A presença de diversidade na composição das casas legislativas brasileiras mostra-se como uma maior oportunidade para que pautas de grupos sociais mais vulnerabilizados sejam atendidas. Em São Paulo, a existência de deputadas estaduais negras é a possibilidade de um olhar mais atento e ação política sobre a população para a qual se destinam os recursos das emendas parlamentares.
Segundo Monica Seixas (PSOL), codeputada estadual da Mandata Ativista, a recente chegada de mulheres negras, pessoas periféricas e trans nos parlamentos muda a forma de destinar recursos, como as emendas, e a formulação de políticas públicas, porque essas pessoas trazem vivências e o interesse nas vidas e localidades que as representam também.
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As emendas parlamentares impositivas são parte do orçamento público que permite aos deputados estaduais indicarem aos governos municipais e entidades da sociedade civil que executem políticas públicas para receber recursos ou verbas. Por meio de emendas ao projeto de lei orçamentária, os parlamentares têm a possibilidade de financiar políticas e projetos fundamentais realizados por entidades e prefeituras.
“Quando você fala de parlamentares periféricos, pessoas pobres, pessoas negras, LGBTs e das mulheres, a formulação e o recurso acabam chegando em lugares que antes não chegavam, porque a gente vai pensar na necessidade da urbanização das favelas, na necessidade do saneamento básico, na limpeza dos rios e córregos que cortam os nossos bairros e que entram nas nossas casas no período de chuva, entre muitas outras coisas”, relata a codeputada.
Destinação das emendas
A deputada estadual Erica Malunguinho (PSOL) fechou as indicações de instituições beneficiadas por suas emendas parlamentares para o ano de 2022, a qual se destacam destinação de verbas para mulheres, comunidade LGBTQIA+ e população negra.
Entre os quase R$6,5 milhões de recursos em emendas da deputada para 2022, há verbas com valores de R$550 mil para preservação e fomento à matriz africana e cerca de R$ 450 mil para comunidades e associações ligadas a quilombos, sendo ao menos R$1 milhão para ações em prol do povo preto.
Além disso, há mais de R$ 1,7 milhão em recursos para projetos de apoio e acolhimento à comunidade LGBTQIA+ e mais de R$ 1,3 milhão para proteção e desenvolvimento de ações em prol das mulheres.
“A minha presença no legislativo, junto às tantas nas câmaras municipais e nos movimentos sociais, reforça a visibilidade das pessoas em situação de vulnerabilidade. Diante da crescente mobilização do conservadorismo, essa atuação deve ser ainda mais veemente, com apoio de todos os mecanismos de denúncia e luta por igualdade”, destaca Erica Malunguinho, que chega em 2022 ao último ano de mandato iniciado em 2019 na Assembleia Legislativa.
A deputada estadual Leci Brandão (PCdoB) destinou, para o ano de 2022, quase R$6,6 milhões em emendas parlamentares para as áreas de saúde, cultura, esporte, direitos humanos e cidadania, assistência social e educação.
Entre os projetos e ações realizadas por entidades e organizações a serem contemplados por recursos do mandato, estão programas que têm como foco o combate ao racismo, apoio às comunidades quilombolas e tradicionais de matriz africana, mulheres negras e idosos. São R$830 mil destinados a projetos de cidadania e direitos humanos, além de R$160 mil para assistência social e mais de R$ 1 milhão para a área da cultura.
O Movimento de Mulheres Negras de Sorocaba (Momunes) é uma das instituições beneficiadas por emendas da deputada Leci Brandão e da deputada Erica Malunguinho, que vão promover oficinas sobre direitos humanos e auxiliar na aquisição de equipamentos, mobiliários e verba para obras na Casa Momunes, respectivamente.
De acordo com Cláudia Lima, gestora de desenvolvimento técnico e administrativo do Momunes, os recursos conseguidos por meio do mandato da Erica Malunguinho vão auxiliar diretamente no atendimento às mulheres acolhidas pela instituição. Já os recursos conseguidos pelo mandato da Leci Brandão são para a frente de oficinas, que é uma atividade complementar realizada pela entidade.
“Nós temos uma casa de acolhimento de mulheres em situação de vulnerabilidade, que atende mulheres acompanhadas ou não de família, com seus filhos, enfim, em todo os tipos de vulnerabilidade. Nós vamos fazer também oficinas de direitos humanos tanto para a comunidade, para as mulheres, como também para os profissionais que atuam nessa área”, explica a gestora.
A Mandata Ativista, formada por sete codeputadas com uma diversidade de áreas de atuação, também tem uma política voltada para as populações mais vulnerabilizadas. São, pelo menos, R$800 mil destinados a projetos voltados à comunidade LGBTQIA+, igualdade racial, mulheres, assentamentos rurais e pessoas com deficiência.
“Na Mandata, tivemos durante os três primeiros anos a política de dividir as decisões entre nós sobre os recursos. Tentamos abarcar todas as pautas que prometemos proteger nas eleições e a Mandata Ativista tem um compromisso com uma pluralidade bastante extensa. São nove causas e a gente tenta dividir e compartilhar recursos entre todas. Se formos fazer um saldo, mandamos proporcionalmente recursos”, explica a codeputada Monica Seixas.
Quanto mais diversidade no parlamento, mais alcance de recursos
O tesoureiro e coordenador cultural do Hip Hop Mulher – Ponto de Cultura, Tiely, explica que o processo de conseguir emendas parlamentares depende muito das organizações sociais levarem projetos culturais para parlamentares que apoiam o segmento onde essas entidades atuam.
“Quanto mais mulheres, mulheres pretas, mais pessoas LGBTs dentro desses espaços de poder, mais vão ser ampliados o alcance dos recursos de emendas parlamentares, de projetos de leis interessantes e importantes para toda a comunidade de forma justa e respeitosa”, explica o coordenador cultural.
O Hip Hop Mulher é uma das entidades contempladas por emendas da deputada Erica Malunguinho, que vai contribuir com ações da instituição e de outros coletivos acolhidos por ela, por meio da aquisição de equipamentos e verba para projeto de empreendedorismo de mulheres negras.
“Eu acho que tem todo um diferencial ao chegarmos na assembleia legislativa e ter uma mulher preta e trans para receber a gente. Até o ambiente é diferente. Parece que você está entrando em um espaço que é seu”, também pontua Tiely.
“Se nós não tivermos pessoas ocupando esses cargos públicos que destinem verbas para nós, não temos acesso. É muito raro algum parlamentar que queira trabalhar com essas demandas. São pautas que não são contempladas por outras pessoas e não são prioridade para todos. Então, quando se tem alguém que tem esse olhar é quem nos apoia”, finaliza Claudia Lima, do Momunes.
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