Fundamental para o combate à pandemia, a vacinação ainda não faz parte da realidade de grande parte dos negros brasileiros. Segundo dados levantados pela Agência Pública, cerca de 28% dos brasileiros vacinados até agora são negros, enquanto brancos representam mais de 52% dos imunizados.
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Em ritmo lento no Brasil, a vacinação enfrenta problemas como a falta de dados sobre a população e o aumento no número de casos e da letalidade da Covid-19. A população mais pobre enfrenta ainda o aumento da insegurança alimentar, maior vulnerabilidade ao contágio da doença e a dificuldade no acesso à informação.
“Nada de novo. O racismo estrutura uma sociedade que exclui um segmento da população de seus direitos fundamentais”, aponta a médica Zezé Menezes, que também é ativista do movimento negro.
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“A vacinação foi organizada sem levar em consideração a organização etnico-racial do país. Ela se preocupa com faixas etárias e categorias de trabalho”, expõe Hilton Silva, membro do Grupo de Trabalho (GT) Racismo e Saúde da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e pós-graduado em Saúde, Ambiente e Sociedade.
Silva reforça que o Plano Nacional de Imunização, do governo federal, desconsidera a população que vive nas periferias e que tem mais dificuldade para acessar serviços públicos em geral. “Além de estabelecer critérios etários, deveriam estabelecer critérios socioeconômicos. Quem tem a maior taxa de mortalidade?”, indaga.
Segundo o estudo Raça e Saúde, homens pretos são maioria no índice de mortalidade por conta da Covid-19 no país, sendo que este grupo representa o dobro do que é formado por mulheres brancas. Na região Sul, negros são os que mais morrem, mesmo sendo minoria entre a população.
O índice é sustentado por desigualdades que vão desde a renda per capita inferior a um terço do salário mínimo, até a falta de suporte financeiro para cumprir o isolamento social, como é recomendado.
Alterações no Plano Nacional de Imunização
O PNI da Covid-19 está em sua quinta versão, desde o anúncio realizado no início do ano. Somente nas últimas semanas a população quilombola foi colocada como uma das prioridades na vacinação e os territórios começaram a receber as primeiras doses. Há, no entanto, informações de que as doses enviadas pelo Ministério da Saúde são suficientes para imunizar menos de 10% dos quilombolas.
“A população quilombola é a mais desassistida de todas, muitos gestores municipais nem reconhecem a existência dessas pessoas. À medida que essa situação vai se tornando mais evidente, as autoridades precisam fazer as adaptações necessárias. É um processo de luta”, explica Hilton.
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Para a médica Rita Borret, o Brasil falha ao não olhar para a questão racial e social para propor programas de vacinação universais, o que ontribui com as iniquidades raciais.Ela destaca a exposição de uma parcela da população, que não é reconhecida no plano de vacinação e se torna ainda mais vulnerável ao coronavírus.
“Os trabalhadores informais, os trabalhadores essenciais, as pessoas privadas de liberdade e em situação de rua estão mais sujeitos à contaminação e têm menos acesso à saúde”, exemplifica.
Segundo Hilton. o governo deveria ainda se preparar para os efeitos pós-pandemia. “O que vai acontecer depois da pandemia? Quantas crianças ficarão sem comida por terem perdido os pais para a Covid-19? É preciso que o estado se prepare para lidar com isso e atenda as populações mais carentes e mais necessitadas desde já”, considera.