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São Paulo exclui pessoas trans e não-binárias de programa de distribuição de absorventes

Em São Paulo, existe uma lei que contempla alunas em idade escolar, no entanto, a inclusão de trans e não-binários, bem como a distribuição dos insumos para pessoas mais velhas nas Unidades Básicas de Saúde não foram aprovadas

Texto: Caroline Nunes | Edição: Nadine Nascimento | Imagem: Reprodução/BigStock

Closeup photo of young woman picking sanitary pad out of green packet. Hygiene feminine menstruation pads concepts.

Foto: Closeup photo of young woman picking sanitary pad out of green packet. Hygiene feminine menstruation pads concepts.

26 de outubro de 2021

A distribuição gratuita de absorventes e a pobreza menstrual são assuntos que voltaram à tona recentemente após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetar o projeto de lei (PL 4968/2019), que garantia o fornecimento desses insumos para pessoas em situação de vulnerabilidade. A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que uma em cada 10 meninas no mundo sofrem com o impacto da pobreza menstrual na vida escolar. No Brasil, estima-se que esse número seja uma em cada quatro. Em 2014, a ONU reconheceu o direito à higiene menstrual como uma questão de direito humano e à saúde pública.

Em São Paulo, no entanto, existe uma Lei (nº 17.574, de 12 de julho de 2021) que institui a distribuição gratuita de absorventes para estudantes do ensino fundamental e médio, mas a redação da norma deixa muitas questões em aberto, segundo a ativista social e designer Karina Cárdenas.

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Em um primeiro momento, a vereadora Érika Hilton (PSOL) e o vereador Thammy Miranda (PL) pediram uma edição da lei para mudar o termo para “pessoas que menstruam” no lugar de mulheres. O objetivo da redação era incluir pessoas trans e não-binárias na legislação.

“Além disso, a Silvia [Ferraro], da Bancada Feminista, fez uma emenda para que a distribuição dos absorventes não fosse feita somente nas escolas e, sim, nas UBSs. Essa emenda não foi aprovada, o que é estranho, pois iria atender mais pessoas”, explica Cárdenas.

A emenda diz ainda que “as Unidades Básicas de Saúde do município de São Paulo também serão locais de distribuição de absorventes a pessoas que necessitem”, visando todos os indivíduos em idade menstrual, não só jovens estudantes.

“Outra questão é: a data que essa lei começou a vigorar e saber se realmente está funcionando ou se é mais uma coisa que ficou apenas no papel”, ressalta Karina. O texto descreve que a norma entra em vigor a partir do momento de sua publicação.

Em resposta, a vereadora Érika Hilton afirmou que ambas as emendas, tanto a dela quanto a proposta por Silvia Ferraro, foram colocadas em votação no mesmo dia e ambas foram negadas, contando com voto favorável apenas das bancadas do PSOL, PT e dos vereadores Thammy Miranda e Cris Monteiro. “E o projeto já foi sancionado sem as mudanças, há muitos meses”, completa a parlamentar.

Leia também: ‘Trans negra é filmada enquanto é agredida por homem branco’

A vereadora Erika é autora de uma ação no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) “requerendo a inclusão de homens trans e transmasculines na política pública”. Ela afirma ainda que foi levantada a questão de não delimitar a distribuição de absorventes nem por gênero ou por idade, “mas foi voto vencido”.

Programa Dignidade Íntima

A lei municipal foi usada como exemplo pelo governo do estado de São Paulo, que implementou o Programa Dignidade Íntima a fim de atender as estudantes em idade menstrual também nas escolas estaduais.

A Secretaria de Educação do estado afirmou à Alma Preta Jornalismo que o programa tem cumprido seu papel para diminuir as desigualdades. Em nota, a pasta ressaltou que investiu mais de R$ 30 milhões somente em 2021 para a compra dos insumos.

“Os produtos são disponibilizados em todas as unidades escolares da rede estadual para quaisquer alunas que precisarem, com destaque para aquelas em situação de vulnerabilidade. O programa também promove a formação dos profissionais da escola e estudantes, para garantir acesso ao benefício”, diz.

A secretaria não fala se pessoas trans e não-binárias são contempladas na distribuição, mas afirma que “a compra dos materiais é realizada através do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE-SP) e os recursos, destinados anualmente, são repassados conforme a quantidade de estudantes elegíveis em cada escola, exclusivo para a finalidade do Dignidade Íntima”, completa o informe.

Mobilização

No Capão Redondo, zona Sul da capital, a Escola Estadual (E.E.) Santa Rosa De Lima mobilizou toda a comunidade escolar e recebeu uma doação significativa de absorventes da empresa P&G. Como a maior parte das alunas da escola ainda não estão em idade menstrual, a direção da unidade realizou uma doação às mães dos estudantes.

Foram preparadas embalagens contendo três absorventes cada e oferecidas às mães e responsáveis que iam até a escola levar seus filhos. “Nossa ideia é dar continuidade neste tipo de ação, para ajudar não só os estudantes que precisam, mas também, quando possível, suas mães e responsáveis”, explica a diretora da escola, Paula Beatriz. “Esse é um programa muito válido, que volta a atenção para a saúde da mulher. Isso é também papel da escola, e tem que partir dela”, completa.

Em Campinas, a E.E. Álvaro Cotomacci vem realizando uma série de palestras com abordagens sobre menstruação e higiene íntima. Por iniciativa das professoras Denize Basseto e Aline Correa, que ministram biologia e ciências, respectivamente, a unidade preparou um material de apoio para as palestras, que ocorre de forma escalonada em virtude do revezamento de alunos no modelo presencial. Durante os encontros, a direção da escola prepara kits com absorvente que são entregues às alunas. A escola conta com mais de 400 estudantes em idade menstrual – 12 a 18 anos.

No município de Taquaritinga, na região Central do Estado, a E.E. Victor Maida, além de promover a distribuição de absorventes, após treinamento dos profissionais da unidade, a equipe do Grêmio Estudantil, com auxílio de costureiras voluntárias da comunidade, produziram porta-absorventes que estão sendo distribuídos para cerca de 480 alunos da escola.

“Acreditamos que é dando a oportunidade de acesso à educação e à sala de aula, de forma digna para todos àqueles que têm direito, que vamos em frente na construção de uma sociedade mais justa e bem assistida pelo poder público. A educação é fundamental, não há como enxergar de outra forma”, pondera o Secretário da Educação, Rossieli Soares.

A Alma Preta Jornalismo entrou em contato também com a Secretaria de Saúde da cidade de São Paulo, a fim de compreender se a distribuição de absorventes está sendo feita para pessoas mais velhas em idade menstrual, e para questionar se nas escolas as pessoas trans e não-binárias estão sendo atendidas ou se há algum tipo de proposta que faça a distribuição de absorventes nas Unidades Básicas de Saúde.

As diretorias de ensino também foram contatadas para incluir mais instituições escolares que são beneficiadas no programa Dignidade Íntima no texto. O vereador Thammy Miranda também foi contatado, a fim de questionar o apoio em programas que atendam as UBSs. Até o momento desta publicação, não houve resposta. Caso retornem o contato, a matéria será atualizada.

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