O artista visual pernambucano Rennan Peixe, um dos selecionados da exposição virtual “The World Want”, realizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), leva o olhar sobre Cuba para a mostra fotográfica em formato digital. Com o título “La Santeria”, a exposição retrata os traços religiosos de um país influenciado pelas práticas e costumes dos povos escravizados da África Ocidental, o cotidiano local, além de um intercâmbio cultural entre o Grupo Bongar e a cultura afrocubana.
Como foco central, Rennan escolheu explorar traços da religião também conhecida como o “caminho dos Santos”. A Santeria é uma religião levada para Cuba pelos povos escravizados que foram raptados para trabalhar nas plantações de açúcar durante o século 17. Para sobrevivência dos costumes e crenças, suas práticas religiosas adaptaram-se às influências cristãs para manterem-se vivas em suas tradições, assim como no Brasil, com o candomblé. Nas duas localidades, a tradição Yorubá é o eixo central, passando para as gerações seguintes os ensinamentos pela oralidade.
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No intuito de promover o intercâmbio cultural e o reconhecimento de uma ancestralidade próxima e identitária, “La Santeria” conta com fotografias realizadas no ano de 2017, durante a vivência do grupo pernambucano Bongar, que reúne percussionistas e cantores que revezam os instrumentos como a alfaia, ganzá, abê, caixa, congas, ilu e tabicas, da Nação Xambá de Pernambuco. Para a construção da exposição, Peixe reuniu os registros ao lado do grupo, que percorreu as cidades de Havana e Santiago del Cuba durante 15 dias, visitando casas de Santeria e participando de rituais.
Peixe reuniu os registros de quando percorreu as cidades de Havana e Santiago del Cuba durante 15 dias, visitando casas de Santeria e participando de rituais
“Essa relação que eu tive nesse intercâmbio entre Brasil e Cuba me fez sentir de perto o potencial da diáspora e conexão que a gente tem com outros povos negros espalhados pelo mundo. Senti de perto a semelhança que existe entre o candomblé brasileiro, como da Nação Xambá e da Nagô e a Santeria Cubana. Percebi como os elementos estão ali dentro de uma proximidade real, dentro de uma mesa cosmovisão, embora estejam separados geograficamente, mas é algo que ainda nos une e nos faz acreditar nessa unidade de povos negros e descendentes”, conta o artista em conversa com a Alma Preta Jornalismo.
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Questionado sobre a importância do ambiente virtual como meio de continuidade a apresentação de seus trabalhos enquanto artista visual durante a pandemia pela COVID-19, o artista afirma existir potência na democratização do acesso à arte, caminho encontrado durante um período de incertezas para a classe cultural. “A pandemia nos colocou nessa situação de reinventar e, por consequência, quebrar barreiras e isso, de certa forma, ajudou que mais corpos e corpas negras se identifiquem. Acredito fotografia sobre esses corpos negros traz o potencial de nos empoderarmos. Logo a gente, que a vida inteira passou o tempo inteiro sem referências ou com referências pejorativas que colocavam o nosso corpo em uma situação de subalternidade. Quando a gente se depara com imagens potencializadores, a gente se afirma da nossa própria identidade e se ama, o que, para mim, é fator principal”, finaliza Peixe.
Financiada com recursos da Lei Aldir Blanc em Pernambuco, viabilizada pela Secretaria de Cultura e a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco, “La Santeria” pode ser vista gratuitamente através do link.
POR TRÁS DAS LENTES
Rennan Peixe é artista visual negro e suas produções retratam construções de narrativas visuais que valorizam a cultura negra em diáspora através da fotografia e do audiovisual. Ele compreende a imagem como discurso visual que influencia diretamente na construção do imaginário social sobre o corpo negro. Busca, através de suas lentes, contribuir com a luta atirracista.
Peixe é fotógrafo, professor e realizador audiovisual. Atua com fotografia há mais de 10 anos, acompanhando grupos de cultura popular em Pernambuco como o Grupo Bongar, Mestre Zé Negão, Afroxé Omo Nilê Ogunjá, sambadas de coco de roda e cerimônias religiosas em várias casas de candomblé na Região Metropolitana de Recife – PE. Tem desenvolvido pesquisas em fotografia, cinema e religiosidade.
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