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Projeto de lei cria diretrizes para combater violência policial contra jovens negros

27 de maio de 2020

Mortes de crianças e jovens em favelas inspirou projeto escrito em parceria com mães vítimas do Estado

Texto: Juca Guimarães e Pedro Borges I Edição: Simone Freire I Imagem: reprodução

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A imagem de Bruna da Silva, moradora da favela da Maré, no Rio de Janeiro, segurando uma camiseta de uniforme escolar manchada de sangue chocou o país. A camiseta era de seu filho, Marcus Vinicius, de apenas 14 anos, brutalmente assassinado durante uma operação da polícia no dia 20 de junho de 2018.

A dor virou militância e, hoje, Bruna faz parte do movimento de mães e de favelas do Rio de Janeiro, que junto com a deputada federal Talíria Petrone (PSOL- RJ) redigiu um projeto de lei sobre a violência do Estado contra crianças e jovens.

“Só em territórios de favela, em territórios de maioria negra, existe mandado de busca coletivo, existe helicóptero atirando do alto. O governador Wilson Witzel [PSC], assim que foi eleito, declarou que era pra polícia ‘atirar na cabecinha’. Um discurso que, apesar de revelar o intuito de extermínio da política de segurança no Rio, não é novidade. Outros governantes já deram declarações semelhantes em total desprezo às garantias de direitos fundamentais”, diz a deputada Talíria.

Segunda a parlamentar, o genocídio do povo negro vem da época colonial e é mantido até hoje pelo aparato armado do Estado. “Jovens de 15 a 29 anos são a maioria das vítimas de homicídio no Brasil (54%), são mais de 30 mil jovens mortos por ano. Desses, 75% são negros. Jovens negros têm mais que o dobro de chances de serem mortos do que jovens brancos”, afirma.

É uma história que se repete com vários nomes: Jenifer, 11 anos, morta em março de 2019; Kauan, 12 anos, morto em março de 2019; Kauã, 11 anos, morto em maio de 2019; Kauê, 12 anos, morto em setembro de 2019; Ágatha, 8 anos, morta em setembro de 2019; Ketellen, 5 anos, morta em novembro de 2019; João Pedro, 14 anos, morto em maio de 2020, entre muitas outras crianças negras e pobres mortas em operações da polícia.

De acordo com o Mapa da Violência, da Faculdade Latinoamericana de Ciências Sociais (Flacso), em 2014, morreram 29.813 negros por arma de fogo. Segundo o mapa, os negros têm 2,6 vezes mais chances de morrer de forma violenta do que os brancos. Entre os jovens, de 15 a 29 anos, são 63 mortes violentas por dia, uma a cada 23 minutos.

Projeto

O projeto de lei articulado pela deputada e os movimentos sociais organizados apresenta oito eixos de propostas para conter a violência policial e reduzir a letalidade de crianças e adolescentes que acaba com famílias inteiras.

Criação de planos de redução de riscos e violação de direitos humanos durante as operações, fim dos mandados de busca coletivos, notificação automática para o Ministério Público nos casos de homicídios suspeitos envolvendo policiais, proibição do uso de desacato para censurar as denúncias de moradores, são algumas das diretrizes do projeto.

“É inaceitável que a resposta do Estado seja um ‘erro de tática’ ou de combate às drogas. A guerra é contra os pobres, o povo negro e favelado. Nós queremos juventude negra viva! É urgente discutir medidas e políticas para combater esse genocídio”, diz Talíria.

A proposta está tramitando com caráter de prioridade na Câmara dos Deputados. Para virar lei, é necessário passar por comissões, pela votação em plenário e seguir para o Senado, onde também será analisado em comissões e votado pelo senadores. Se não houver alteração no texto, o projeto segue para a sanção (confirmação) presidencial.

Pandemia

No dia 18 de maio, quando o número de mortes por conta da Covid-19, o novo coronavírus, era acima de 130 por dia no estado, a Polícia Civil do Rio de Janeiro e a Polícia Federal fizeram uma operação no complexo de favelas do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, e o jovem João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, foi assassinado com um tiro na barriga dentro de casa. Segundo a família, os policiais levaram o garoto de helicóptero sem dizer para onde estavam indo. A família só encontrou o corpo do João Pedro, um dia depois, no Instituto Médico Legal (IML).

De acordo com o Instituto de Segurança Pública (ISP), do Rio de Janeiro, em abril deste ano foram contabilizadas 177 mortes por intervenção de agentes do estado. No mesmo mês de 2019, quando não havia a pandemia da Covid-19, foram 124 mortes.

No dia 22 de maio, durante uma transmissão ao vivo nas redes sociais do Alma Preta, a deputada federal e ex-governadora do Rio de Janeiro Benedita da Silva (PT-RJ) também falou sobre o assunto.

“Estão acabando com a nossa juventude. As operações policiais durante a pandemia são um crime. Atirar primeiro e perguntar depois não dá mais. Temos que ter uma polícia inteligente, que saiba o que é ser negro, o que é morar na favela. Não dá mais para ter uma polícia tão despreparada. Agora que o uso de máscara é obrigatório, o risco para os negros que estão subindo os morros. Vidas negras importam”, disse a deputada.

Para denunciar este e outros crimes, a Coalizão Negra por Direitos promoveu, também promoveu, nesta semana, o ato “Luto em luta” em memória de João Pedro e de todas as vítimas do genocídio negro no Brasil”, nas suas redes sociais.

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