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TSE deve criar comissão para evitar fraudes na declaração racial, afirmam especialistas

29 de setembro de 2020

Segundo representantes de alas negras dos partidos, possibilidade de mudança na distribuição do fundo eleitoral abriu caminho para candidatos brancos se declararem como negros; solução é estabelecer critérios que considerem os fenótipos negros

Texto: Juca Guimarães I Edição: Nataly Simões I Imagem: André Rodrigues/Gazeta do Povo

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O número de candidaturas negras nas eleições municipais de 2020 superou o das eleições de 2016, de acordo com dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). São 215.326 candidatos declarados pardos (39,43%) e 57.083 declarados pretos (10,45%). Há quatro anos, os pardos correspondiam a 39,12% dos candidatos e os pretos 8,64%

A declaração racial dos candidatos é perguntada desde 2014 e até agora as eleições brasileiras nunca haviam registrado maioria negra entre as candidaturas. Além disso, levantamentos feitos pela Folha de S. Paulo e pelo G1 em momentos diferentes do período de pré-candidaturas deste ano apontam que entre as pessoas que se candidataram nas duas eleições, 36% (Folha) e 39,7% (G1) se declaravam como “brancas” e mudaram a informação para “pardas”.

Para Nestor Neto, presidente do MDB Afro, núcleo que debate a questão racial no partido mais antigo em atividade, candidatos brancos mudaram a auto declaração para se beneficiarem da possível mudança na distribuição do fundo eleitoral.

“Eu acredito que 30% eram pessoas negras que tinham vergonha ou dificuldade de se encarar como negras e nos últimos anos isso mudou. Mas nos 70% restantes tem muita gente branca interessada na perspectiva de acesso a uma parte do fundo eleitoral para candidaturas negras. Em alguns partidos, 90% dos recursos eram para os brancos e eles estão tentando entrar na nossa fatia. Se dizem negros, mas são brancos”, explica.

O advogado Irapuã Santana, que defendeu no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e no STF (Supremo Tribunal Federal) a divisão do fundo partidário para candidatos negros, é a favor de um mecanismo de controle para que os recursos não acabem desviados para candidaturas de pessoas brancas que se auto declaram negras.

O TSE deve divulgar uma resolução com os detalhes de como será a regra de distribuição do fundo. A expectativa do advogado, que é especialista em Direito Processual, é que a medida também defina um modelo de verificação. “É interessante instituir uma comissão de heteroidentificação após eventual impugnação de candidatura, isso traria uma maior celeridade no processo eleitoral”, pontua Santana.

Combate a fraudes

A presidente do Tucanafro (PSDB), Gabriela Cruz, que trabalhou na gestão da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) durante a implantação das comissões de heteroidentificação nos concursos públicos com políticas afirmativas para negros, defende um modelo parecido para evitar fraudes nas candidaturas. Para ela, caso contrário, o objetivo de combater a baixa representatividade nos cargos políticos perderá o sentido.

“Se o candidato não tem o fenótipo de uma pessoa negra, ele está tirando o direito de uma pessoa que precisa receber os recursos para a campanha, pois sofre com as barreiras do racismo estrutural, sistêmico e institucional do nosso país. O racismo está dentro das agremiações partidárias também”, afirma Gabriela, que considera a decisão do TSE uma conquista histórica do movimento negro e que vai ajudar na construção de políticas efetivas contra o racismo.

No PSDB, a partir de 2020, a ficha de filiação da legenda, a pedido do núcleo Tucanafro, passou a ter um campo para indicação de cor/raça. Neto, do MDB Afro, concorda que a resolução do TSE deve levar em conta não apenas a auto declaração.

“Se o sujeito se diz negro e vai se canditar, precisa ter a banca para verificar a cor da pele, o cabelo e o fenótipo. Infelizmente, no Brasil, os partidos são tendenciosos ao erro. Fazem isso com as mulheres, usando elas como laranjas, mas não podemos deixar que usem os negros da mesma forma para obter recursos públicos para as canditaturas brancas”, sustenta.

A defesa de políticas afirmativas é um debate aberto em alguns partidos, mesmo naqueles que possuem núcleos de temática racial. O presidente do PTB Afro, Eloy Miguel, afirma que o núcleo é a favor das cotas para negros, porém, diz que o presidente estadual do partido, Campos Machado, se posiciona de forma contrária. “Estamos apoiando candidaturas afrodescendentes na legenda, mas acho que esse aumento no número de candidatos auto declarados negros é puro interesse no fundo partidário”, avalia Miguel.

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