Conhecidas popularmente como “Leis Antibaixaria”, medidas de proteção ao consumo musical têm ganhado a atenção do poder público e de parlamentares em todo o país. Entre as pautas apresentadas, em sua maioria, a preocupação se dá sobre a utilização de recursos públicos para a contratação de músicos que desvalorizam, constrangem ou incentivam violência contra mulheres, manifestam discriminação ou fazem apologia a drogas.
Na Bahia, um projeto voltado ao assunto foi sancionado em 2012 pelo governador Jacques Wagner (PT), com risco de multa de 50% do valor do contrato em caso de descumprimento. No Recife, a ex-vereadora Marília Arraes, atual deputada federal (PT-PE), também protocolou uma proposta que proibia contratos não apenas para shows como também para apresentações em rádio, televisão, vídeo e internet. A multa seria de R$10 mil ou valor integral, a depender do caso.
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Em São Paulo, líderes e entidades que atuam em defesa do movimento funk lutam contra um projeto de lei que prevê a proibição da participação de crianças e adolescentes em bailes funk. A proposta, que surgiu em 2017, de autoria do vereador Ricardo Teixeira (Democratas), prevê multa de até R$ 10 mil por “hora de indevida exposição da criança ou do adolescente ao ambiente impróprio, sem autorização judicial”.
Na avaliação das pessoas que defendem a cultura do funk, o que era para ser sinônimo de proteção às práticas cidadãs, na realidade endossa um discurso que generaliza a cultura majoritariamente negra e periférica, sem análise da construção identitária, além da falta de avaliação por parte de um membro interno. Em outras palavras, medidas como as “Leis Antibaixarias”, abrem espaço para práticas que, segundo a classe artística atingida, são inconstitucionais por coibir a produção e expressão artística desses grupos.
Para a diretora da Frente Nacional de Mulheres do Funk, Renata Prado – que estuda e convive com a cultura do funk há quase 20 anos, essas leis impactam diretamente na produção e viabilização da cultura da periferia.
“Impedem de desenvolver o processo criativo da nossa cultura. A gente precisa ter liberdade de expressão para fazer com que uma cultura cresça e evolua. O funk, por exemplo, é isso. Ele era isso no início dos anos 2000 e, hoje, ele tem outro lugar na sociedade por várias questões, como as transformações sociais, culturais e até mesmo pela expansão territorial. Então, acabam por impactar diretamente na cultura urbana”, afirma Renata, em entrevista à Alma Preta Jornalismo.
De acordo com a ativista, muitas medidas se validam do que se é dito ou proposto na teoria, mas abrem espaço para práticas racistas e de desigualdade.
“Estamos falando de cultura negra urbana e de periferia. A exemplo do pagodão, construído nas periferias da Bahia, assim como o funk vem desse mesmo lugar, seja carioca, paulista, mineiro e de tantos outros estados de nosso país. Vale perceber que esse tipo de tratamento não é feito com jovens brancos, de classe média e que ocupam outros espaços na cidade. Enquanto isso, jovens negros de periferia ficam limitados à expressarem as suas culturas”, pontua Prado.
Renata ressalta que iniciativas internas e de quem vive nas periferias brasileiras ajudam no avanço das discussões propostas pela sociedade e que sugerem mais respeito às diferenças.
“É bom lembrar que essas questões permeiam o funk pela própria sociedade ser o que é, consequentemente reflete no estilo. Porém, a respeito do funk, existe um processo de transformação assim como a sociedade, então os debates estão sendo ampliados internamente”, pondera a ativista.
Uma das iniciativas que abordam essas questões é a própria Frente de Mulheres do Funk, que propõe debater várias questões, como a misoginia, o racismo e a LGBTfobia. “Isso se dá por conversas com os MC’s, com o diálogo direto de quem produz e com o público”, finaliza.
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