Senador Paulo Paim afirma que essa população pode ser penalizada caso empresas não se comprometam em realizar o tratamento de água e esgoto; privatização foi aprovada no Senado no fim de junho
Texto: Guilherme Soares | Edição: Nataly Simões | Imagem: Agência Senado
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O Brasil possui 35 milhões de pessoas que não têm água tratada e 100 milhões sem saneamento básico. Essa população pode ser prejudicada pelo novo marco legal do saneamento básico, aprovado em 24 de junho pelo Senado Federal, conforme explica o senador Paulo Paim (PT-RS), que votou contra a proposta, em entrevista ao Alma Preta.
“O problema de privatizar é que empresas privadas querem lucro. As comunidades mais pobres e as cidades do interior podem ter investimentos que não compensam para essas empresas, enquanto o estado tem obrigação de fazer”, afirma. A preocupação, segundo Paim, é a desestruturação das companhias estaduais de saneamento. “Isso pode acabar com o subsídio cruzado que faz com que as áreas mais rentáveis custeiem o investimento nas que dão menos retorno”, pontua.
O Projeto de Lei (PL) 4.162/2019 prorroga o prazo para o fim dos lixões e facilita a privatização de estatais do setor. A proposta extingue o modelo atual de contrato entre os municípios e as empresas estaduais de água e esgoto. Pelas regras em vigor, as companhias precisam obedecer critérios de prestação e tarifação, mas podem atuar sem concorrência. O novo marco transforma os contratos em vigor em concessões com a empresa privada que assumir a estatal. O texto também torna obrigatória a abertura de licitação, envolvendo empresas públicas e privadas.
Paim ressalta que diversas cidades do mundo como Berlim, La Paz e Budapeste, que optaram pelo caminho da privatização, repensaram o modelo e voltaram a estatizar o serviço. “O serviço ficou mais caro e a qualidade não aumentou”, recorda. No Brasil, o senador gaúcho cita o exemplo de Manaus, que teve a privatização há 20 anos e não tem qualidade de serviço. Já no estado do Tocantins, o serviço foi privatizado e a empresa que venceu a licitação devolveu as cidades menores para o governo do estado. “A iniciativa privada vai cuidar daquilo que tem mais lucro”, alerta Paim.
As metas previstas no projeto aprovado no Senado podem não ser cumpridas, assim como já ocorreu outras vezes. “Imagina se tivéssemos acabado com o Sistema Único de Saúde (SUS), como estaríamos agora nesse momento de pandemia? O projeto não prevê responsabilidade com multas para empresas que assumirem os serviços e não cumprirem”, analisa Paim. Como alternativa, o senador afirma que as parcerias-público-privadas (PPPs) seriam uma opção para que estado e empresas pudessem trabalhar juntos e garantir a universalização de serviços, de modo que realmente atenda as populações mais pobres e periféricas.
O texto do projeto de lei aprovado no Senado estabelece que os contratos que já estão em vigor serão mantidos e até março de 2022 poderão ser prorrogados por 30 anos. No entanto, esses contratos deverão comprovar viabilidade econômico-financeira, ou seja, as empresas devem demonstrar que conseguem se manter por conta própria — via cobrança de tarifas e de contratação de dívida. Os contratos também deverão se comprometer com metas de universalização a serem cumpridas até o fim de 2033: cobertura de 99% para o fornecimento de água potável e de 90% para coleta e tratamento de esgoto. Essas porcentagens são calculadas sobre a população da área atendida. O texto segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro.