Sou o Dr. Mohamed Bashir, um médico humanitário sudanês que agora trabalha na equipe internacional do Médicos Sem Fronteiras (MSF) em um projeto no Sudão do Sul, do outro lado da fronteira do meu país. Embora eu esteja fisicamente longe, os efeitos da guerra em minha terra natal estão sempre presentes, me puxando de volta a cada atualização de notícias, enquanto comparo a devastação de que ouço falar com as manchetes de notícias globais, que parecem mal notar o que está acontecendo.
O Sudão e seu povo sofredor estão fora da lista mundial de prioridades – esquecidos pela mídia, negligenciados pela vontade política e ignorados pelas instituições humanitárias que deveriam colocar essa catástrofe em primeiro plano. Eu me pergunto: O que posso fazer como indivíduo? Minha resposta é clara — continuarei apoiando aqueles esmagados por essa guerra brutal.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
Aqui no condado de Twic, no Sudão do Sul, muitos dos nossos pacientes são repatriados e foram deslocados duas vezes em cerca de uma década. E agora milhares de refugiados sudaneses cruzaram para o Sudão do Sul desde que a guerra eclodiu em abril de 2023, espalhados em comunidades anfitriãs ou amontoados em campos de refugiados.
Eu conheço essa dor
Esta guerra continua a nos atormentar, separando famílias. Aqueles que fogem do Sudão compartilham as mesmas histórias de perdas, de incertezas e de falta de esperança na paz. Eu conheço essa dor muito bem.
Fronteiras internas e linhas de frente controladas por partes em conflito cortaram uma nação onde vidas estão sendo perdidas, lares destruídos e meios de subsistência dizimados.
Quanto ao povo – nós -, somos deixados sozinhos
Minha família escapou de Cartum, entre os milhões de deslocados, não uma, mas várias vezes em apenas 18 meses. Eles deixaram tudo para trás, sem um caminho claro para a sobrevivência e pouca atenção do mundo. Ainda estamos sofrendo com o desaparecimento de um parente meu, um civil retirado de sua casa por uma das partes em conflito há mais de dez meses. Não temos notícias. Nenhuma informação sobre sua saúde ou se ele será libertado algum dia.
Mesmo para aqueles que escapam da violência ou se reúnem após a separação, surgem novos desafios – inundações, surtos de doenças – sob um sistema de saúde em colapso. A maioria dos hospitais estão destruídos. Os que ainda funcionam estão isolados, sem medicamentos, pessoal ou recursos. Esta é uma privação deliberada; uma tática cruel de guerra.
Sobrevivendo com o mínimo, as pessoas têm sido deixadas esperando por um milagre, mais deslocamento, ou pior ainda: a morte.
Não vire as costas
Apesar de tudo isso, estou aqui para compartilhar nossa resiliência. Como profissionais humanitários – médicos, logísticos e enfermeiros – fazemos tudo o que podemos para apoiar aqueles que precisam. Cada pequeno ato importa e todo esforço conta.
Isso é exatamente o que tenho feito nos últimos meses em Twic como médico no hospital do condado de Mayen Abun. A área já estava sobrecarregada pelas necessidades humanitárias, tendo testemunhado o deslocamento interno de milhares de sul-sudaneses, desenraizados devido à violência em Agok em 2022. Esse é um lugar onde o sistema de saúde entrou em colapso, sobrecarregado pela malária, hepatite E e desnutrição.
O trabalho aqui fornece uma janela para outra dimensão da guerra em meu país. Vejo em primeira mão as terríveis condições enfrentadas por aqueles que foram forçados a fugir do Sudão. O que me surpreende ainda mais é o quão negligenciada esta crise permanece – há tão pouco conhecimento disseminado sobre o deslocamento do povo sudanês para o Sudão do Sul, Chade e outros países, apesar das necessidades esmagadoras das famílias que buscam refúgio.
Vivemos em uma época de crises crescentes – tanto provocadas pelo homem quanto naturais. As vítimas das guerras de hoje, em diferentes lugares e contextos, são quase trágicas demais para compreender.
Em meio a tudo isso, suplico ao mundo: não deixe a crise ser esquecida. Às vezes, parece que ninguém se importa, como se o Sudão tivesse sido deliberadamente despriorizado pelos tomadores de decisão globais, deixado de lado para outras crises. Por quanto tempo mais podemos tolerar essa inação?