No dia 1 de fevereiro de 2025, uma das mais brilhantes intelectuais do Brasil completaria 90 anos. Antropóloga, filósofa, professora e política, Lélia Gonzalez é considerada pioneira nos estudos de gênero e raça do país, tendo construído um legado atemporal no debate acadêmico-científico contra o racismo.
A filósofa nasceu em 1935, na cidade de Belo Horizonte (MG), filha de um homem negro operário e uma empregada indígena. Após se mudar para a capital fluminense ainda criança, formou-se em História e Filosofia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), local onde seguiu a carreira acadêmica com mestrado em Comunicação e doutorado em Antropologia Política.
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Considerada visionária para estudiosos e movimentos sociais, a ativista é conhecida pela extensa contribuição no entendimento interseccional das múltiplas expressões do racismo na estrutura social brasileira, utilizada até hoje para pautar os debates sobre o tema.
As produções da filósofa, em especial o conceito de “amefricanidade”, em meados dos anos 1970, são objetos de estudo de diversas pesquisadoras, intelectuais e movimentos sociais.
O termo se refere às experiências políticas e sociais vividas por comunidades negras e indígenas em oposição ao sistema colonial, além de discorrer sobre as influências dos povos originários na formação político-cultural de toda América.
A autora ainda se aprofundou no papel exercido pela mulher negra na constituição da sociedade, através dos estereótipos de “mulata”, “doméstica” e “mãe preta”. Com questionamentos à hierarquia social entre mulheres negras e brancas, Lélia se tornou conhecida por “enegrecer” o feminismo.
Além de contribuir academicamente com a produção do pensamento social brasileiro, ela foi uma das fundadoras dos principais movimentos nacionais de resistência negra, o Movimento Negro Unificado (MNU).
A ativista também participou da criação do Coletivo de Mulheres Neras N’Zinga e do Instituto de Pesquisas da Cultura Negra (IPCN).
Tentativa de Apagamento
Após sua morte, em julho de 1994, a autora passou por um apagamento no meio acadêmico, mesmo tendo desenvolvido teses fundamentais para a emancipação da comunidade negra e para o entendimento das estruturas de opressão na sociedade.
Em um contexto de universidades majoritariamente ocupadas por pessoas brancas, o pensamento de Lélia foi preterido por anos nas discussões relacionadas a gênero e raça.
Os debates críticos da academia eram, em sua maioria, voltados para conteúdos produzidos por pensadores europeus e norte-americanos. Por anos, a autora foi raramente incluída nas bibliografias obrigatórias dos cursos de ciências humanas e seu reconhecimento permaneceu restrito a círculos militantes e intelectuais negros.
A defesa de seu legado e o resgate da intelectual tem sido reforçado por iniciativas de pesquisadoras negras e movimentos sociais, que revindicam seu espaço nas universidades.