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Violência armada afeta 48% das escolas da Região Metropolitana do Rio, aponta estudo

Pesquisa do Instituto Fogo Cruzado, GENI-UFF e UNICEF revela que 800 mil estudantes convivem com tiroteios e controle territorial de grupos criminosos
Forças de segurança ocupam ruas próximas ao Complexo do Lins, na zona norte do Rio de Janeiro, na Operação Onerat.

Forças de segurança ocupam ruas próximas ao Complexo do Lins, na zona norte do Rio de Janeiro, na Operação Onerat.

— Tomaz Silva/Agência Brasil

29 de maio de 2025

Um total de 1.781 escolas públicas da Região Metropolitana do Rio de Janeiro estão localizadas em territórios sob domínio de grupos armados, de acordo com o relatório “Educação sob Cerco”, divulgado nesta quinta-feira (29). O número representa 48% do total de unidades escolares da rede pública na região. 

A publicação é resultado de uma parceria entre o Instituto Fogo Cruzado, o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos, da Universidade Federal Fluminense (GENI/UFF), o Centro para o Estudo da Riqueza e da Estratificação Social (CERES-IESP) e conduzida pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), com informações de 2022.

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Na cidade do Rio, 58,4% das escolas funcionam em áreas controladas — 30% pelo tráfico e 28,4% por milícias. A Zona Oeste da capital concentra o maior número de unidades sob domínio miliciano. Nas demais cidades da Baixada Fluminense e da região metropolitana, o controle territorial também interfere diretamente na rotina de estudantes, famílias e profissionais da educação.

Alunos sob risco diário

As informações foram produzidas a partir da combinação de dados do Censo Escolar (2011–2019), do Mapa Histórico dos Grupos Armados do Instituto Fogo Cruzado e de registros de tiroteios em 2022. O levantamento demonstra que aproximadamente 800 mil alunos da educação básica estudam em locais de risco contínuo.

O relatório aponta que, em 2022, quase metade das escolas da região (46%) sofreram pelo menos um impacto direto da violência armada — em muitos casos, resultando em suspensão de aulas. A Zona Norte da capital lidera em registros, com 1.714 tiroteios no entorno de escolas. Na Baixada Fluminense, foram registrados 1.110.

Violência policial no entorno das escolas

As ações policiais representam parte significativa da violência próxima às escolas. O estudo mostra que as unidades escolares situadas em áreas sob domínio armado foram cenário de quase três vezes mais tiroteios com presença policial do que aquelas fora dessas áreas.

Entre as escolas localizadas em territórios controlados, 44% registraram confrontos com a presença de agentes do Estado. Nas demais áreas, o índice foi de 22%. A Zona Sul, com o maior contraste, teve 54% das escolas em zonas dominadas afetadas por operações com tiroteios, frente a 15% das localizadas em regiões não dominadas.

Efeitos prolongados mesmo com menos tiroteios

Apesar da redução no número de confrontos armados desde 2020 — especialmente após a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 635, que restringiu operações policiais em favelas durante a pandemia — o número de escolas afetadas permaneceu alto. Isso mostra que a violência é recorrente e geograficamente concentrada.

A escola mais atingida em 2022 está em São Gonçalo, com 18 episódios de tiroteios. No Complexo da Maré, as 45 escolas registraram 276 ocorrências. Outras regiões como Vila Kennedy, Manguinhos e Rocinha também aparecem com índices elevados.

Propostas do estudo

O relatório Educação sob Cerco apresenta um conjunto de sete diretrizes para enfrentar os impactos da violência armada sobre a educação na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. A primeira medida propõe a redução do controle armado sobre os territórios, com ações voltadas ao enfrentamento de suas bases econômicas e sociais. O objetivo é interromper as fontes de sustentação dos grupos armados e possibilitar a retomada do espaço público pelas instituições democráticas.

A segunda diretriz sugere uma articulação efetiva entre as políticas de segurança pública e as políticas educacionais. A ideia é que as duas áreas atuem de forma integrada, reconhecendo que a violência territorial afeta diretamente o cotidiano escolar e exige respostas coordenadas.

Outra proposta é fortalecer a escola como um espaço de proteção social, garantindo sua continuidade em condições seguras. Isso inclui investimentos em infraestrutura, protocolos de segurança e apoio psicossocial para a comunidade escolar. Além disso, o estudo defende a criação de um modelo de segurança pública centrado na proteção da infância e da adolescência, com ênfase na prevenção e na redução de danos.

A implementação da Lei Ágatha Félix, que estabelece mecanismos de investigação para homicídios de crianças e adolescentes, é apontada como uma medida urgente. O estudo também recomenda a ampliação de protocolos como o “Acesso Mais Seguro”, desenvolvido por organizações da sociedade civil, que busca minimizar os riscos de confrontos armados próximos às escolas.

Por fim, o relatório destaca a importância de reparar os danos causados pela violência e garantir compensações às escolas e aos estudantes impactados. As ações devem reconhecer as perdas acumuladas, tanto materiais quanto simbólicas, e promover medidas de justiça e inclusão para as comunidades afetadas.

Educação ameaçada

O relatório conclui que o direito à educação na Região Metropolitana do Rio de Janeiro continua sob ameaça permanente em razão da violência armada. A presença constante de operações policiais em territórios dominados agrava o problema, colocando em risco estudantes, professores e demais trabalhadores da educação. 

Segundo os autores, garantir educação em territórios em conflito requer medidas articuladas e contínuas de segurança pública, direitos humanos e justiça social.

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  • Giovanne Ramos

    Jornalista multimídia formado pela UNESP. Atua com gestão e produção de conteúdos para redes sociais. Enxerga na comunicação um papel emancipatório quando exercida com responsabilidade, criticidade, paixão e representatividade.

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