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Reconstrução da política de combate ao racismo marca primeiro ano do Ministério da Igualdade Racial

O primeiro ano do MIR cumpriu o objetivo de estruturar a pasta e criar a base para construir o avanço da política de igualdade racial no Brasil nos próximos anos
A foto mostra a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e a secretária-executiva da pasta, Roberta Eugênio.

Foto: Rithyele Dantas/MIR

20 de fevereiro de 2024

Janeiro de 2024 marcou o primeiro ano da posse do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A data também é simbólica pela retomada da política federal de combate ao racismo e promoção da igualdade racial, agora, com status de ministério: o Ministério da Igualdade Racial (MIR).

Liderado por Anielle Franco, jornalista e irmã de Marielle Franco, o MIR teve um ano marcado pelo protagonismo em debates importantes, como a renovação da Lei de Cotas Raciais no ensino superior. No contexto geral, a secretária-executiva da pasta, Roberta Eugênio, avalia em entrevista para a Alma Preta que o primeiro ano cumpriu o objetivo de estruturação do ministério.

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O MIR é dividido em três secretarias: a Secretaria Nacional de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, Povos de Terreiro e Ciganos; a Secretaria de Gestão do Sistema de Promoção da Igualdade Racial; e a Secretaria de Política de Ação Afirmativa e Combate e Superação ao Racismo. O trabalho se desenvolve a partir dos eixos: direito à vida e dignidade, direito à educação e inclusão, memória e reparação e direito à terra. 

“O ano de 2023, não apenas para o Ministério da Igualdade Racial, mas para todo o governo federal, foi de retomada das políticas públicas que estruturam e garantem direitos básicos para a população. No MIR, nós começamos o ano retomando políticas que eram históricas, aperfeiçoando elas, atualizando e entendendo aquilo que precisava avançar”, afirma Eugênio. 

Entre as ações, a secretária destaca o Aquilomba Brasil, uma das sete medidas do pacote pela igualdade racial anunciado pela ministra Anielle e que amplia o programa Brasil Quilombola, com ênfase nos eixos: acesso à terra, infraestrutura e qualidade de vida, inclusão produtiva e desenvolvimento local, e direitos e cidadania. A estimativa é de que cerca de 214 mil famílias sejam beneficiadas direta ou indiretamente pelo programa.

“Acredito que a igualdade racial esteve na ordem do dia. Um ministério com nome de ministério, com estrutura e com orçamento é central para impulsionar essa agenda e dar passos que antes não haviam sido dados. A gente não pode pensar no desenvolvimento de política pública sem pensar na necessidade de estrutura e orçamento”, avalia Eugênio.

Para a secretária, um ministério para tratar do tema da igualdade racial é uma estrutura que deve ser perene para atingir o objetivo democrático no Brasil. “Se nós pensamos na promoção de políticas para todos e todas, como fazer isso sem ter um ministério que corrija as desigualdades produzidas por mais de 500 anos de escravidão e de violência face as pessoas negras no Brasil?”. 

O relatório com todas as ações e políticas executadas no primeiro ano do MIR pode ser conferido aqui.

Retomada da política de igualdade racial

Antes da retomada do Ministério da Igualdade Racial, a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), vinculada à Presidência com status de ministério, criada no primeiro mandato de Lula em 2003, cumpria os objetivos de promoção da igualdade racial no âmbito do governo federal.

Em 2015, no governo Dilma Rousseff (PT), a secretaria foi incorporada ao Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos. Com o impeachment da petista em agosto de 2016, nos governos de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), a nomenclatura “igualdade racial” foi excluída do ministério. 

Para Roberta Eugênio, a conjuntura mostrou que o impeachment afetou também as políticas para a população negra. Segundo a secretária, as políticas iniciadas há 20 anos pela Seppir devem ser defendidas, retomadas e ampliadas, a exemplo do Estatuto da Igualdade Racial e da aprovação da Lei de Cotas.

“As políticas que tiveram início em 2003 devem persistir por muito mais tempo, porque, sem dúvida, 20 anos não foram suficientes para que conseguíssemos mudar estruturas tão profundas e enraizadas. O compromisso do governo Lula com a promoção da igualdade racial, demonstrado através do ministério, deve ser agarrado e defendido pela população brasileira como um todo”, completa Eugênio.

