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Coalizão Negra Por Direitos publica nota contra Comitê externo do Carrefour

2 de dezembro de 2020

Para articulação, no lugar de combater o racismo estrutural, Carrefour adota medidas que tentam de minimizar reiteradas denúncias de violência racista em seus estabelecimentos

Texto: Victor Lacerda | Edição: Flávia Ribeiro | Imagem: Silvia Izquierdo / AP 

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A Coalizão Negra por Direitos, articulação com mais de 150 organizações, coletivos e entidades do movimento negro e antirracista nacional, lançou nota em que repudia a postura adotada pela Rede Carrefour, após o caso do bárbaro assassinato de João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, ocorrido em uma das lojas do grupo Carrefour, em Porto Alegre, no último dia 20 de novembro. O texto pontua que a rede de supermercados tenta invisibilizar a violência racista que causou o espancamento e assassinato de um homem negro, no dia em que se celebra a Consciência Negra, e que culminou com uma onda de protestos em todo o Brasil. 

Intitulado como “Não Há Mediação com Quem Nos Mata”, o documento destaca não acreditar que “qualquer atuação individualizada de sujeitos seja capaz de resolver um problema que estrutura absolutamente todas as relações sociais deste país”.

Recetemente, a rede anunciou medidas, como a criação de um fundo de R$ 25 milhões para combater o racismo internamente e a criação do “Comitê Externo de Diversidade e Inclusão”. Para as entidades, no entanto, as ações tentam monetizar o caso e escamotear a responsabilidade empresa perante o caso de João Alberto. “Nesse sentido, nos cabe reafirmar que não há saídas que não sejam construídas juntos com as organizações do movimento social negro e o irrestrito respeito à família da vítima e sua comunidade, bem como de outras famílias atingidas pelas práticas reiteradas de racismo na empresa. O enfrentamento ao racismo estrutural e as medidas de reparação cabíveis precisam ser feitos na arena pública com amplo debate social”.

“Lembremos que Palmares, o Quilombo capaz de desafiar a Coroa portuguesa, foi uma construção coletiva, de homens e mulheres que deram suas vidas à luta por liberdade”, complementa e finaliza o texto. 

Confira a nota na íntegra: 

A COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS, articulação com mais de 150 organizações, coletivos e entidades do movimento negro e antirracista de todo o Brasil, que atuam coletivamente na promoção de ações de incidência política nacional e internacional na defesa dos direitos da população negra brasileira, vem a público expressar seu mais profundo repúdio à postura adotada pela Rede Carrefour na tentativa de tentar invisibilizar a violência racista que levou à óbito João Alberto Silveira de Freitas no interior de uma de suas lojas da cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. 

A referida rede tem reiteradas denúncias de crime de racismo e discriminação racial  em suas lojas,  através de seu corpo de funcionários e do seu aparato de segurança privada. São diversos casos que não deixam dúvidas quanto ao conhecimento da direção da rede no Brasil sobre o papel ativo do Carrefour em práticas violentas fundadas no racismo. Ao longo do tempo, esses crimes têm sido denunciados, seja através da mídia, ou seja, através das organizações sociais negras, culminando agora neste bárbaro assassinato.

A pronta articulação do Movimento Negro Brasileiro, com ênfase à atuação dos Movimentos que atuam na cidade onde ocorreu o crime, garantiu a ampla discussão nacional e internacional sobre o episódio, pautando na ordem do dia uma incidência de boicote à rede de supermercados.  Os dias que seguiram ao caso foram marcados por atos em quase todas as capitais brasileiras. A resposta imediata dos Movimentos evidenciou publicamente a inexistência de qualquer tipo de possibilidade de mediação com quem nos mata e nossa profunda solidariedade à dor da família e respeito às suas decisões.

O retorno do Carrefour não poderia ser mais negativo: inicialmente negou responsabilidade sobre o ocorrido, depois resolveu monetizar a vida interrompida tragicamente de João Alberto com a criação de um fundo de igualdade racial de valor irrisório ao lucro da empresa, e, por fim, buscará escamotear sua responsabilidade via comitê. Nesse sentido, nos cabe reafirmar que não há saídas que não sejam construídas juntos com as organizações do movimento social negro e o irrestrito respeito à família da vítima e sua comunidade, bem como de outras famílias atingidas pelas práticas reiteradas de racismo na empresa. O enfrentamento ao racismo estrutural e as medidas de reparação cabíveis precisam ser feitos na arena pública com amplo debate social.

Nesse sentido, acompanhamos as reivindicacões do movimento negro local, explicitadas pela recém eleita bancada de vereadores negros do município de Porto Alegre,  já protocoladas, que solicitam a cassação do alvará de funcionamento da Rede Carrefour no município de Porto Alegre, de acordo com o expresso no Art. 150 da Lei Orgânica Municipal que dispõe: 

Art. 150 – Sofrerão penalidades de multa até a cassação do alvará de instalação e funcionamento os estabelecimentos de pessoas físicas ou jurídicas que, no território do Município, pratiquem ato de discriminação racial; de gênero; por orientação sexual, étnica ou religiosa em razão de nascimento; de idade; de estado civil; de trabalho rural ou urbano; de filosofia ou convicção política; de deficiência física; imunológica, sensorial ou mental; de cumprimento de pena; cor ou em razão de qualquer particularidade ou condição. 

No fundo, a empresa global Carrefour precisa explicar quais parâmetros tem utilizado na contratação de suas empresas de segurança privada por todo o país. Essas empresas têm sido responsáveis por excessos e violência. Suas práticas violadoras de direitos são frequentemente relatadas por pessoas negras de todas as idades e crescentemente noticiadas nos meios de comunicação. Compreendemos que essas práticas reforçam sistemas de controle, vigilância e suspeição que incidem sobre a população negra, violando seus direitos humanos e perpetuando a violência racial. Assim, transferir esse assunto para a seara da diversidade é tergiversar sobre sua responsabilidade direta na contratação dessas empresas. Por isso, em representação feita por esta Coalizão contra o Carrefour e a empresa Vector Segurança Patrimonial, solicitamos ao Ministério Público Federal e Ministério Público do Rio Grande do Sul a responsabilização dessas.

Seguimos acreditando que não há possibilidade efetiva para a superação do racismo sem a organização política de negros e negras. Reforçamos que o processo de lutas desenvolvido nas ruas são condições fundamentais para impulsionar os processos políticos que construímos. Não acreditamos que qualquer atuação individualizada de sujeitos seja capaz de resolver um problema que estrutura absolutamente todas as relações sociais deste país. 

Assim como não cremos na ideia de que teremos heróis; nós os cultivamos no dia a dia das lutas do povo negro. Lembremos que Palmares, o Quilombo capaz de desafiar a Coroa portuguesa, foi uma construção coletiva, de homens e mulheres que deram suas vidas à luta por liberdade.

Coalizão Negra Por Direitos,

Novembro de 2020. 

 

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