Entre 2012 e 2022, cerca de 417 mil homens foram mortos pela violência armada em todo o Brasil. Deste total, 79% das vítimas eram homens negros, grupo social que apresentou três vezes mais de chance de serem mortos por armas de fogo em relação aos homens não-negros.
Os dados são da recente pesquisa “Violência Armada e Racismo: o papel da arma de fogo na desigualdade racial”, divulgada pelo Instituto Sou da Paz nesta terça-feira (20). O relatório explora o impacto da violência bélica na vida dos homens brasileiros, a partir de informações obtidas pelos sistemas de Informação sobre Mortalidade (SIM) e de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), do Ministério da Saúde (MS).
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
Entre os negros, a taxa de homicídios por armas de fogo no período analisado foi de 44,9 a cada 100 mil homens. Para homens não-negros, o índice foi de 14,7, diferença que se manteve ao longo dos anos. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2022, a média nacional foi de 15,7 a cada 100 mil.
O documento aponta que homens de 20 a 29 anos são os que mais morrem nestas condições, somando 43% dos óbitos. A segunda faixa-etária mais atingida é de 30 e 59 anos (40%). Crianças, jovens e adolescentes entre dez e 19 anos representaram 14% das mortes.
Mesmo com uma redução significativa entre vítimas adultas e infanto-juvenis, a publicação evidencia a prevalência da violência armada entre adolescentes e jovens assassinados. Armas de fogo foram o meio utilizado em mais de 80% dos homicídios de meninos a partir de dez anos até jovens de 29 anos.
Ainda que a violência não-letal ocasionada por armas tenha apresentado um crescimento para ambos os grupos raciais a partir de 2021, em termos relativos, a taxa de notificação foi superior para homens negros em todas as regiões do país.
Em entrevista à Alma Preta, a coordenadora de projetos do Instituto Sou da Paz Cristina Neme observa que o número expressivo de óbitos de pessoas negras na faixa-etária de 20 a 59 anos agrava outras vulnerabilidades, como os índices de orfandade e o impacto nas famílias enlutadas.
“Você tem um efeito de custo humano, perda de vidas e também de custo social. Ao tirar prematuramente a vida das pessoas você tem uma conta de perda dos anos de vida, que é chamada anos potenciais de vida perdida. Aquilo que a pessoa deveria ter vivido, produzido, enfim, se realizado como pessoa, como ser humano, e não aconteceu. Isso dá uma consequência para as gerações futuras. Porque as famílias também perdem renda, além dos danos emocionais e psicológicos que eles sofrem”, explica.
Neme, que é especialista em sociologia da violência, ressalta que as desigualdades que afetam a comunidade negra agravam sua vulnerabilidade para a violência armada.
“Você já tem uma desigualdade no acesso aos direitos sociais e o recorte de raça. E, na medida em que você sofre a violência, você também fica mais preso a essa dinâmica de insegurança social, é como se fosse um prejuízo de mão dupla. Devemos romper com os fatores que vitimam mais as pessoas negras por violência e violência armada, concomitantemente com o enfrentamento das desigualdades sociais que marcam também mais a população negra. Porque uma coisa impacta na outra”, ressalta a coordenadora.