A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e o presidente Lula, durante a posse em 1º de janeiro de 2023.
A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e o presidente Lula, durante a posse em 1º de janeiro de 2023. Foto: Ricardo Stuckert/Palácio do Planalto

No comparativo entre os cenários de 2003 e 2024, a secretária avalia ainda que as compreensões da forma como o racismo se manifesta de forma direta e indireta mudaram. Hoje não se fala da discriminação racial apenas por meio de ações, mas também das omissões, o que força o governo a ter compromissos políticos que efetivamente alterem as condições de vida da população negra.

Para enfrentar o racismo na administração pública federal, foi instituído o decreto 11.443, que obriga o preenchimento mínimo de 30% de pessoas negras nos cargos de livre nomeação e livre exoneração. “Isso é um avanço de praticamente um século, uma política pública inovadora, que só foi possível porque o trabalho que foi feito de 2003 a 2016 foi muito exitoso”, dispara Eugênio.

Metas para 2024

De acordo com a secretária-executiva do MIR, o primeiro ano de ministério cumpriu o objetivo de “colocar a casa de pé”, reorganizando aquilo que será a base para construir o avanço da política de igualdade racial no Brasil nos próximos anos. 

Para 2024, a principal meta é a efetivação do Plano Juventude Negra Viva, que prevê uma atuação interministerial para reduzir as vulnerabilidades que afetam os jovens negros. A partir de um processo participativo, o plano foi construído com a escuta de aproximadamente 6 mil jovens negros durante a realização de caravanas que percorreram os 26 estados brasileiros, além do Distrito Federal. 

“Lançamos no ano passado um grupo de trabalho que envolveu 18 ministérios. Nós rodamos todo o país nas caravanas do Juventude Negra Viva, ouvindo a juventude negra pelo Brasil, enquanto estruturávamos esse programa. A expectativa agora é efetivar o plano até março”, adianta.

Também dentro do plano da pasta para 2024 está a realização da Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir), espaço de debate central e estratégico para se traçar as metas para os próximos anos em relação às políticas públicas de igualdade racial. “O Brasil já está há seis anos sem realizar a conferência e a nossa equipe e os próprios conselheiros já estão imbuídos da missão de colocar a conferência de pé em novembro”, diz.

Entre os desafios do ano, a secretária lembra que 2024 será marcado pelas eleições municipais, o que pode afetar as relações com o Congresso e a aprovação de medidas importantes para a pasta. Apesar disso, o sentimento é de esperança e a expectativa é de aprofundamento das condições materiais da produção de dignidade para população negra a partir do governo federal, diz Roberta. 

“Eu vejo com muito orgulho o que nós fizemos até agora e também com muita esperança o que está por vir. Mesmo que o contexto dentro do cenário político de modo geral não seja plenamente favorável à população negra, hoje nós temos ferramentas que não tínhamos há anos atrás para fazer as políticas avançarem”, conclui.

Imagem mostra sede do Ministério da Igualdade Racial, em Brasília (DF).
Sede do Ministério da Igualdade Racial, em Brasília (DF). Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Para quilombola, desafio é fazer melhoria chegar às comunidades

A Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) é uma das organizações que compõem o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Cnpir) e tem participado ativamente das discussões acerca dos direitos quilombolas no âmbito do governo federal, a exemplo do programa Aquilomba Brasil. 

O coordenador-executivo da Conaq, Galiza Guerreira, destaca a construção da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (Pgtaq) como política inovadora para a população quilombola. Segundo ele, a nova estrutura do MIR, com uma secretaria voltada à população quilombola deve ser fortalecida, mas é preciso garantir que os recursos chegarão às comunidades. 

“A gente traz como exemplo o Brasil Quilombola, que tinha recurso próprio para a questão quilombola, mas havia uma grande dificuldade burocrática de fazer com que esse bem chegasse na comunidade. Nos encontros, a gente avaliava que se gastava apenas 30% do que orçado para a política quilombola. Agora, com o Aquilomba Brasil, a gente tem que trabalhar para fazer com que esses recursos possam chegar naqueles que realmente precisam”.

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  • Fernando Assunção

    Atua como repórter no Alma Preta Jornalismo e escreve sobre meio ambiente, cultura, violações a direitos humanos e comunidades tradicionais. Já atua em redações jornalísticas há mais de três anos e integrou a comunicação de festivais como Psica, Exú e Afromap.

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