Em Belém, capital do Pará, 583 candidatos disputam 35 vagas na Câmara Municipal de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Entre eles, Bia Caminha (PT), de 25 anos, almeja a reeleição para o segundo mandato.
A candidata negra, feminista, bissexual e da Amazônia, foi eleita em 2020 aos 21 anos, sendo considerada a vereadora mais jovem no município da região Norte, obtendo 4.874 votos. Sua candidatura tem foco nos serviços essenciais, a exemplo do transporte, educação, cultura e melhorias nas periferias.
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Bia, que tem como trajetória a forte atuação no movimento estudantil, busca construir uma alternativa democrática e coletiva, com foco na melhoria e na qualidade de vida de todas as pessoas. No primeiro mandato, foi autora da Lei de Combate ao Racismo em Belém, criou a Ouvidoria de Direitos Humanos e realizou formações antirracistas para instituições e estabelecimentos.
Em entrevista à Alma Preta, Bia falou sobre as propostas com foco na garantia, acesso e permanência de pessoas negras no mercado de trabalho formal e o incentivo para arte e cultura negra. Além disso, contou sobre as sete ameaças de estupro e de morte sofridas ao longo do exercício do seu mandato. Confira:
Alma Preta: Quais são os maiores desafios que a candidato enxerga na cidade?
Bia Caminha: Nosso desafio emergencial hoje é garantir uma vitória da esquerda no parlamento, com uma grande bancada de mulheres negras. Nos últimos quatro anos ficou comprovado que não dá mais para ter ninguém falando em nosso nome, que quando o calo aperta, muitas vezes, não é o “aliado” que pensa na política pública para os nossos. É sempre nós por nós. Muito importante garantirmos a reeleição das mulheres negras de esquerda e ampliarmos a bancada. Costumo dizer que essa é a eleição das nossas vidas! Muita coisa dos próximos anos será decidida a partir daqui, como uma parlamentar jovem, me preocupo muito com o presente e o futuro que vamos construir para Belém.
Alma Preta: Quais são as principais propostas da candidata?
Bia Caminha: Nesta legislatura tivemos importantes conquistas, sou autora da Lei de combate ao racismo em Belém, que obriga a fixação de placas informando que racismo é crime e como buscar justiça. Criamos a Ouvidoria de Direitos Humanos, que realiza atendimento para vítimas do crime de racismo de forma gratuita. Realizamos formação antirracista para várias instituições e estabelecimentos. Trabalhamos muito e queremos fazer muito mais! No próximo mandato, estamos focadas em garantir o acesso e permanência de pessoas negras no mercado de trabalho formal, vamos lutar por um programa de apoio financeiro e técnico para empreendedores negros e garantir o incentivo para a arte e cultura negra. Mostramos que é possível e vamos seguir avançando no combate ao racismo.
Alma Preta: Como a vereança pode incidir na luta contra o racismo?
Bia Caminha: A presença do nosso corpo em um espaço majoritariamente e historicamente ocupado por homens brancos é capaz de mudar toda a lógica do lugar. Nós temos um olhar diferente sobre qualquer questão que seja discutida naquela casa, porque são os nossos corpos que ocupam as margens e somos nós que conhecemos a realidade. Não é um processo pacífico! Houveram conflitos, fui barrada várias vezes ao tentar acessar o plenário, sofri racismo das mais variadas formas, mesmo exercendo ali um cargo de liderança. Denunciamos os ataques e seguimos de cabeça erguida fazendo política para mudar a vida dos nossos! Nosso mandato é um grande exemplo de que é possível realizar projetos concretos de combate ao racismo pelas bases, pelas câmaras municipais.
Alma Preta: As Câmaras brasileiras são amplamente de direita. Como é possível agir nesse ambiente para garantir o avanço de propostas antirracistas?
Bia Caminha: Sou uma das poucas vereadoras de esquerda que nunca reprovou um projeto na Câmara Municipal aqui de Belém, nunca fechei o diálogo quando o que está em jogo é a vida e o direito da população. Sou contrária a atuação de grande parte dos vereadores, discordo ideologicamente, faço críticas na tribuna, se necessário faço denúncias, somos um mandato combativo. Mas quando tenho um projeto importante para aprovar, faço questão de apresentá-lo para cada um dos vereadores e faço pessoalmente o trabalho de convencimento. Foi dessa forma que aprovamos a Lei de Combate ao Racismo, garantimos a maioria dos votos com muito trabalho de diálogo. Sempre tive convicção de que o avanço das nossas pautas é a prioridade.
Alma Preta: Você tem se destacado como uma voz jovem na política, enfrentando desafios como a violência política de gênero e raça. Como essas experiências moldam sua atuação na defesa dos direitos das mulheres negras?
Bia Caminha: Nos últimos anos sofri cerca de sete ameaças de estupro e de morte, algumas narravam como eu seria assassinada com detalhes da minha rotina. Não é normal que uma jovem eleita aos 21 anos sofra tudo que eu sofri apenas por sonhar mudar a nossa cidade através da política, sei que um corpo como o meu naquele espaço e a minha atuação parlamentar incomoda muita gente poderosa. Mas sempre busquei não me deixar ser definida pela violência política. Muito além disso, nosso mandato representa os sonhos mais bonitos de quem tem esperança e acredita que Belém pode e vai brilhar.
Fomos nós que criamos a Lei de combate ao assédio, conquistamos educação climática nas escolas, lutamos e conquistamos uma casa de acolhimento para LGBT em situação de vulnerabilidade, criamos uma ouvidoria de direitos humanos para combater crimes de ódio. Enquanto eles são ódios, nós estamos avançando com política pública para quem mais precisa.