Devido à sua história repleta de migrações, o Brasil é um dos países mais miscigenados do planeta. E isso se reflete na diversidade presente no DNA da população. As três ancestralidades que mais se destacam são a base que formam a identidade brasileira: europeia, africana e nativo-americana. É o que revela o estudo genético desenvolvido pela Genera, primeiro laboratório brasileiro especializado em genômica pessoal. O levantamento inédito traz dados sobre a ancestralidade dos brasileiros por estado, com base em um banco de dados de mais de 260 mil DNAs analisados.
Nas amostras coletadas, a ancestralidade europeia se sobressai entre as demais, com 75%. Em seguida, o perfil genético brasileiro é composto em 11% pela África, 6,5% pelas Américas, 5,4% pelo Oriente Médio e 2% pela Ásia. A ancestralidade judaica soma 2,7%.
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A ancestralidade genética do brasileiro pode ser avaliada por dois caminhos: Global, a partir da análise da carga genética herdada dos antepassados e presentes nos 22 pares de cromossomos autossômicos; e por Linhagens, que revela a herança genética recebida exclusivamente da linha paterna (via cromossomo Y, recebido e transmitido apenas por pessoas do sexo biológico masculino) e da linha materna (via DNA mitocondrial, transmitido apenas por pessoas do sexo biológico feminino).
Região Nordeste
O Nordeste é a região onde aportaram os primeiros navios com africanos escravizados e a que mais recebeu essa população ao longo dos três séculos de escravidão. Os locais que recebiam o maior número de escravos na região eram Salvador (Bahia) e Recife (Pernambuco). Desses portos, os africanos escravizados eram transportados aos mais diversos locais do país.
O levantamento da Genera converge com esse contexto, pois aponta o Nordeste como a região com maior representatividade da África, com destaque para o estado da Bahia (BA), com 22,72% dessa ancestralidade.
Além disso, o estudo também indica a região como a que mais possui representatividade do Oriente Médio, com os quatro primeiros estados com essa ancestralidade, ocupando Paraíba (PB) a primeira posição, com 6,64%.
Ainda no estado baiano é possível encontrar moradores com ancestralidade de etnias mais específicas, como da Escandinávia, do Cáucaso, da Amazônia, do Leste da África, e também de Senegal e Gâmbia, além da Arábia, Japão e Coreias.
Região Norte
Os sete estados da região Norte possuem a população com maior representatividade da ancestralidade advinda dos povos originários das Américas, sendo o Amapá (AP) o estado de maior destaque, com 28,11%.
De acordo com o Censo 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 900 mil pessoas no Brasil se declaram como indígenas. Dessas, 57,7% vivem em terras indígenas oficialmente reconhecidas. No Censo, o Amazonas (AM) é o estado que mais possui pessoas autodeclaradas indígenas, destacando-se também no levantamento da Genera como o segundo mais representativo, com 21,95% de ancestralidade nativo-americana.
Região Centro-Oeste
A região Centro-Oeste começou a ser ocupada pelos bandeirantes, majoritariamente paulistas de ancestralidade europeia, em busca de jazidas de ouro. Depois, passou a receber migrantes dos demais estados. Portanto, possui ancestralidade relativamente próxima à média brasileira.
Contudo, a região tem alguns destaques. A influência nipônica ajudou na construção de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul (MS), que atualmente possui a terceira maior colônia japonesa do país. O levantamento da Genera aponta Mato Grosso do Sul como o segundo estado do país com maior representatividade da Ásia, possuindo 2,94% dessa ancestralidade.
Região Sudeste
O Sudeste é a região mais populosa do Brasil. Recebeu quantidades massivas de imigrantes, tanto de outras nacionalidades quanto de outras regiões do país, e por isso possui destaques para diferentes ancestralidades.
O estado de São Paulo (SP), por exemplo, é o que mais possui representatividade da Ásia e de judeus, segundo levantamento da Genera. A capital do estado concentra 80% dos judeus que moram no país, e tem a segunda maior comunidade da América Latina.
O estudo da Genera aponta o estado de São Paulo com 3,07% de ancestralidade judaica.
Região Sul
A ancestralidade europeia se destaca em todas as regiões e estados brasileiros, mas é nos três estados do Sul que possui maior representatividade, segundo o estudo da Genera.
