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Justiça racial se constrói com valorização de vivências negras e periféricas na política

Buscar organização com quem compartilha essas vivências e lutas é essencial para romper com  o dispositivo de racialidade e construir uma sociedade verdadeiramente justa e igualitária
Imagem mostra pessoas em protesto contra o racismo.

Foto: Reprodução/Mídia Ninja

22 de dezembro de 2024

Sueli Carneiro, em “Dispositivo de Racialidade: A Construção do Outro como Não Ser como Fundamento do Ser”, oferece uma análise indispensável para compreender como a lógica de exclusão racial estrutura as relações de poder na sociedade brasileira. 

Ela revela que a manutenção das desigualdades se dá por meio de um dispositivo de  racialidade sustentado por um contrato racial que organiza e naturaliza a subalternização  da população negra.

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Esse mecanismo vai além do econômico, determinando os papéis sociais  e posicionando os negros como “não-ser” para legitimar os privilégios do “ser”. 

Esse dispositivo é sustentado pelo epistemicídio — a exclusão sistemática de negros da  produção e reconhecimento de saberes. Ele opera por meio da negação do acesso à  educação de qualidade, da deslegitimação do negro como criador de conhecimento, da  imposição de uma indigência cultural e material, e da desvalorização da capacidade  cognitiva da população negra.

Porém, resistir a esse processo exige resgatar as trajetórias de  intelectuais negros como Abdias do Nascimento, Milton Santos, Clóvis Moura e Lélia Gonzalez,  que romperam com a exclusão epistemológica e construíram saberes emancipatórios,  desafiando as bases do contrato racial. 

Esse legado nos leva a refletir sobre o cenário político atual, onde militantes negros e periféricos  enfrentam exclusões semelhantes dentro de partidos e movimentos sociais. Apesar do discurso  de inclusão, muitos partidos negligenciam o fortalecimento do trabalho de base nas periferias.

As reuniões, centralizadas no Plano Piloto, ignoram a realidade dos militantes que vivem  nas quebradas, forçando-os a longas jornadas em transporte público.

Recentemente,  grupos que nunca pisaram na periferia começaram a aparecer em busca de cooptação de  movimentos e pessoas, mas reagem negativamente quando reuniões são marcadas em regiões  como Ceilândia.  

Essa postura evidencia o desprezo pelas vivências periféricas e reflete o eurocentrismo que Grada Kilomba analisa: esses espaços são arenas de violência simbólica, onde negros são  posicionados como “outros”, enquanto a elite branca, frequentemente de classe média,  assume o papel de especialista nas questões raciais, sem incluir ativamente os sujeitos  dessas questões. 

Além disso, a inclusão de negros em posições de liderança nos partidos ocorre de forma  tokenista, priorizando figuras públicas já conhecidas e desvalorizando militantes negros com  ampla experiência nos movimentos sociais.

A realidade é que muitas direções partidárias  permanecem brancas e alheias às demandas da periferia, relegando os militantes negros à  sobrecarga física e mental, sem reconhecimento ou suporte, enquanto militantes brancos  ascendem com facilidade.

Sueli Carneiro nos ensina que a luta contra o dispositivo de racialidade não deve ser  confundida com alianças à direita, mas também nos convoca a questionar as práticas da  esquerda.

O fracasso dos partidos em representar efetivamente a negritude e a periferia exige  a construção de alternativas. Coletivos como Pelas Vidas Negras DF mostram que o vínculo  entre militantes deve ser baseado em experiências compartilhadas e objetivos comuns, e não na  lógica de disputa partidária. 

Portanto, a luta por justiça racial e emancipação plena passa pela construção de espaços  que valorizem as vivências negras e periféricas. É essencial perguntar: quantas pessoas da  periferia ocupam cargos de liderança? Quantos negros, indígenas e mulheres negras estão  representados nas direções? Se as estruturas partidárias não refletem a diversidade do Brasil,  dificilmente serão capazes de implementar políticas reais de reparação.  

Buscar organização com quem compartilha essas vivências e lutas é essencial para romper com  o dispositivo de racialidade e construir uma sociedade verdadeiramente justa e igualitária.

Essa  é a tarefa coletiva que deve guiar tanto a militância periférica quanto a Maloka Socialista:  desafiar a lógica colonial, afirmar o protagonismo negro e reconstruir as bases do poder  e do saber. 

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  • Marcelo Vinícius

    Estudante de História na Universidade de Brasília, assessor do deputado distrital Max Maciel, produtor cultural e militante da Maloka Socialista, uma força política de quebrada do PSOL.

  • Samuel Vitor Gonzaga

    Estudante de Direito na Universidade de Brasília, assessor da deputada federal Erika Hilton e coordenador do Emancipa, movimento social de educação popular.

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