Projeto de Lei quer modificar o Código Penal para penalizar, com a perda de posto e patente, os oficiais das Forças Armadas que forem condenados por crime de violência doméstica e familiar. A proposta, de autoria do deputado Cássio Andrade (PSB-PA), está na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) sob relatoria do deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG).
Além dos oficiais, os praças – militares de baixa patente – serão penalizados com a exclusão da corporação. A proposta está sujeita à apreciação conclusiva pelas comissões e não precisa passar pelo plenário para ser aprovada. Em sua comissão de temática, a de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, o PL 3634/2019 recebeu um parecer favorável, além de uma complementação.
Quer receber nossa newsletter?
Você encontrá as notícias mais relevantes sobre e para população negra. Fique por dentro do que está acontecendo!
O relator na CCJ, Subtenente Gonzaga, declarou em seu parecer que esta matéria estaria criando duas normas conflitantes. Segundo ele, a Constituição Federal e o Código Penal Militar “já preveem a aplicação da perda de patente ou exclusão das Forças Armadas do militar que for condenado pela prática de qualquer crime com pena superior a dois anos, o que, obviamente, engloba o de violência doméstica”.
“Não há necessidade de nova normatização, uma vez que já está disciplinado em lei, pois, se assim fosse, estaríamos criando o que é definido como antinomia jurídica, que é a presença de duas normas conflitantes, válidas e emanadas de autoridade competente, sem que se possa dizer qual delas merecerá aplicação em determinado caso concreto”, ressalta o relator em seu voto.
No entanto, para os oficiais das Forças Armadas e Forças Auxiliares, a Constituição só garante a demissão, com a perda do posto ou graduação somente por decisão de tribunal competente, que é o Tribunal Militar. Na ausência de uma instância específica, o Tribunal de Justiça é o responsável, mas eles nunca terão uma condenação automática, mesmo que transitada em julgado.
Violência contra mulheres e legislação
De acordo com o art. 5º da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), violência doméstica e familiar contra a mulher é “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.
No Brasil, essa é uma realidade muito presente. Em 2015, a Lei do Feminicídio (13.104/2015) foi um marco, classificando esse tipo de violẽncia como crime hediondo.
Segundo estudo elaborado pelo IPEC – Inteligência em Pesquisa e Consultoria, 13,4 milhões de mulheres sofreram algum tipo de violência durante a pandemia. Nesse levantamento apurou-se que 6% das mulheres brasileiras relataram ter sofrido agressão física por parte de seu namorado, companheiro ou ex, o que equivale a 5,3 milhões de mulheres de 16 anos ou mais.
Essa vulnerabilidade se torna ainda mais acentuada quando verificamos que o percentual é maior entre mulheres de 35 e 44 anos (8%), pretas e pardas (7%) e com ensino fundamental (11%). Os números são compatíveis com o perfil das vítimas de feminicídio no país, que atinge majoritariamente mulheres entre 30 e 44 anos (41,4% das vítimas) e com baixa escolaridade, conforme dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Condenação de militares
À violência doméstica, uma vez caracterizada crime militar por agressão, pode ser aplicada a Lei Maria da Penha. De acordo com a advogada Michele Merlin, hoje é possível a garantia de medida protetiva de urgência que obriga a suspensão da posse ou restrição do porte de armas.
Ela ressalta ainda que é possível aplicar ainda a Lei 10.826/2003, segundo a qual sua arma da corporação ou particular deve ser recolhida com intuito de evitar um mal maior por parte do agressor. Há também a previsão do afastamento do lar, domicílio ou local de convivência se determinada pela justiça, não cabendo Habeas Corpus.
O relatório do deputado Gonzaga, então, prevê que os crimes de violência doméstica e feminicídio sejam incorporados ao Código Penal Militar, assim como o que foi previsto na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN). Apesar de ser um projeto de competência da União, por se tratar das Forças Armadas, constitucionalmente ele pode, também, ser atribuído ao Congresso Nacional.
Leia também: Casa de acolhimento para mulheres vítimas de violência sofre despejo no Recife