O Ministério Público Federal (MPF) propôs à Eletrobrás Eletronorte um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para reparação dos impactos causados pela Usina Hidrelétrica Curuá-Una, localizada em Santarém, no Pará.
A proposta busca regularizar a licença ambiental da usina sem interromper seu funcionamento, mas exige a realização de um diagnóstico socioambiental completo sobre os danos causados às comunidades indígenas e tradicionais afetadas.
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O documento, elaborado pelo procurador da República Vítor Vieira Alves, reconhece que a hidrelétrica opera desde 1977 sem medidas de mitigação adequadas, com impactos que atingem a Terra Indígena Munduruku e Apiaká do Planalto, além de comunidades ribeirinhas e extrativistas.
Entre os efeitos relatados estão poluição dos rios Curuá-Una e Moju, surtos de doenças como malária e distúrbios gastrointestinais, além da desestruturação das formas tradicionais de organização social.
Participação das comunidades no processo
O TAC estabelece que a Eletrobrás deverá apresentar, em até 30 dias após assinatura do acordo, um plano detalhado de trabalho para o diagnóstico, com participação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), representantes indígenas e demais comunidades tradicionais. Os estudos deverão ser conduzidos por equipe multidisciplinar independente, aprovada pelo MPF.
Também está prevista a observância rigorosa da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), incluindo a realização de Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) conforme o Protocolo de Consulta da Terra Indígena Munduruku e Apiaká do Planalto.
O diagnóstico preliminar deverá ser entregue em até 180 dias, e o relatório final em até um ano. Esses dados subsidiarão um novo TAC, que tratará de compensações financeiras e políticas públicas específicas.
Enquanto o processo avança, a proposta exige que a empresa implemente imediatamente um sistema de alerta sonoro ou outro meio de aviso para as comunidades sobre a abertura e fechamento das comportas da usina. Também deverão ser criados canais de comunicação acessíveis às comunidades indígenas e ribeirinhas.
Reparação vinculada à Justiça de Transição
O MPF afirma que o empreendimento foi instalado durante a Ditadura Empresarial-Militar, período marcado pela repressão a vozes contrárias a grandes projetos. Por isso, a proposta fundamenta-se também na perspectiva da Justiça de Transição, que reconhece o direito à reparação mesmo quando os danos ocorreram antes da vigência das atuais normas ambientais.
“Embora a hidrelétrica Curuá-Una tenha iniciado seu funcionamento antes do início de vigência das principais normas ambientais, isso não impede a reparação dos danos socioambientais que permanecem a cada renovação da licença de operação”, afirmou em nota o procurador. Para ele, o direito à memória, à verdade e à reparação coletiva precisa guiar a regularização da usina.
Histórico de omissão
A proposta de TAC é resultado de inquérito instaurado após a instalação de uma quarta turbina na usina sem consulta às comunidades afetadas. No curso das investigações, o MPF constatou que, desde sua construção, o empreendimento nunca realizou medidas de identificação ou reparação dos impactos socioambientais gerados.
O órgão destaca que os danos acumulados ao longo de quase cinco décadas exigem agora uma atuação coordenada, transparente e baseada nos direitos coletivos das populações atingidas. A Eletrobrás Eletronorte ainda não se pronunciou sobre a proposta.