Milton Leite (União Brasil), presidente da Câmara Municipal de São Paulo e sócio da construtora Neumax, comprou um terreno de 743 mil metros quadrados na cidade de Sorocaba, interior de São Paulo, em março de 2010. A compra do Jardim Nathalia, como ficou conhecido o loteamento, foi feita pelo valor de R$ 3,1 milhões, quantia menor do que a metade do chamado valor venal, de R$ 6,7 milhões.
O valor venal é um parâmetro mínimo estabelecido pelas prefeituras para a cobrança de impostos na venda de imóveis, entre outros débitos, como garantia de arrecadação. Mesmo que se venda o imóvel abaixo do valor venal, há a necessidade de se pagar uma quantia mínima de impostos para o poder público. Ocorre que esse montante estipulado pelo poder público costuma estar abaixo do valor de mercado. Apesar da diferença entre os valores venal e de mercado, não há qualquer irregularidade na compra.
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A Neumax comprou o terreno da Construbase, empresa acusada pela Operação Lava Jato, série de investigações do Ministério Público Federal (MPF) sobre esquemas de corrupção de empresas da construção civil e de outros setores que consistiam no pagamento de propinas a políticos e servidores do Estado para a garantia de contratos públicos.
O representante da Construbase na época a assinar o documento de venda é Vanderlei de Natale e o da Neumax, Milton Leite Filho (União Brasil), no mesmo ano em que ele seria eleito pela primeira vez deputado estadual por São Paulo. O pagamento foi feito por transferência bancária.
A Construbase foi procurada e, até a publicação desta matéria, não respondeu aos questionamentos. O deputado estadual também não retornou aos questionamentos da reportagem. O texto será atualizado caso ele ou a empresa se manifestem. Milton Leite sinalizou que ele e a família têm sido vítimas de uma perseguição e que tudo referente ao Jardim Nathália foi feito cumprindo a legislação.
Vanderlei de Natale foi investigado e preso no âmbito da Operação Lava Jato em 2019 por transferir mais de R$ 17,7 milhões para a PDA Projetos, entre os anos de 2010 e 2015, movimentações financeiras que tinham como objetivo beneficiar Michel Temer (MDB), segundo o MPF. A prisão de Vanderlei de Natale ocorreu na chamada fase Descontaminação, um desdobramento da Lava Jato, que analisou com mais enfoque o pagamento de propinas a Michel Temer, vice-presidente eleito em 2014 na chapa de Dilma Rousseff (PT). Ele assumiu a presidência depois do impeachment de Rousseff em 2016.
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), foram utilizadas notas fiscais frias e contratos falsos para justificar a transferência do dinheiro. Dias depois, Vanderlei de Natale obteve um habeas corpus e o direito de responder ao processo em liberdade. O Tribunal Regional da 2ª Região (TRF2) afirmou, em nota, que “o processo em referência tramita no Juízo Federal da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro”.
O Banco Central chegou a confiscar R$ 462 milhões da Construbase Participações, R$ 2 milhões da Construbase Engenharia e R$ 83 milhões da Probase Projetos e Engenharia, todas empresas em que Vanderlei de Natale é sócio.
Consórcio de empresa investigado pela Lava Jato
A Construbase foi investigada por participar de um consórcio de empresas que pagaram cerca de R$ 39 milhões para obter contratos da Petrobras entre 2007 e 2012.
Genésio Schiavinato Junior, diretor da Construbase, também foi preso em 2016, sob acusação de participar da Lava Jato, com o pagamento de propinas a integrantes da Petrobras e do PT para fraudar processos de licitação.
A Lava Jato é descrita pelo Ministério Público Federal como “uma das maiores iniciativas de combate à corrupção e lavagem de dinheiro da história recente do Brasil”.
A investigação, que se iniciou a partir da observação de contratos da Petrobras, que eram feitos a partir de um jogo de cartas marcadas com um grupo de empresas, espalhou-se para outros contratos públicos e chegou a políticos como Michel Temer.
O Supremo Tribunal Federal (STF) anulou decisões da Lava Jato, por entender que houve uma “mistura” das funções de acusação, por parte dos procuradores, e de julgamento, por parte dos juízes, que mantiveram diálogos sobre os réus dos processos.
Em 21 de maio de 2024, o ministro Dias Toffoli, do STF, anulou as decisões da Lava Jato contra o empresário Marcelo Odebrecht. O STF também reconheceu a incompetência da Vara de Curitiba para julgar o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva e entendeu que o ex-juiz Sérgio Moro foi parcial no julgamento do petista. Por isso, o STF anulou as decisões acerca do apartamento triplex no Guarujá.
Jardim Nathália em Sorocaba
O imóvel comprado por Milton Leite se tornou o Jardim Nathália, um loteamento com 2.045 casas, com residências mais simples e outras de alto padrão, que podem render para o caixa da Neumax cerca de R$ 300 milhões, de acordo com estimativas de preços de imobiliárias da região.
Todos os sócios da construtora são da família de Milton Leite, como os filhos, o deputado federal Alexandre Leite (União Brasil), o deputado estadual Milton Leite Filho (União Brasil), Felipe Leite, e a esposa, Neusa Maria.
Reportagem da Alma Preta mostrou que Milton Leite Filho destinou emendas parlamentares para reformar uma quadra e um centro esportivo na região do Éden, em Sorocaba, onde está o loteamento Jardim Nathália.
Políticos da cidade, como o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) e o vereador João Donizeti (União Brasil) têm se mobilizado para municipalizar e melhorar vias da região do loteamento Jardim Nathália. As mudanças podem valorizar o empreendimento da família Leite.