segunda-feira (30), o programa de entrevistas “Roda Viva”, da TV Cultura, recebeu o pré-candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL) para sabatiná-lo a respeito de seu plano de governo.

No fim das contas, a sabatina foi marcada por uma série de declarações que transcendem o âmbito controverso e retroalimentam o caráter preconceituoso da sociedade brasileira e do próprio pré-candidato.

De modo geral, além de ter citado sem constrangimento Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna), local marcado por uma série de torturas promovidas por militares contra civis, Bolsonaro reproduziu o discurso de democracia racial, reafirmando a não existência do racismo.

Cotas e deslizes históricos

Entre os diversos momentos no mínimo questionáveis, Bolsonaro recorreu ao equivocado discurso meritocrático para demonstrar-se contrário às cotas raciais após ter sido questionado a respeito.

De acordo com o político, parlamentar há quase três décadas, não há senso de justiça quanto à iniciativa, que prevê a reserva de vagas para negros em universidades e concursos, e recorreu ao senso comum para dizer que não se trata de reparação de dívida histórica resultante da escravidão no Brasil. “Que dívida? Eu nunca escravizei ninguém na minha vida. É justo a minha filha ser cotista? O negro não é melhor do que eu e nem eu sou melhor do que o negro”, afirmou o pré-candidato, ao usar como exemplo “vários negros” com os quais se formou na Academia Militar das Agulhas Negras. “Por que essa política de dividir o Brasil entre brancos e negros?”, indagou também, ao ignorar dados de diversas instituições que apontam desigualdades históricas e socioeconômicas entre brancos e negros.

Ao continuar o show de equívocos, ao falar sobre escravidão, Bolsonaro recorreu ao reducionismo para culpar populações africanas pela prática implementada pelos portugueses até 1888. “Se for ver a história realmente, os portugueses nem pisavam na África: eram os próprios negros que entregavam os escravos.” Talvez isso possa fazer sentido na história equivocada, revisionista e reducionista à qual Bolsonaro se apega.

De quebra, a metralhadora de erros não poupou nem mesmo Nelson Mandela (1918-2013). Ao ser questionado sobre o ícone político, figura lendária da luta contra o apartheid na África do Sul e vencedor do Prêmio Nobel da Paz, o pré-candidato afirmou que é necessário “ver o passado dele e ele não é tudo isso aí, não”. Como se lutar contra um regime segregacionista e racista não fosse “tudo isso aí, não”.

Racismo e quilombolas

Questionado pelo entrevistador Bernardo Mello Franco, do jornal “O Globo”, sobre a denúncia de racismo que a PGR (Procuradoria-Geral da República) fez ao STF (Supremo Tribunal Federal) após ter feito comentários discriminatórios contra povos quilombolas, Bolsonaro diz ter se tratado de uma “brincadeira”, além de ter negado ter ofendido quilombolas.

“Conheço a pessoa [a quem se referiu]. Se esse processo for avante, ela vai testemunhar ao meu favor. Falei que ele pesava oito arrobas. Pode ter sido um equívoco? Pode. Exagerei? Posso ter exagerado. Costumo fazer esse tipo de ‘brincadeira’ com qualquer um.” Dizer que quilombolas pesavam diversas arrobas, que não servem sequer para procriar, além de reproduzir imaginário racista são apenas “brincadeiras”, de fato.

Ainda, Bolsonaro rebateu o jornal “Tribune de Genève”, da Suíça, que o considerou racista – além de homofóbico e misógino. O pré-candidato afirmou que se fosse de fato racista, deveria estar preso.

“Se sou racista, tinha de estar preso. Não tenho imunidade e se eu ofender um afrodescendente agora, impedir de entrar no elevador, isso é crime de racismo. Tem de ser preso mesmo.” Talvez seja uma boa para Bolsonaro ler a Lei 7.716, de 1989, que define crimes de preconceito racial no Brasil.

Outros momentos

Além das declarações no mínimo controversas sobre afrodescendentes, Bolsonaro afirmou ser favorável à redução da maioridade penal, reafirmou ser contrário à vinda de refugiados ao Brasil – “isso não é xenofobia:é cuidar de seu país, de sua casa e ponto final” – e ser favorável ao armamento da população em nome de suposta legítima defesa.

Para completar, o pré-candidato recorreu a mais revisionismo histórico obtuso e equivocado ao dizer que não houve golpe militar em 1964, afirmou que o livro de cabeceira é “Verdade Sufocada”, de Brilhante Ustra, que é difícil ser patrão no Brasil, uma vez que o governo o atrapalha com burocracia e fiscalização. Isso sem contar que para ele, boa parte dos bebês mortos é prematura e que gestantes não se preocupam com a saúde bucal dos recém-nascidos.

Em resumo, Jair Bolsonaro recorreu a diversas bravatas. Parafraseando o próprio pré-candidato, a entrevista dele no “Roda Viva” foi um show de equívocos. E ponto final.

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