Antonieta de Barros fez história no país. Entre as décadas de 1930 e 1940, a jornalista, professora e política foi a primeira mulher negra a assumir um mandato popular no Brasil ao se tornar deputada estadual em Santa Catarina. Sua eleição ocorreu três anos após a conquista ao direito de voto pelas mulheres, através do Código Eleitoral de 1932. A deputada tinha no centro de sua plataforma política a educação para todos, além da emancipação dos mais pobres e das mulheres.
Nascida em 11 de julho de 1901 em Florianópolis (SC), Antonieta foi filha de uma lavadeira e ex-escravizada que trabalhava como doméstica para políticos da cidade. Em um período em que os índices de analfabetismo eram muito altos no país, principalmente entre a população negra, Antonieta aprendeu a ler e, aos 17 anos, se tornou aluna da Escola Normal Catarinense, formando-se professora.
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Em 1922, fundou o Curso Antonieta de Barros para alfabetizar pessoas sem condições financeiras; instituição que dirigiu até a sua morte. Por conta de sua relevância nacional, a Antonieta também está no livro Heróis e Heroínas da Pátria, obra localizada na Praça dos Três Poderes, em Brasília, e traz nomes de pessoas fundamentais para a história brasileira.
Toda essa história ganha formato e 300 litros de tinta nas paredes de 34 metros do Edifício Atlas, no centro de Florianópolis. A artista Gugie Cavalcanti inaugura uma nova pintura do rosto de Antonieta de Barros no prédio, após a primeira versão (feita em 2020), ter sido removida devido a reformas estruturais no prédio, necessárias por conta de infiltrações. Na época, a remoção chocou a população, que pediu para que a obra fosse refeita.
“Nós ficamos muito tristes com a remoção e a população também. Além do visual, é uma obra que traz uma figura muito querida para a cidade. Antonieta foi uma referência local e nacional”, conta Gugie Cavalcanti, artista da obra.
A proposta reafirma o poder transformador da arte urbana de grandes proporções, reconhecida mundialmente como ferramenta de educação, inclusão social e valorização da memória coletiva.
Para Gugie, dar forma ao legado de Antonieta é também uma experiência pessoal. “A história dela nos traz essa inspiração de nos sentirmos fortes para seguir nosso caminho, para fazer as coisas que desejamos, para que nós, mulheres, ocupemos mais espaços. Então, ela mesma me aconselhou, de certa forma, a fazer essa pintura ali. Acho isso muito especial. Mudou totalmente a minha vida também”, afirma a artista.
A artista por trás da pintura
Nascida em Brasília e criada em Florianópolis (SC), Gugie começou na arte através da dança de rua aos 13 anos, momento em que se aproximou da cultura Hip Hop. Formada em Artes Visuais pelo Centro de Artes (Ceart) da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), a artista já coloriu a cidade de Florianópolis com diversas obras, além de ter levado seus trabalhos para outros estados, como Rio Grande do Sul, São Paulo, Ceará e Rio de Janeiro (onde reside atualmente). Ao todo, já foram mais de 13 obras.
Mulher negra, artista visual, grafiteira e mãe da Lia e da Cássia, Gugie imprime seu olhar em cada tela, das pequenas às gigantes, nas laterais dos prédios. Neste seu olhar, o povo negro tem lugar de ser e estar no mundo, não somente como sobrevivente, mas vivente.
A artista traz personagens que sorriem, beijam e respiram, em sua naturalidade. São personagens que homenageiam amigos e pessoas reais, como a deputada Antonieta de Barros ou a intelectual Lélia Gonzalez. Gugie nomeia esse ato como publicidade afetiva.
“Sentimento vem antes do pensamento segundo alguns filósofos que eu pesquiso, mas principalmente é como percebo a vida e as mudanças que ocorrem na minha própria caminhada. Por isso acho muito importante que quando ocupo esses grandes espaços urbanos eu busco gerar sentimentos, bagagens emocionais que possam tornar nossa sociabilidade mais humana. A nossa convivência social é também na idade, onde eu pinto esses murais”, explica Gugie Cavalcanti.