Principalmente durante os séculos 19 e 20, muitos imigrantes europeus foram encaminhados à região Sul com o objetivo de ocupá-la e proteger as fronteiras do país. Lá, formaram diversas colônias, com destaque para as alemãs e italianas.
O levantamento indica Santa Catarina como o estado brasileiro com maior representatividade da ancestralidade europeia, com 83,10%.
Linhagens ancestrais do brasileiro
Compreender as linhagens é muito importante para mapear a história de cada povo e compreender melhor a relação entre os fluxos migratórios e a diversidade genética.
Segundo informações da Genera, a linhagem paterna é obtida pelo cromossomo Y, herdado do pai pelos filhos do sexo biológico masculino (XY). Em pessoas que nasceram com sexo biológico feminino (XX), devido à ausência do cromossomo Y, não é possível identificar a linhagem paterna.
Já a linhagem materna é determinada por meio do DNA mitocondrial, ou seja, pelo DNA presente na mitocôndria, uma organela presente nas células humanas e que é transmitida apenas pela mãe a seus filhos biológicos. Os códigos que definem as linhagens, tanto paterna quanto materna, são denominados haplogrupos. Por eles é possível traçar o caminho evolutivo até os ancestrais humanos mais antigos comuns a toda população, denominados Adão Cromossomial-Y e Eva Mitocondrial.
Linhagem paterna
De acordo com o estudo da Genera em relação às linhagens paternas, é possível perceber uma concentração de mais de 80% de haplogrupos comuns na Europa. Em seguida, tem-se cerca de 15% de haplogrupos comuns na África, 3% nas Américas e Ásia, e 0,4% referente a outras regiões. E essa distribuição é próxima entre as cinco regiões do país.
A grande presença da Europa na linhagem paterna do brasileiro pode ser explicada, principalmente, pelos fluxos migratórios e características da cultura patriarcal, sobretudo a partir da colonização do país.
Durante o processo de colonização das Américas por países da Europa, majoritariamente foram os homens enviados para explorar e ocupar o novo continente, principalmente nas primeiras décadas. Muitos destes homens tiveram relações e até se casaram com mulheres indígenas, como forma de viabilizar os processos de conquista e colonização.
Linhagem materna
Já em relação às linhagens maternas, identificadas a partir do DNA mitocondrial, os haplogrupos mais frequentes no Brasil são mais distribuídos entre as diversas etnias, se comparadas às linhagens paternas.
Contudo, há alguns destaques em regiões específicas do Brasil:
Região Sul: A região Sul é a que concentra a maior frequência de haplogrupos mais comuns na Europa, com 55%, Seguem-se Américas e Ásia, com 26%, África, com 11%, e outros haplogrupos com quase 7%.
Região Sudeste: A região Sudeste se equilibra entre haplogrupos provenientes de três regiões: 35% da Europa, 31% da América e Ásia, e 27% da África. Enquanto apenas 4% correspondem a outras linhagens mapeadas.
Região Centro-Oeste: A região Centro-Oeste mantém esse equilíbrio entre linhagens, porém com uma distribuição mais regional, que compreende 37% de haplogrupos provenientes das Américas e Ásia, 31% da África e 27% da Europa.
Região Norte: Na região Norte é possível notar que a ocorrência de linhagens provenientes das Américas e Ásia é superior, correspondendo a 51%, seguidas de África, com 26%, e da Europa, com 18%. Esse dado compreende a volumetria de povos originários presentes nessa região.
Região Nordeste: O Nordeste é a região que concentra o maior número de descendentes de linhagem africana, que corresponde a 40%, o que converge com a ancestralidade global, cuja ancestralidade africana tem destaque. Em seguida, América e Ásia, com 35%, e Europa, com 21%.
Enquanto as linhagens paternas provenientes da Europa são majoritárias em todas as regiões, as maternas provenientes do mesmo continente são mais frequentes apenas nas regiões Sul e Sudeste, mas com uma diferença menor em relação às demais ancestralidades.
As diferenças na distribuição de ancestralidades entre as linhagens paterna e materna podem se justificar pelo contexto histórico de um sistema patriarcal eurocentrista no país, desde sua colonização. Enquanto na linhagem paterna se destaca a ancestralidade europeia, na materna há maior distribuição entre ancestralidades, especialmente entre as três bases da identidade brasileira: europeia, africana e nativo-americana.