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Mais de 60 anos separam Lei Áurea da primeira legislação contra o racismo

Com pena muito baixa, a primeira lei a discutir discriminação racial no Brasil foi aprovada em 1951, após a denúncia da afro-americana Katherine Dunham, impedida de se hospedar em São Paulo

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: Reprodução

Imagem em preto e branco mostra Katherine Dunham, antropóloga afro-americana e ativista antirracista

13 de maio de 2021

A abolição da escravidão no Brasil, em 13 de maio de 1888, não mobilizou o país para o debate sobre a discriminação racial. A primeira lei que travava o racismo como contravenção, com multa e pena, entrou em vigor em julho de 1951, 63 anos depois, por conta da denúncia de uma artista afro-americana em turnê no Brasil.

Em julho de de 1950, a coreógrafa e dançarina Katherine Dunham, dos EUA, se apresentou no Teatro Municipal de São Paulo. Na ocasião, por ser negra, a artista foi impedida de se hospedar no hotel cinco estrelas Esplanada. Em entrevistas concedidas por ela, com repercussão mundial, Katherine denunciou o racismo do país brasileiro. A coreógrafa era antropóloga e ativista contra o racismo nos EUA.

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Após o ocorrido, o Congresso brasileiro se apressou para aprovar no ano seguinte, 1951, sete artigos da Lei Afonso Arinos, que qualificou a discriminação racial como contravenção. Na época, a lei determinou pena simples de 15 dias a três meses, aquela que não é cumprida em prisão e pode ser no regime semi-aberto ou no pagamento de multa em dinheiro (de 5 mil cruzeiros).

Leia também: Primeiro passo para ser antirracista: reconhecer que a abolição não acabou com o racismo

Desde a abolição até a metade do século 20, o Brasil não reconheceu minimamente a luta da população negra por direitos. Na década de 1930, a Frente Negra Brasileira se organizou em partido político para exigir a criação de leis antirracistas. O partido foi fechado pelo presidente Getúlio Vargas, em 1937, e as leis contra o racismo foram rejeitadas na Constituinte de 1946.

“O efeito da Lei Áurea é muito mais psicológico, no sentido da re-humanização, do que no sentido social, e psicológico para nós e não para o restante da sociedade que continuou a nos ver, até os dias atuais, com o mesmo olhar”, avalia o ator, escritor e jornalista Oswaldo Faustino.

No período pós-abolição, segundo o advogado Irapuã Santana, os negros deixaram de ser mercadoria para se tornarem cidadãos com alguns direitos, porém “com menos direitos que os outros”. “A escravidão foi fundada na tese de que os negros não eram dotados de humanidade. O 13 de maio é um marco da emancipação, que deve ser celebrado, mas não festejado”, diz o advogado.

“A população negra precisa ter liberdade, ter acessos e ter a chance de se desenvolver em condições de igualdade, essa é a questão que perdura desde o 14 de maio”, pondera Santana, que em 2020 conseguiu, no STF (Supremo Tribunal Federal) a aprovação de financiamento proporcional para candidaturas negras nos partidos políticos.

A perseguição e o extermínio da população negra, inclusive, faziam parte de um projeto político do governo brasileiro, que em 1890 criou um decreto para trazer imigrantes europeus para assumir os postos de trabalho na futura industrialização e colaborar no “branqueamento” da população, conforme ressalta o advogado. “Alguns teóricos falavam que em 100 anos não teriam mais negros. É óbvio que não havia interesse em combater o racismo”, pondera.

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