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Imigrante senegalês foge e denuncia mercado de escravos na Líbia

20 de abril de 2017

Homens e mulheres de diversas nacionalidades estão sendo vendidos como escravos na Líbia ao tentar acessar a Europa. Casos de brutalidade foram descritos pela OIM, alertando as autoridades mundias sobre o caso.

Texto: Solon Neto
Ilustração: Alma Preta

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Um homem senegalês identificado como SC afirmou à Organização Internacional para a Migração (OIM) que foi comprado e vendido como escravo, e que testemunhou o funcionamento de uma rede de tráfico humano na Líbia. Além dele, diversos outros imigrantes estariam confirmando a história que parece vir direto de quatro séculos atrás.

A OIM divulgou informações afirmando que contrabandistas estão sequestrando e vendendo imigrantes às centenas em mercados de escravizados na Líbia. Segundo essas informações, as negociações chegam a ser realizadas em praça pública, lembrando os leilões dos séculos da escravatura nas Américas e Europa.

À BBC, o chefe da missão da OIM para a Líbia afirmou que os preços dos escravizados variam de acordo com as habilidades que apresentam para diversos trabalhos, e que estariam sendo vendidos pois nem sempre os sequestros resultam em resgate.
A organização afirma que centenas de homens e mulheres jovens são vítimas desse tipo de crime. Não há informações sobre desde quando essa prática tem acontecido, pois teria sido reportado poucos dias depois de ter sido flagrada.

Segundo a própria OIM, essa é apenas uma das atrocidades relatadas no país, que vive crise política, econômica e humanitária desde a queda de Muammar al-Gaddafi.

Sequestros, assassinatos, trabalho forçado, extorsão, tortura e abuso sexual

Quando SC tentava atravessar o deserto do Saara, no Níger, ele foi abordado e cobrado em cerca de 320 dólares para continuar a passagem até a Líbia. Ainda lá, passou dois dias sob os cuidados de um traficante, que providenciou moradia até a chegada do caminhão que realizaria a viagem de dois dias.

A rota é perigosa. A OIM já ouviu relatos sobre o trecho afirmando que restos mortais de pessoas deixadas para trás pelos motoristas foram vistos ao lado de caminhões esquecidos após terem seus combustíveis roubados. Apesar disso, a viagem teria sido tranquila para o grupo que SC passou a integrar.  

Na chegada à Líbia, no entanto, as coisas mudaram. Na cidade de Sabha, sudoeste do país, o motorista afirmou à SC que não havia sido pago pelo traficante, e que estaria levando os migrante para um estacionamento, em que SC viu com os próprios olhos um mercado de escravos.

Segundo o staff do Níger da OIM, migrantes da África sub-saariana estavam sendo vendido e comprados por Líbios com a ajuda de Ganeses e Nigerianos que trabalhariam para eles.


SC foi comprado e levado para um cativeiro dividido com mais de 100 outros migrantes feitos reféns. Ele relatou que os migrantes eram torturados ao telefone para que suas famílias pagassem resgate. O primeiro resgate de SC teria sido de 480 dólares. Por não conseguir pagar, foi vendido a outro Líbio, e seu preço de resgate subiu para 970 dólares.

O senagalês conseguiu juntar dinheiro através de sua família e passou a trabalhar como intérprete com os sequestradores para evitar torturas. Suas declarações descrevem peśsimas condições sanitárias e alimentação oferecida apenas uma vez por dia. Segundo SC, os prisioneiros que não conseguiam pagar eram assassinados ou deixados sem comer até a morte.

As informações do sobrevivente à OIM afirmam que quando havia mortes ou alguém saía devido a pagamento de resgate, os sequestradores voltavam aos mercados de escravos e para substituir suas perdas. As mulheres seriam compradas também por outros indivíduos e levadas para casas em que eram forçadas a ser escravas sexuais.

A escravidão não seria apenas através desse tipo de sequestro. Segundo diversos relatos colhidos pela OIM, que confirmam a fala da SC, há também migrantes sendo comprados por comerciantes que ao invés de pagá-los pelo trabalho em lojas e na contrução civil, os vendem para outros. Alguns, a maioria da Nigéria, Gana e Gâmbia, são forçados a trabalhar como guardas nos cativeiros ou até nos mercados de escravos.

Outro caso de fugitivo relatado em detalhes pela OIM foi o de Adam, nome fictício. Ele ele outros 25 migrantes da Gâmbia foram sequestrados dentro da Líbia enquanto viajavam de Sabha para Tripoli. Eles teriam sido sequestrados por homens Árabes e também da própria Gâmbia, sendo levados para um cativeiro com cerca de 200 pessoas, a maioria homens.

Os prisioneiros seriam de diversas partes da África e eram torturados todos os dias, além de serem forçados a ligar para suas famílias pedindo resgate. A família de Adam levou 9 meses para conseguir o dinheiro e libertá-lo, vendendo, inclusive, a própria casa. Ao ser libertado em Tripoli, Adam pesava apenas 35 quilos, e passou 3 semanas em um hospital se recuperando de desnutrição e feridas de tortura. Lá, funcionários da OIM foram alertados e enviaram médicos para ajudá-lo, além de enviarem roupas e garantirem proteção. Ele passou mais um mês em uma casa na cidade, graças a uma família voluntária, voltando para Gâmbia em 04 de abril, onde foi novamente hospitalizado.

O caso de uma jovem mulher também foi divulgadas pela OIM. Ela teria sido mantida em cativeiro em um depósito perto do porto em Misrata por sequestradores da Somália. É possível que o cativeiro tenha durado 3 meses. O filho e o marido dessa mulher, que viviam no Reino Unido desde 2012, recebiam ligações nesse período exigindo dinheiro. A mulher teria sofrido estupro e tortura. A família já teria pago aos sequestradores 7.500 dólares, mas o mesmo valor estaria sendo pedido novamente.

Falta de informação é generalizada

Segundo o diretor de operações e emergências da OIM, Mohammed Abdiker, afirmou ao site da organização que há valas comuns no deserto. A OIM reporta que 171 pessoas foram encontradas mortas apenas este ano nas praias do mediterrâneo, e milhares de outras haviam sido resgatadas. Já a agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para refugiados (UNCHR), divulgou dados que afirmam que 5.000 pessoas morreram tentando a travessia, aproximadamente 14 por dia.

O porta-voz da OIM, Leonard Doyle, afirmou de Geneva, Suiça, que os migrantes que tentam acessar a Europa através da Líbia simplesmente não sabem do que os espera no país, e que há trabalhos para tentar espalhar a informação pelo continente. As fontes mais confiáveis são homens e mulheres resgatados pela organização que relatam os casos já brutalizados e psicologicamente destruídos.

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