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Mulheres negras encontram barreiras dentro dos partidos para lançar candidaturas

7 de setembro de 2020

Mesmo valendo somente para 2022, decisão do Tribunal Superior Eleitoral buscar corrigir desigualdade e aumentar a representação negra em cargos políticos

Texto: Flávia Ribeiro | Edição: Nataly Simões | Imagem: Acervo pessoal/Thais Ferreira

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Apesar de o Brasil ser considerado o país com maior população negra fora do continente africano, as pessoas negras não são representadas de forma proporcional em todos os espaços de poder, como a política institucional. Nas últimas eleições municipais, em 2016, apenas 29% dos prefeitos eleitos eram negros e negras. Já nas câmaras municipais, 42% dos vereadores eram negros. Para tentar corrigir essa disparidade, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu em agosto que os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) passem a ser distribuídos pelos partidos de forma proporcional entre as candidaturas de negros e brancos.

Pela decisão, o critério de distribuição também deverá ser observado na divisão do tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. A decisão foi motivada por uma consulta apresentada pela deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ), pré-candidata à Prefeitura do Rio de Janeiro. Mesmo que a decisão só tenha efeito a partir de 2022, já em 2020 mais pessoas negras devem se lançar como candidatas.

A distorção entre os números é ainda mais visível no caso das mulheres negras. Dos 5.531 prefeitos eleitos nas últimas eleições, apenas 1.603 se declararam pretos ou pardos e desses, apenas 178 eram mulheres negras. Dentre os 57.859 vereadores eleitos, 7.809 eram mulheres e apenas 2.872 negras. Os dados do Estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram ainda que negros são minoria mesmo entre os candidatos. Foram 32,8% e 48,6% dos que lançaram seus nomes para o executivo e legislativos, respectivamente, dos municípios, em 2016.

Um caso não isolado

Poderia ser um caso isolado, mas Thais Ferreira mostra a razão de pessoas negras, principalmente mulheres, encontrarem dificuldades até mesmo para se tornarem candidatas. Com a pré-candidatura à vereadora do Rio de Janeiro confirmada no dia 3 de setembro, ela quase ficou sem legenda após uma resolução do Psol (Partido Socialismo e Liberdade) proibir candidaturas de quem tenha participado de “plataformas de formação, financiamento e estruturação de campanhas, tais como, RenovaBR, Raps e similares” ou que tenha participado de mandatos legislativos de partido apoiador de “governos burgueses de direita” ou votado contra trabalhadores.

Por ter sido beneficiada com uma bolsa, Thais realizou o curso Renova BR 2018 na modalidade à distância. Na época, ela estava desempregada e o recurso a ajudou não só a arcar com as despesas da casa, como também a terminar a reforma da casa onde a mãe, que teve câncer, morava. O valor ainda foi usado para ajudar uma amiga que também estava desempregada.

“Sabia que estava entrando em um espaço branco, hegemônico, dominado por homens brancos ricos que diziam que iam resolver os problemas do Brasil. Fiz o enfrentamento devido. Todo mundo me conheceu como alguém contra o viés ideológico do Renova. Quando o curso terminou, eu me desliguei deles”, conta.

Nas redes sociais, Thais relatou brevemente a situação. Em entrevista concedida ao Alma Preta, ela fala sobre os dias em que ficou sem saber se poderia ou não concorrer ao pleito de 2020, previsto para novembro em razão da pandemia.

Mulher negra, mãe, criada em Vaz e Lobo, ela recorda que foi convidada pela vereadora Marielle Franco para se filiar ao Psol e se candidatar às eleições estaduais de 2018. A última vez que se falaram foi em 8 de março daquele ano, seis dias antes da ex-vereadora e defensora dos direitos humanos ser assassinada.

“Entrei no partido de uma forma muito discreta. Foi uma pessoa que morreu neste ano de Covid-19 quem me filiou. Não tive grandes contatos com o partido. Soube que não teria acesso ao fundo partidário pelo telefone. Uma pessoa que nem se identificou falou que eu não teria direito à grana. Eu falei tudo bem e fui me organizando”, lembra.

Outro impeditivo à candidatura seria o fato de Thais ter assessorado a deputada estadual Marina Helou (Rede Sustentabilidade-SP), em 2019 e 2020. Ela conta que se inscreveu no processo seletivo para uma vaga técnica, cuja proposta financeira considerou digna e o trabalho a ser desempenhado seria na área em que se especializou.

Em 2018, mesmo sem recursos financeiros e sem apoio do partido, Thais conseguiu mais de 24 mil votos. “Mesmo assim levou um ano para conseguir uma reunião extra-oficial com o Psol para discutir a minha relação com o partido. Mesmo sem me conhecer e nem me perguntar, a galera achava que eu era oriunda do Renova e articulada com esses movimentos para ser financiada pelo grande capital. Quem conhece a minha história sabe que os nossos interesses são inconciliáveis e inegociáveis, mas me tacaram essa pecha. Me isolaram politicamente, mas continuei trabalhando com a minha base”, detalha.

Já em 2020, Thais recorreu à executiva nacional para tentar manter a pré-candidatura como vereadora, lançada há poucas semanas. O recurso foi acatado e em convenção municipal na quinta-feira (3) a pré-candidatura foi confirmada de forma definitiva.

Thais ressalta que sua trajetória é marcada pelo convívio com lideranças comunitárias, de homens e mulheres do movimentos negro, sindicais e de trabalhadores. “Venho buscando honrar o legado de luta que me foi deixado através dessa ocupação positiva da política institucional porque eu acredito que isso é fazer afirmação positiva da gente, enquanto pessoa preta, família preta, potência humana que somos estou colaborando no processo de restituição da humanidade de todas e todos nós”, enfatiza.

O Alma Preta procurou o Psol Carioca para saber o posicionamento da legenda sobre o caso de Thais Ferreira. Até a publicação deste texto, os questionamentos da reportagem não foram respondidos.

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