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Deputada negra de Santa Catarina protocola 5 projetos de lei em único mês de mandato

Vanessa Rosa (PT) assumiu o cargo como suplente de 19 de outubro a 20 de novembro na Assembleia Legislativa de Santa Catarina; um dos projetos foi arquivado um dia após sua saída
Vanessa da Rosa, deputada estadual de Santa Catarina, é uma mulher negra, de cabelos cahceados longos e com uma camisa vermelha.

Foto: Vicente Schmitt/Agência AL

8 de dezembro de 2023

A deputada estadual Vanessa da Rosa (PT), de 50 anos, apresentou cinco Projetos de Lei (PL) durante seu mandato de um mês na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), de 19 de outubro a 20 de novembro.

Nas eleições de 2022, a parlamentar recebeu 16.832 votos e se tornou a primeira suplente do Partido dos Trabalhadores. Por isso, ela ocupou o lugar do deputado Padre Pedro Baldissera durante sua licença e se tornou a segunda deputada negra a assumir o cargo em Santa Catarina – 89 anos após Antonieta de Barros.

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“As minhas pautas de campanha sempre foram referentes à educação, à situação do negro em Santa Catarina e à questão da violência contra a mulher. Então, eu consegui pautar cinco projetos que discorrem sobre essa temática”, explica, em entrevista à Alma Preta Jornalismo.

Os desafios, no entanto, são grandes. Vanessa diz não ter sofrido nenhum episódio de violência política, mas, um dia após sua saída da Casa Legislativa, um dos seus projetos de lei foi arquivado.

O contexto social para a população negra em Santa Catarina é hostil. Apenas 15,5% da população se autodeclara negra, tornando o estado com menor proporção de pessoas desta raça/cor. Mesmo assim, Santa Catarina tem a maior desigualdade patrimonial associada à cor da pele no país, conforme indica estudo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Além disso, o estado liderou o ranking nacional de injúrias raciais em 2020 e 2021. Em 2022, Santa Catarina perdeu apenas para o Distrito Federal, segundo os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Confira os cinco PLs protocolados pela deputada Vanessa da Rosa:

Cota de 20% para negros nos concursos de Santa Catarina

O primeiro projeto de lei foi protocolado em 25 de outubro e tratava da reserva de 20% das vagas dos concursos públicos da administração direta e indireta do Estado de Santa Catarina para pessoas negras.

“No segundo dia que eu estava na Alesc, recebi o pessoal do Sindalesc, que é o sindicato da própria assembleia legislativa, e eles me falaram nenhum concurso de Santa Catarina previa reserva de vagas para pretos e pardos. Então eu protocolei um projeto solicitando que isso fosse previsto nos concursos da administração direta e indireta do Estado”, relata Vanessa. “Porque é inadmissível que Santa Catarina ande na contramão da história”, alega.

Entretanto, em 21 de novembro, um dia depois do Dia da Consciência Negra e da saída de Vanessa do cargo, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Alesc arquivou o texto por 5 votos a 2.

Votaram contra os deputados Ana Campagnolo (PL), Marcius Machado (PL), Napoleão Bernardes (PSD), Pepê Collaço (PP) e Sérgio Guimarães (União). O primeiro voto, de Campagnolo, alegava que a proposta seria inconstitucional.

A proposta de Vanessa reproduzia as regras da lei federal 12.990, sancionada em 2014: a reserva vale para seleções com pelo menos três vagas e teria validade por 10 anos.

Os deputados catarinenses também alegaram que o tema já está sendo discutido em outro PL. Em 2021, a então deputada Marlene Fengler (PSD) apresentou um projeto semelhante às vésperas do 20 de novembro. O PL havia sido arquivado após o fim da legislatura passada, mas foi desarquivado em agosto deste ano e aguarda para ser discutido na mesma CCJ.

Os dois votos favoráveis na CCJ foram do relator, Fabiano da Luz (PT), e de Thiago Zilli (MDB).

Feriado estadual em 20 de novembro

Outro projeto protocolado solicita que o dia 20 de novembro seja feriado estadual em Santa Catarina, em homenagem a Zumbi dos Palmares.

Para ela, é importante deixar explícito que 20 de novembro não é um dia de comemoração, mas de reflexão.

