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MEC desconsidera pauta racial e prega patriotismo nos livros didáticos

A regulamentação do conteúdo dos livros didáticos vale até 2023 e retira tópicos que proíbem veiculação de estereótipos racistas e preconceito racial, de gênero e orientação sexual

Texto: Roberta Camargo | Edição: Nataly Simões | Imagem: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Imagem mostra um menino negro com o rosto desfocado, segurando um livro escrito "A escola é nossa" na capa

4 de maio de 2021

O Programa Nacional do Livro Didático (PNDL) é responsável pela regulamentação e distribuição de livros didáticos no Brasil.  A nova proposta do edital para publicação de livros didáticos até 2023 exige  “promoção positiva da imagem do Brasil e da amizade entre os povos”, além da “promoção de valores valores cívicos, como respeito, patriotismo,  cooperação e honestidade”.

No edital divulgado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), vinculado ao Ministério da Educação (MEC), o texto substitui em quatro linhas o que antes era especificado em dez tópicos e levava em consideração questões raciais, de gênero, xenofobia, LGBTfobia, sexismo, promoção da diversidade e respeito à mulher no Brasil.

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Considerado um facilitador da aprendizagem, o programa contempla 140 mil escolas e cerca de 40 milhões de estudantes a partir da publicação dos livros, desde a educação infantil até o ensino médio, e funciona como nivelador de conteúdo dos livros didáticos. Na edição de 2021, que vale por quatro anos, foram retiradas as exigências que proibiam conteúdos racistas, de estereótipo de gênero, de violência contra a mulher e LGBTfóbicas.

O professor de sociologia Rogério Souza conta que o programa permitiu que a população de classe mais baixa tivesse acesso aos livros. “Durante muito tempo, o conhecimento historicamente acumulado ficou concentrado em espaços como universidades e bibliotecas. O PNLD democratiza o acesso a conhecimentos e saberes sistematizados que, somando-se às vivências de estudantes, cria condições para a concretização do processo de ensino aprendizagem”, explicao educador do Instituto Federal de São Paulo.

“Há uma nítida tentativa de reestruturar as identidades dos grupos e anular conquistas dos últimos 30 anos. O novo edital inviabiliza questões específicas de grupos marginalizados e reforça a idealização de uma falsa democracia racial brasileira”, analisa o sociólogo sobre as mudanças feitas no programa.

Retrocesso ao longo dos anos

O PNLD sofreu diversas alterações, entre elas, a inclusão de pautas ligadas à temática racial no país, resultado da pressão feita por movimentos negros em 1987. Na época, o programa era responsável pela regulamentação e distribuição de 60 milhões de livros didáticos para instituições de ensino de todo o país.

É prevista desde 2003 a obrigatoriedade de ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena em livros didáticos, mas eram poucas as representações de pessoas não-brancas nos materiais disponibilizados pelo governo federal.

O professor Rogério lembra que em 2017 o governo publicou decreto que modificou o nome do programa, os materiais distribuídos, a forma de avaliação e a duração dos ciclos das obras. O educador aponta que o novo edital se mantém no mesmo sentido. “Essa contextualização é importante porque as ações do governo Bolsonaro continuam a política educacional iniciada no governo Temer”, destaca. 

“Que país pretendemos deixar para as próximas gerações?”

A professora, Karina Oliveira, mestranda em Estudos Culturais pela USP (Universidade de São Paulo), sinaliza as consequências das alterações. “Pode resultar em uma geração que não vai ter acesso a pautas importantes sobre diversidade. Além disso, é uma mudança que fortalece a violência contra esses grupos”, pondera.

Karina enxerga na sociedade civil um agente importante para que o PNLD volte a promover o respeito à diversidade e às subjetividades da população brasileira. “Assim como houve pressão dos movimentos sociais nos anos 80, é importante pressionar para que novas mudanças aconteçam nos próximos anos” sugere.

“Que país pretendemos deixar para as próximas gerações?”, questiona o siciólogo Rogério, que também compreende a atuação importante da população. “Precisamos fortalecer e reincorporar estratégias de desconstrução de narrativas que reafirmam o racismo estrutural”, conclui.

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