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Parlamentares negras apontam falta de respaldo no Brasil em casos de violência política

7 de outubro de 2020

A deputada federal Talíria Petrone recorreu à ONU para denunciar ameaças de morte; a deputada estadual Dani Monteiro e a candidata à vereadora Erika Hilton contam que o caso Marielle Franco é o maior exemplo da violência política

Texto: Aline de Campos | Edição: Nataly Simões | Imagem: Reprodução

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Mulheres sofreram 2,4 vezes mais ameaças que homens nas Casas Legislativas nos últimos quatro anos, de acordo com levantamento das organizações Terra de Direitos e Justiça Global. A pesquisa, apesar de considerar gênero e regionalidade, não traz dados quanto ao recorte racial das vítimas de violência política no país. Para a deputada estadual Dani Monteiro (PSOL/RJ), a intersecção das opressões de gênero e raça agrava a situação das mulheres negras. “Temos clareza do quão mais alta é a incidência dessas violências para nós”, afirma.

A parlamentar destaca que cada vez mais grupos vulnerabilizados, perseguidos politicamente, têm recorrido a entidades internacionais por carência de respostas e ações efetivas do Estado brasileiro.

Há poucos dias, a deputada federal Talíria Petrone (PSOL/RJ) entrou com recurso na Organização das Nações Unidas (ONU) devido à ameaças que tem sofrido. Foram encontradas ao menos cinco gravações do Disque Denúncia da Polícia do Rio de Janeiro falando sobre ameaças de morte direcionadas à parlamentar.

Assim como Dani, Taliria aponta descaso por parte das instituições brasileiras. “Venho cobrando desde sempre. É uma questão de Estado e não de quem o ocupa. Há um silenciamento ou as respostas são insuficientes”, conta, enfatizando que essa apatia é um sinal de que “a democracia vai mal”.

O maior símbolo da violência política contra mulheres negras eleitas é o caso de Marielle Franco. Mais de dois anos após o assassinato da vereadora, as investigações continuam e ainda não há respostas sobre o mandante. A preocupação quanto à segurança das parlamentares também só aumenta.

“A mulher negra no parlamento é um corpo estranho, nenhuma de nós nunca almejou ser mártir, a Marielle não desejou e nenhuma de nós deseja. Nós queremos estar vivas para fazer política”, diz Talíria. A deputada federal ressalta que corpos negros e femininos sempre estiveram em posição de enfrentamento de violências e que seu mandato serve para amplificar essas vozes.

Desde o início da vida parlamentar, como vereadora, Talíria é alvo de violência nas redes sociais e recebe ameaças de morte por meio de ligações anônimas. A parlamentar relembra um episódio, ocorrido em 2018, em que, durante sua campanha para deputada federal um policial militar levantou uma arma dentro da barca onde estava com apoiadores fazendo a travessia da estação Arariboia, em Niterói, até a Praça XV, no centro do Rio de Janeiro.

Após o grupo da campanha se reunir para tirar uma foto com o material de divulgação, o PM alegou que a panfletagem não poderia ser realizada porque causaria problemas. Ele chegou a dar voz de prisão a um jovem que saiu em defesa da parlamentar.

Medo constante da violência

Candidata à vereadora em São Paulo, Erika Hilton (PSOL), salienta que o racismo e o fascismo são os motivos pelos quais parlamentares negras como Talíria precisam recorrer à ONU. Atuante contra as opressões ao povo preto e no combate às violências à comunidade LGBTQIA+, Erika convive constantemente com o medo da violência.

“Estamos a todo tempo alertas porque o nosso corpo está na mira da bala, na mira do ódio e das fake news. Defender a dignidade é se colocar em risco porque o Brasil além de racista e LGBTfóbico é um grande perseguidor de defensores dos direitos humanos. Aqui se mata de forma cruel”, salienta.

A candidata destaca que junto à tristeza pela morte de Marielle, existe o receio à própria segurança. Ela também afirma, no entanto, que o assassinato da ex-vereadora e a não resolução convocam as candidatas negras para uma luta permanente de combate às tentativas de silenciamento.

“Nós temos medo sim. Vivemos em incessante vigília para que o nosso corpo não tombe. Ao matar Marielle Franco não se mata uma mulher, se mata um projeto e isso nos assusta, mas nosso luto vira verbo e a gente passa a lutar incansavelmente por justiça por Anderson e Marielle”, pondera.

Para Erika, o desrespeito a opiniões divergentes e a corpos dissidentes fere todo e qualquer princípio democrático e evidencia que as mulheres negras eleitas não têm segurança no Brasil justamente por se tratar de um país racista cujas políticas institucionais foram pensadas para homens brancos e projetadas para a mulher negra não ocupar a esfera pública.

“Quando nós ocupamos a política constantemente somos boicotadas, limadas, pra ver se a gente recua, numa tentativa de evitar que outras cheguem neste lugar”, explica.

Medidas de proteção

Diante do cenário desfavorável ao exercício político de candidaturas que combatem as opressões, a deputada carioca Dani Monteiro defende que o poder público implemente medidas de proteção e garantia à vida das parlamentares, bem como deve conduzir investigações com celeridade e independência.

“Precisamos ponderar o que está por trás dessa letargia e que movimento é esse que naturaliza a ameaça e a morte de candidatos neste país. Desnaturalizar a violência é uma etapa central para combatê-la. Dependemos de todos para que isso aconteça, mas cabe ao Estado traçar as diretrizes que nos tirarão dessa encruzilhada”, aponta.

Atualmente, Taliria mantém-se longe do Rio de Janeiro até que ocorra análise das relatorias. A deputada federal tem buscado visibilizar a questão em busca de proteção. Erika Hilton, que está no pleito eleitoral deste ano, tem adotado medidas de segurança, como andar em grupo com grande número de pessoas e buscar locais movimentados para sua campanha.

“Estamos no alvo e sabemos disso, mas precisamos dar continuidade ao nosso projeto político, transformar e ressignificar a política. Precisamos também do comprometimento dos diretórios dos partidos para que se acontecer alguma coisa haja investigação. O ódio está posto e é isso que eles querem, que fiquemos caladas, escondidas. Não permitiremos isso”, reforça Erika.

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