“Porque o 20 de novembro, na verdade, vem em substituição ao 13 de maio. Nós não tivemos libertação dos escravos. Tivemos uma tentativa da Princesa Isabel de salvar a monarquia, não de libertar os negros, que saíram sem nenhum tipo de política pública em relação à moradia, escolarização, saúde, habitação. Eles continuaram tão escravizados quanto antes, e o reflexo disso tudo está nos índices da população negra”, afirma.

No texto do projeto, ela argumenta que o feriado já acontece em 1.260 cidades e em 6 estados: Alagoas, Amazonas, Amapá, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo, o último a decretar. A decisão ocorreu em setembro, sob o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-aliado de Jair Bolsonaro.

“Eu acho que Santa Catarina dará um passo à frente gigantesco reconhecendo essa data e tentando mudar a cara do nosso Estado, que tem fama de ser racista, machista, homofóbico e outros adjetivos”, reforça.

Mas essa decisão não dependerá mais da Alesc: em 29 de novembro, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou, por 286 votos contra 121, proposta que torna o 20 de novembro feriado nacional. O projeto agora aguarda apenas sanção presidencial.

Creches públicas noturnas

Em 1 de novembro, Vanessa também apresentou o projeto de lei 425/2023, que cria espaços de acolhimentos para crianças em situação de vulnerabilidade social e atende a demanda das famílias que trabalham ou estudam à noite.

“Muitas mães estão na informalidade, trabalham na indústria e saem às 23h. Outras tantas trabalham no comércio, nos supermercados, dentro dos shoppings e saem depois das 22”, exemplifica.

Ela também menciona a importância desse apoio principalmente às mães que estão no ensino médio ou se propõem a fazer ensino superior.

“Eu, como professora de turma de pedagogia, sempre tive a minha sala lotada de crianças à noite. Fazia a ‘vistas grossas’, porque se eu dissesse que não podia, essas meninas faltavam, desistiam, não iam concluir os seus estudos. A sociedade precisa pensar sobre isso”, analisa.

Para ela, apoiar mulheres que trabalham e estudam à noite é permitir que elas alcancem lugares de mais poder na sociedade.

“Nós nunca vamos aumentar o número de mulheres nos espaços de poder e decisão se não as ampararmos. A gente precisa de políticas públicas que dê estrutura para essas mulheres que não têm uma rede de apoio para que, num futuro bem próximo, a gente tenha mais mulheres ocupando espaços de poder”.

Isenção no transporte em dias de Enem

A deputada também apresentou projeto que concede isenção do pagamento de tarifa no transporte público estadual para os candidatos do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) nos dias de realização da prova.

A proposta supera as barreiras financeiras que frequentemente limitam a participação de muitos estudantes no exame, que ocorre anualmente no fim do segundo semestre.

“A população em Santa Catarina já gasta boa parte do orçamento com transporte público, que é péssimo no nosso estado. Não é justo que os nossos jovens deixem de fazer essa prova que é tão importante. [O Enem] é uma política pública, uma ferramenta interessante de entrada no ensino superior”, defende Vanessa.

Neste ano, a capital Florianópolis ofereceu ônibus de graça nos dias de Enem e, atualmente, seis cidades praticam a tarifa zero no estado, mesmo fora dos período do Enem: Forquilhinha, Garopaba, Imbituba, Governador Celso Ramos, Balneário Camboriú e Bombinhas.

Política para empreendedores negros

No seu último dia como suplente, Vanessa da Rosa protocolou o PL que institui a Política Estadual de Fomento ao Empreendedorismo de Negros e Negras.

A iniciativa prevê fomento, assistência técnica, desburocratização jurídica das iniciativas e acesso ao crédito. O desenho da política também propõe formação e qualificação em gestão.

“Temos um contingente muito grande de mães solo, mulheres negras, que estão na informalidade… Queremos reduzir o desemprego, o subemprego e outras formas precárias de ocupação da força de trabalho que atingem, especialmente, os negros”, afirma.

Estudo do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) de 2022 aponta que Santa Catarina está entre os três estados brasileiros com a maior porcentagem de mulheres empregadoras, com 16%, por outro lado, o estadotem o menor índice de mulheres negras como donas de negócios, registrando apenas 13%.

  • Camila Rodrigues da Silva

    Jornalista com mestrado em economia e formação em demografia. Editora e repórter, com quase 20 anos de experiência em redações da grande imprensa e de veículos independentes de comunicação. Atuo na cobertura de direitos humanos desde 2012.

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