Juca Guimarães é pai da Maria Alice, de 4 anos, e da Maria Flor, de 10 anos; Neste artigo ele conta um pouco da sua rotina com as meninas e como foi assistir Hair Love
Texto / Juca Guimarães | Imagem / Arquivo Pessoal
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Não é apenas a aparência que define quem você é. Nos meus vinte e poucos anos de jornalismo sempre fiquei alerta para as desigualdades e injustiças por conta dos julgamentos sociais feitos só pela aparência e sedimentados no preconceito.
Entre os negros, o cabelo é um ponto importante de afirmação racial e autoestima, exatamente por isso, os penteados afros são também mote para uma boa parte dos ataques racistas, com o objetivo de diminuir a autoestima e ridicularizar a nossa aparência. Lidar com essas questões no campo pessoal é bem complexo.
Tenho duas filhas negras: Maria Alice (4 anos) e Maria Flor (10 anos), ambas lindas e inteligentes. Infelizmente, eu não vivo mais com a mãe das meninas, com quem compartilhei 12 anos de relacionamento.
Nos primeiros meses após o divórcio, a guarda-compartilhada sempre vinha para mim com um desafio extra. Além de programar a agenda do final de semana com elas, eu tinha que pensar em um jeito de deixar os cabelos delas tão bonitos e charmosos como na hora em que as buscava na casa da mãe.
Elas estavam sempre lindas e radiantes, com enfeitinhos e lacinhos nos cabelos. Maria Flor sempre foi mais vaidosa e perfeccionista. Já a Alice é mais sapequinha e criativa, gosta de inovações.
No começo eu passava um tempão mexendo no cabelo delas e quando terminava fazia a pergunta: “Filha, tá bonito?” e a resposta era “Não”, seguida de umas risadinhas marotas.
Ou então quando a gente ia passear em algum lugar e eu postava uma foto delas brincando e segundos depois da publicação em alguma rede social vinha a mensagem da mãe delas pelos WhatsApp “Juca, pelamor de DEUS que cabelo é esse dessas meninas, passa um creme, ajeita esse laço”.
Com o tempo o “Não” virou “Sim, papai tá lindo” e as mensagens sobre as fotos nas redes sociais foram rareando. O tempo e o carinho nos ensinam muitas coisas.
Quando assisti o filme Hair Love com elas, me vi um pouco dentro daquele roteiro do pai que passa por apuros para pentear os cabelos cacheados da filha.
Esse momento de carinho vai além da aparência, é um ponto importante para afinar as relações de pai e filha. Também é um ensinamento sem palavras sobre ancestralidade e confiança.
Levou um tempo para que eu aprendesse os macetes de desembaraçar o cabelo, fazer um coque bonito, acertar um cachinho e colocar dois lacinhos na mesma direção.
Contei muito com a ajuda das meninas. Para elas, que são meninas de ouro e prata, tudo é diversão. Eu fico muito feliz de sentir o orgulho delas de ter os cabelos penteados pelo pai com todo o carinho e afeto. São momentos de aproximação da família.
O Oscar para Hair Love foi merecido. De um jeito muito terno e sensível ele aborda um viés bem gostoso da paternidade preta.