Falar em segurança pública pra quem é negro sempre é um problema, sempre é muito difícil. Porque parece que a segurança pública é pensada somente pra defesa patrimonial dos privilegiados, patrimônio material e também simbólico. Os territórios negros, pobres e periféricos sempre constam como lugares que devem ser contidos, que podem ser violados a arrepio da lei. As vidas destes territórios não têm nenhum valor para a polícia, que mata sem nenhuma cerimônia, com requintes de crueldade, homens adultos negros, mulheres negras, crianças negras e principalmente jovens negros. Os brancos mortos só o são porque pertencem a este território que tem a permissão do Estado para ser violado.
Aí me vem à cabeça um agressor de mulheres de um condomínio de luxo em São Paulo que desacatou, com palavras de baixo calão, com ameaça verbal, um agente policial, que teve como reação um pedido de calma e chamou reforço policial, sem nem levantar a voz. Isso me indigna mais ainda porque dá a dimensão da seletividade da violência da polícia brasileira.
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São tantas as vidas negras, pobres e periféricas ceifadas pela sanha assassina das diversas polícias do país. São tantas as dores, tantas famílias destruídas por esta política, sim porque é uma decisão política deliberada nos porões destas instituições, que nossos corações estão sempre sangrando e contando corpos no nosso ativismo cotidiano.
Só existe um caminho, que é desmilitarizar as polícias e construir um projeto de segurança pública cidadã federalizada, que possa ser aplicada em todos os estados do Brasil.O racismo nos torna corpos matáveis cotidianamente, os números da violência policial brasileira são números de guerra, guerra esta decretada contra a população negra.
Se o Brasil não sofresse de uma doença moral, causada pela escravização, nós estaríamos aos milhões na rua, exigindo que governadores, secretários de segurança, superintendentes das polícias e das guardas municipais fossem responsabilizados pelo genocídio em curso, o movimento negro e demais movimentos sociais não seriam vozes solitárias nas ruas.
*Regina Lúcia dos Santos é coordenadora estadual do Movimento Negro Unificado, em São Paulo.