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ENTREVISTA | Amailton Azevedo: ‘O rap valoriza a identidade negra e projeta um futuro mais humano’

Em entrevista à Alma Preta, o pesquisador e músico Amailton Magno Azevedo aborda a importância do gênero na valorização do negro e revisita os bastidores da obra "Na Trama do Rap", de sua autoria
Amailton Azevedo, professor, músico e pesquisador. Autor da obra "Na Trama do Rap".

Amailton Azevedo, professor, músico e pesquisador. Autor da obra "Na Trama do Rap".

— Arquivo Pessoal

15 de fevereiro de 2025

O pesquisador e músico Amailton Azevedo lançou, em 2024, o livro “Na Trama do Rap”, resultado de mais de 20 anos de pesquisa sobre o rap e sua influência na composição da identidade negra. O estudo aborda a trajetória do gênero musical em São Paulo e Havana, entre as décadas de 1980 e 2000, destacando o papel do rap como ferramenta de resistência e valorização das comunidades periféricas.

Em entrevista à Alma Preta, Azevedo explica a escolha desses dois contextos e detalha a importância do rap como instrumento de resistência social.

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Por que São Paulo e Havana?

A escolha de São Paulo como um dos focos da pesquisa se deve ao protagonismo da cidade no rap nacional. “São Paulo antecipou, amadureceu e consolidou o rap como uma modalidade musical na história da música urbana no Brasil”, explica Amailton. O pesquisador destaca que a ascensão dos Racionais MC’s, grupo formado por Mano Brown, KL Jay, Ice Blue e Edi Rock, foi determinante para a consolidação do gênero no país.

Já a escolha de Havana surgiu em 2018, quando Azevedo esteve em Cuba para pesquisar música negra. Durante a estadia, ele decidiu se aprofundar no rap cubano, após notar semelhanças entre a realidade dos jovens cubanos e dos brasileiros das periferias.

“Percebi que precisava de envolvimento, mais do que uma pesquisa acadêmica fria. A decisão de focar no rap veio da experiência prévia que já tinha em São Paulo. Passei meses entrevistando artistas cubanos e estudando suas conexões com o movimento global do rap”, relata.

Encontro com ícones do rap e imersão na cena

A pesquisa original foi realizada entre o fim dos anos 1990 e o início dos anos 2000 e ficou arquivada por mais de 20 anos. “Quando retomei o texto, senti que estava mais maduro para analisá-lo. Mantive as entrevistas da época, mas ampliei o repertório bibliográfico, incorporando novos pesquisadores do rap.”

Após um longo período na gaveta, o projeto foi retomado em 2015 e atualizado com novas referências acadêmicas e análises sobre o rap contemporâneo. O recorte temporal da obra se estende até 2004, incluindo o lançamento do álbum “Nada Como um Dia Após o Outro Dia”, do grupo Racionais MC’s, de 2002. O disco “Cores & Valores”, de 2014, ficou de fora da análise inicial. 

Entre os entrevistados para o livro, Amailton conversou com figuras centrais do rap brasileiro. “O método central da pesquisa foi a entrevista. Para chegar até os músicos, precisei frequentar os espaços onde eles estavam. Entrevistei Mano Brown, KL Jay, Taíde, Nelson Triunfo, LF (DNN) e X (DNN)”, conta.

Ele recorda o dia em que entrevistou Mano Brown após um show dos Racionais em Guarulhos. “Cheguei às 8 da noite, eles subiram ao palco às 5 da manhã. Só consegui falar com Mano Brown às 7 da manhã. Mesmo exausto, ele foi muito gentil e respondeu todas as minhas perguntas”, conta.

A interação com os artistas também levou Azevedo a convidar os Racionais MC’s para uma apresentação em uma escola pública na Zona Sul de São Paulo, onde lecionava. Para o escritor, esse foi um dos momentos mais marcantes da pesquisa: “O pátio ficou lotado. Mesmo sem ônibus para voltar para casa, os alunos ficaram até meia-noite.”

O rap como ferramenta de resistência

Além de documentar a história do rap, Azevedo enfatiza seu impacto social. Para ele, o rap continua sendo uma ferramenta poderosa de defesa das comunidades negras e um instrumento de transformação social. “Ele combate o racismo e projeta uma nova utopia do que podemos ser. Ele imagina um mundo diferente e nos empurra para um futuro mais esperançoso e humano”.

Quando questionado sobre a influência do gênero na atualidade, o pesquisador aponta que o rap tem um impacto profundo na juventude negra. “O rap floresce no gueto, entre pretos e pobres, e, ao se espalhar pelo mundo, se mantém como uma expressão das comunidades segregadas”, afirma.

Atualmente, o pesquisador organiza um livro coletivo sobre o reggae no Brasil, previsto para 2025, em comemoração aos 80 anos de Bob Marley. Questionado sobre uma nova edição da obra e sobre escrever um capítulo sobre o álbum “Cores & Valores”, ele não hesita: “Sim, escreveria”.


“Na Trama do Rap” foi lançado pela Educ, editora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde Amailton leciona. A obra está disponível para compra neste link.

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  • Giovanne Ramos

    Jornalista multimídia formado pela UNESP. Atua com gestão e produção de conteúdos para redes sociais. Enxerga na comunicação um papel emancipatório quando exercida com responsabilidade, criticidade, paixão e representatividade.

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